terça-feira, 13 de abril de 2010

O teólogo da liberdade conquistada

O teólogo da liberdade conquistada

Faustino Teixeira
Professor da UFJF

No dia 26 de outubro de 2007, a Universidade Federal de Juiz de Fora concedeu o título de doutor honoris causa ao maior teólogo contemporâneo de tradição católica, o suíço Hans Küng. Foi uma justa homenagem que lotou o Museu Murilo Mendes e possibilitou à audiência uma oportunidade singular para ouvir um dos pensadores mais livres e corajosos em sua luta em favor da presença ativa das religiões na construção de um ethos mundial. Hans Küng nasceu no ano de 1928 na cidade de Sursee (Suíça), tendo realizado sua formação teológica em Roma e Paris. Após seu doutorado em teologia, concluído em 1960, assumiu a função de professor ordinário na reconhecida Universidade de Tübingen (Alemanha), onde atuou como professor durante 36 anos.

Em sua brilhante carreira acadêmica destaca-se sua atuação como perito no Concílio Vaticano II (1962-1965), tendo contribuído para a inserção de propostas inovadoras nos documentos conciliares, entre as quais a concepção da igreja como povo de Deus. Em razão de sua produção acadêmica e seu posicionamento teológico livre, encontrou dificuldades com o então Santo Ofício, que o impediu, em 1980, de continuar suas atividades na faculdade teológica católica de Tübingen. Mas permanece na mesma Universidade, atuando como professor de teologia ecumênica. A partir de então, concentra-se de forma mais incisiva na temática das religiões mundiais e o diálogo inter-religioso.

Em clássica obra de 1990, Projeto de ética mundial, lança as bases para a sua reflexão ética e ecumênica, postulando a alternativa de uma paz mundial mediante o diálogo entre as religiões e o imperativo de uma ética mundial. Nesta obra, lança um mote que circulará o mundo: “não haverá sobrevivência sem uma ética mundial. Não haverá paz no mundo sem paz entre as religiões. E, sem paz entre as religiões, não haverá diálogo entre as religiões”. Em linha de descontinuidade com posições que propugnam um futuro sombrio para a humanidade, de “choque de civilizações”, Hans Küng acredita numa perspectiva distinta e dialogal, que ultrapassa o horizonte cerrado dos confrontos e visualiza uma dinâmica possível de paz entre as religiões e as nações.

Talvez seja este otimismo um dos traços mais marcantes de sua presença e atuação, que se percebe de forma viva no brilho de seus olhos e na firmeza de sua convicção. Pode-se ainda sublinhar outros traços, como sua abertura multidisciplinar e sua vocação ecumênica e inter-religiosa. Mas o que mais se destaca é a sua sede de liberdade e seu espírito incansável de luta em favor de uma presença distinta da igreja no cenário contemporâneo e de uma ecumene planetária, que possa apresentar a face de um Deus que não é “eternidade sem tempo, mas antes uma eternidade contemporânea de todas as partes do tempo”.

 Publicado no jornal Tribuna de Minas de 04 de novembro de 2007

(Opinião, p. 2)

 

http://www.tribunademinas.com.br/opiniao/artigo.php

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