quarta-feira, 14 de abril de 2010

O desafio do pluralismo religioso para a teologia latino americana

O DESAFIO  DO PLURALISMO RELIGIOSO PARA A TEOLOGIA LATINO-AMERICANA

Faustino Teixeira

PPCIR/UFJF – ISER/Assessoria

 

INTRODUÇÃO

 

O pluralismo religioso aparece neste início de século como um dos desafios mais fundamentais para a teologia. Trata-se de um novo paradígma  que  vem convocar a teologia a retomar de forma viva a sua dimensão hermenêutica[1]. A consciência singular do  pluralismo religioso provoca um “novo modo de fazer teologia”, agora  contextualizado numa realidade  marcada pela dinâmica inter-religiosa. A teologia das religiões passa a ser compreendida como uma “teologia hermenêutica inter-religiosa”[2].

Na raiz desta teologia do pluralismo religioso[3] está a prática do diálogo inter-religioso. Trata-se de uma teologia que busca responder e interpretar, no plano de uma elaboração teórica, a realidade religiosa plural circundante. Mas como se sabe, não existe uma teologia universal do pluralismo religioso, pois toda reflexão teológica implica uma adesão de fé particular. O caminho  aqui proposto insere-se no horizonte da reflexão teológica cristã, mas sempre aberto à perspectiva global mais ampla. Na medida em que tal reflexão vem animada permanentemente pelo espírito dialogal, ela implica uma verdadeira simpatia e empatia pelo universo da alteridade. O exercício de uma teologia cristã do pluralismo religioso exige uma dinâmica de acolhida da diferença, o que pressupõe a consciência viva da contingência e da vulnerabilidade. O grande desafio do diálogo inter-religioso está em reconhecer sem restrição alguma o caráter irredutível e irrevogável do outro interlocutor, com o qual se instaura a busca de um conhecimento mútuo e de um recíproco enriquecimento.

Ao situar-se sob o signo do pluralismo religioso, a nova reflexão teológica vem desafiada a ultrapassar uma concepção que se restringe ao reconhecimento do pluralismo de fato e avançar para a compreensão de um pluralismo de princípio. Nesta última direção, a teologia passa a reconhecer e afirmar a riqueza e o sentido que a pluralidade das religiões alcança no misterioso plano divino para a humanidade. Seguindo esta linha de reflexão, o pluralismo religioso vem acolhido positivamente, pois expressa “todas as riquezas da sabedoria infinita e multiforme de Deus”[4]. Antes mesmo que os seres humanos se colocassem em busca do mistério de Deus, este mesmo mistério já os havia abraçado em sua infinita misericórdia. A realidade deste pluralismo religioso encontra, assim, “o seu fundamento primário na superabundante riqueza e variedade das auto-manifestações de Deus à humanidade. A iniciativa divina de auto-comunicação, ‘muitas vezes e de modos diversos’, e a sua ‘recepção’ e codificação em diversas tradições estão na origem da pluralidade das religiões”[5]. 

O reconhecimento e a abertura ao pluralismo de princípio não ocorrem sem resistências e dificuldades. Sobretudo nestes tempos de acirramento das identidades e de radicalização etnocêntrica, inúmeros obstáculos são contrapostos ao esforço teológico de pensar o pluralismo religioso de forma mais rica e aberta. O dado do pluralismo provoca  uma crise nas estruturas de plausibilidade  que buscam assegurar o nomos das identidades singulares e das comunidades de sentido. Sua incidência sobre os sistemas de crença suscita insegurança intelectual e afetiva, na medida em que rompe os diques de proteção territorial e convoca ao alargamento das fronteiras. O receio da relativização e da dessubstancialização dos conteúdos religiosos aciona o desejo de mais segurança, de estabilidade e fundamentação, provocando, assim, reações defensivas e/ou ofensivas contra o universo da alteridade.

Ao abordar a questão do pluralismo religioso, em obra clássica da sociologia da religião, Peter Berger mostrou como a situação pluralista engendrou não apenas a “era do ecumenismo”, mas também a “era das redescobertas das heranças confessionais”[6]. Diante da condição de incerteza provocada pelo pluralismo, bem como do temor de relativização a ele relacionado, tende-se em alguns casos a concentrar-se nas diferenças confessionais, como forma de garantia de manutenção da identidade ameaçada. Uma tal preocupação aparece de forma viva na declaração Dominus Iesus, da Congregação para a Doutrina da Fé[7]. Na lógica da defesa da identidade encaixa-se perfeitamente a distinção estabelecida pela declaração entre fé teologal e crenças (DI 7) e a negação do pluralismo religioso de princípio (DI 4).[8]

Em sentido diverso, o caminho dialogal proposto pela teologia do pluralismo religioso implica não apenas o reconhecimento da diferença genuína que marca as diversas tradições religiosas, mas também sua riqueza, enquanto autenticamente preciosas. Há que honrar esta alteridade em sua especificidade peculiar. E honrar a alteridade é ser capaz de reconhecer o valor e a plausibilidade de um pluralismo religioso de direito ou de princípio. Este desafio foi assumido de forma viva pela teologia do pluralismo religioso e aparece agora como um caminho enriquecedor para a ampliação de horizontes da teologia da libertação.

 

1. A teologia da libertação diante do pluralismo religioso

 

A teologia da libertação nasce por volta do ano de 1968 buscando uma dupla fidelidade: ao Deus da vida e ao povo latino-americano. Nasce como uma nova maneira de fazer teologia, entendida como uma “reflexão crítica da práxis histórica à luz da Palavra”[9]. A atenção decisiva desta teologia volta-se para o devir histórico da humanidade, que vem situado no horizonte salvífico. Rompe-se com a idéia de duas histórias, uma sagrada e outra profana, que correm paralelas, e acentua-se a unidade de uma só história cristofinalizada. Segundo a teologia da libertação, a ação salvífica de Deus está presente em todo processo histórico que trabalha em favor da dignificação do ser humano.

A dinâmica reflexiva da teologia da libertação vem iluminada pela perspectiva do pobre e de sua libertação. Uma vez que cada ser humano é o “templo vivo de Deus”, é no encontro e compromisso com ele e seu devir histórico que se realiza o encontro com Deus[10]. Mas decisivo é o encontro com o pobre e com o oprimido, pois estes são os privilegiados do Reino de Deus. Conforme a visão da teologia da libertação, o crescimento do Reino de Deus acontece mediante o processo histórico libertador, o que não significa que este processo esgote a realidade do Reino, que é antes de tudo um dom[11].

Como se pode verificar, a teologia da libertação confere um lugar muito importante à história como lugar da revelação do mistério de Deus, bem como ao pobre como destinatário privilegiado de sua ação. Não há como negar na teologia da libertação a presença do mundo do outro[12], mas este outro é concentrado na figura do pobre, do oprimido e das classes exploradas. Escapa do interesse imediato da teologia da libertação, sobretudo nas duas primeiras décadas de sua afirmação, uma abertura mais decisiva para a questão das outras tradições religiosas. Em sua tese doutoral, realizada em 1969, o teólogo Leonardo Boff chegou a tratar o tema em um dos capítulos de seu trabalho: a Igreja como sacramento e as religiões da terra[13]. Com base na reflexão de H.R.Schlette, L.Boff acentua a significação salvífica das religiões mundias como “caminhos ordinários” para Deus e reconhece a presença da graça nas religiões concretas. Este autor reconhece as religiões como fenômeno histórico-salvífico e sinaliza a importância do pluralismo das religiões. Tal pluralismo não é visto como expressão de confusão ou queda, mas como sinal “da riqueza do ser humano, das suas experiências e interpretações da realidade, que inclui a religião enquanto resposta do ser humano à iniciativa salvadora de Deus (...). Assim as religiões são caminhos ordinários de salvação em direção a Deus com base na história da salvação sacramentária geral”[14]. A reflexão de L.Boff, nesta ocasião, ainda estava marcada por certa perspectiva eclesiocêntrica. Há um reconhecimento da sacramentalidade geral nas religiões, mas igualmente uma sacramentalidade especial, que traduz a experiência da graça de forma mais qualificada em Israel e no cristianismo. Para Boff, o cristianismo traduziria “de um modo mais perfeito a glória de Deus e sua auto-entrega aos seres humanos na forma da grandeza, da vitória e do senhorio sobre a história da não-salvação e ao mesmo tempo na forma de rebaixamento, do poder sofrer e morrer, como se mostrou em Jesus de Nazaré”[15].

Sob o influxo do Concílio Vaticano II (1962-1965), a teologia da libertação acentuará a compreensão da Igreja como sacramento e sinal. Enquanto sacramento da salvação no mundo, a Igreja é convocada a viver em profunda fidelidade ao evangelho, sinalizando na história os valores fundamentais do Reino de Deus e do sonho de Jesus em favor de uma sociedade mais justa, fraterna e solidária. Ocorre na teologia da libertação uma perspectiva de “descentramento” da Igreja, que deixa de aparecer como lugar exclusivo de salvação. Toda a dinâmica eclesial vem compreendida na referência fundamental ao Reino de Deus e orientada para o compromisso com o ser humano, e em particular com o pobre. A Igreja vem, assim, situada no horizonte mais amplo da obra salvífica[16]. Mesmo reconhecendo que tal visada abriu uma perspectiva nova de compreensão eclesiológica, há que ressaltar a permanência de uma certa dinâmica ainda eclesiocentrada em textos específicos de teólogos da libertação, que pode ser compreendida enquanto experiência existencial de fé, celebrada numa dada comunidade, mas que não pode ser universalizada como experiência objetivante. No âmbito da atual situação de pluralismo religioso torna-se complexo manter, por exemplo, uma terminologia que identifica a Igreja como ponto quase culminante da densificação do Reino.[17]  

Ao se fazer uma retrospectiva da teologia da libertação nestas últimas três décadas, verifica-se que atenção preferencial da reflexão recaiu sobre a questão do pobre e de sua libertação. Estes foram os temas que conferiram sua especificidade e pertinência. Em nome desta especificidade buscou-se manter fidelidade aos caminhos percorridos, mesmo quando a reflexão teológica apontava a necessidade de abrir novos horizontes. Com respeito à teologia da libertação,

 

houve não poucas resistências a enveredar por esses novos caminhos, por violentar os temas, reduzindo-os de alguma forma à questão dos pobres. É a impressão que dava, em um primeiro momento, a tentativa de revitalizar a ‘opção pelos pobres’ com a problemática do negro, do índio e da mulher. Ou, de forma mais explícita, não reconhecendo a relevância de outras perspectivas aparentemente não libertadoras, como a da modernidade, a das culturas ou a das religiões.[18]

 

Uma dificuldade particular aconteceu no campo da relação com as religiões.  Os autores que vêm se dedicando ao tema da religião popular na teologia da libertação, reconhecem que faltou um empenho mais decisivo nesta área de interesse, não só com respeito à questão ecumênica, mas sobretudo no âmbito do diálogo com o mundo religioso alternativo do continente[19]. Isto não significa que o tema da religião não tenha entrado no repertório da teologia da libertação, mas a reflexão feita sobre o mesmo buscava sempre salientar o seu traço de ambivalência. De forma explícita ou mais matizada buscava-se, em geral, contrastar a religiosidade popular e a fé libertadora. Exemplos encontram-se presentes de forma muito evidente nos pioneiros da teologia da libertação.[20] Uma tendência similar ocorre com a preocupação de resgatar o traço libertador da religiosidade popular e o exercício de “purificá-la” de seus elementos “alienadores” e “opressores”.[21] Trata-se de uma perspectiva que teve incidência direta em documentos do episcopado latino-americano e outros de Igrejas locais. No Documento de Puebla, os bispos latino-americanos sublinham:  

 

Por falta de atenção dos agentes de pastoral e por outros fatores complexos, a religião do povo mostra em certos casos sinais de desgaste e deformação: aparecem substitutos aberrantes e sincretismos regressivos[22]

A posição prevalente neste campo, fundamentada na reflexão teológica do período, acentuava sempre a necessidade da acolhida dos elementos libertadores da religiosidade popular. Uma posição que se mantinha ainda refém de uma perspectiva de abertura limitada ao horizone da alteridade religiosa. Esta questão talvez merecesse um tratamento teológico mais aprofundado. As dificuldades da teologia com a religião são antigas, mas pode-se apontar um momento importante de balizamente desta questão, a partir do influxo do teólogo Karl Barth, que estabeleceu de forma decisiva a oposição entre religião e revelação. Por intermédio de Jean Daniélou esta oposição penetrou no domínio católico romano, dando início ao que se convencionar chamar de teologia do acabamento. Talvez possa se apontar na dificuldade presente em certos autores da teologia da libertação de perceber a positividade das religiões, uma certa herança desta reflexão que fez e faz ainda escola. Quando a declaração Dominus Iesus estabelece firmemente a distinção entre fé teologal e crença está manifestando esta herança e confessando sua dificuldade de reconhecer o valor de revelação nas outras experiências religiosas. Mas também teólogos da libertação manifestam dificuldade semelhante ao manter a distinção entre experiência de fé (teologia) e a experiência do sagrado (religião). Enquanto a primeira experiência indicaria o caminho de Deus aos homens, a segunda expressaria o caminho dos homens a Deus.[23] Como se pode perceber, o desafio de como viver a eclesialidade numa América Latina pluri-religiosa permanece como uma tarefa em aberto.

Foi sobretudo a partir da década de 90 que a teologia da libertação buscou responder de forma mais amadurecida ao desafio da acolhida da diversidade. A primeira incidência dessa temática ocorreu a partir dos autores que trabalhavam com a questão indígena e com o tema da inculturação. Nomes importantes como Diego Irarrazaval, Paulo Suess, Xavier Albó, Bartolomeu Meliá, entre outros, foram pioneiros na afirmação da singularidade do índio como outro, da especificidade de sua experiência de Deus e da peculiaridade exigida para o tratamento desta questão na teologia da libertação. A nova reflexão ajudou a ampliar a visão da teologia da libertação. Abre-se, então, espaço para a percepção da especificidade étnica, que não pode ser reduzida à questão da classe social, ou seja, a perceção de outros planos da opressão social. Em sintonia com a reflexão sobre a questão indígena, outros teólogos introduziram na reflexão teológica latino-americana a problemática da inculturação. Na mesma trilha aberta pelos teólogos que trabalhavam tais questões, pode ser igualmente mencionado o aporte trazido pelos teólogos e pastoralistas que desenvolveram a problemática da teologia das religiões afro no Brasil.[24] O impulso decisivo veio, porém, dos desenvolvimentos da espiritualidade da libertação. Com a reflexão e, sobretudo, a prática desta espiritualidade fortaleceu-se um clima decisivo de abertura e acolhimento da diversidade, de sensibilização  à gratuidade e de disponibilidade ao dom do Deus sempre maior. Uma expressão deste novo momento foi a realização do I Encontro da Assembléia do Povo de Deus, realizada em Quito (Equador), no ano de 1992. Nesta importante Assembléia consagrou-se a idéia de “macroecumenismo”. Um novo termo para expressar a nova consciência de um ecumenismo caracterizado pela universalidade do povo de Deus : o povo de Deus são muitos povos. Um novo ecumenismo que se dispõe a “abraçar com muito mais braços e muito mais corações o Deus único e maior”[25]. Vale destacar a presença de experiências e reflexões bem abertas e arrojadas de macroecumenismo hoje no Brasil, que ganham expressão viva entre autores como Pedro Casaldáliga e Marcelo Barros[26].   

Por ocasião do lançamento de nova edição de sua teologia da libertação, o teólogo Gustavo Gutiérrez escreveu um longo prefácio onde faz um balanço da teologia da libertação. Em sua visão, nos últimos anos o itinerário desta teologia veio enriquecido por uma ampliação de perspectiva. Sublinha em particular a importância do diálogo estabelecido com outras teologias, que ajudou a ampliar “a compreensão do mundo do pobre”, bem como a captar, compreender e valorizar melhor “aspectos de nosso povo que haviam permanecido na obscuridade de uma teoria pouco ou não correlacionada com a prática”[27]. Como um dos desafios contemporâneos fundamentais para a teologia da libertação, Gutiérrez aponta o pluralismo religioso e o diálogo inter-religioso. Trata-se para ele de uma “questão determinante para a fé cristã” no momento atual. Um desafio que se apresenta como delicado e complexo, novo e exigente.[28]

2. A acolhida do pluralismo religioso na teologia das religiões

 

A teologia das religiões ou do pluralismo religioso constitui um campo novo de reflexão e seu estatuto epistemológico vai sendo definido progressivamente. Trata-se de um fenômeno típico da modernidade plural, que provoca a crise das “estruturas fechadas” e convoca a “sistemas abertos de conhecimento”[29]. A originalidade desta dinâmica teológica só começou a se esboçar neste século, quando então a teologia cristã assume a perspectiva de uma singular relação com as outras religiões. Sob o influxo das ciências da religião, que favoreceram preciosos elementos para uma análise mais objetiva das religiões, a teologia cristã pôde defrontar-se de maneira mais positiva com a realidade do pluralismo religioso. A especificidade de uma teologia das religiões traduz-se na busca da compreensão do significado do pluralismo religioso nos desígnios de Deus para a humanidade.

Dentre os pioneiros que apontaram horizontes decisivos para o início de uma reflexão mais positiva do cristianismo com respeito às religiões podem ser destacados os nomes de Paul Tillich (1886-1965) e Karl Rahner (1904-1984). Num ambiente ainda marcado pela forte presença da teologia de Karl Barth, e de sua visão pessimista sobre as religiões, o teólogo Paul Tillich, sobretudo nos anos finais de sua vida, inaugura em âmbito protestante uma reflexão bem mais positiva sobre o tema. No desdobramento de uma importante viagem realizada no Japão, Paul Tillich passa a desenvolver um criativo trabalho teológico a propósito da questão do cristianismo e o encontro das religiões mundiais. Este trabalho tem início por volta do ano de 1961. Em texto sobre o significado da história das religiões para o teólogo sistemático[30], Tillich questiona a abordagem barthiana da religião, que acaba provocando a cisão entre a religião verdadeira (vera religio) e a as falsas religiões ( religiones falsae). Para Barth, somente o cristianismo estaria habitado por autêntica experiência de revelação. As outras religiões expressariam unicamente uma tentativa humana e inconsistente de alcançar a Deus. Reagindo a tal perspectiva, Tillich assinala que “as experiências reveladoras são universalmente humanas” e que a dinâmica reveladora e salvífica habita em todas as religiões[31]. Em outro texto sobre o diálogo entre cristãos e budistas, Tillich retoma sua argumentação, reforçando a idéia de que o diálogo entre as religiões só pode acontecer realmente quando se reconhece o valor da convicção do outro e de que esta “se funda numa experiência de revelação”[32]. No âmbito católico, será a presença de Karl Rahner a romper  os limites de uma reflexão estreita sobre a relação do cristianismo com as outras religiões. Marcando uma diferença substantiva com respeito à teologia do acabamento, defendida por teólogos como Danièlou e Henri de Lubac, o teólogo Karl Rahner indica que as diversas religiões não apresentam somente elementos de uma crença natural em Deus, mas trazem consigo “substanciais traços sobrenaturais da graça doada por Deus ao homem em Jesus Cristo”[33]. No espaço aberto desta renovação teológica ocorreram as primeiras tentativas sistemáticas de colocar a questão de uma teologia das religiões, como é o caso do livro de Heinz Robert Schlett, As religiões como tema da teologia, publicado em 1963.[34]

A teologia das religiões nascente seguirá um itinerário marcado por grande diversidade de perspectivas. Tende-se, em geral, a sintetizar estas perspectivas em três grandes linhas: exclusivismo, inclusivismo e pluralismo, embora tal terminologia encontre resistência entre determinados autores. Não vem aqui ao caso entrar em maiores detalhes sobre cada uma delas, o que já foi realizado extensivamente na reflexão sobre o tema[35]. O que importa no momento é buscar captar o movimento de abertura da reflexão teológica ao pluralismo religioso. A provocação mais decisiva veio da perspectiva pluralista, com John Hick e Paul Knitter, entre outros. Eles reagem sobretudo aos teólogos inclusivistas, que mesmo reconhecendo os valores espirituais de outras religiões, permanecem afirmando, ainda que implicitamente, a superioridade final do cristianismo. Para os inclusivistas, a salvação, onde quer que aconteça, é sempre salvação cristã. Sintetizando a postura pluralista, Hick indica que sua peculiaridade encontra-se no reconhecimento da “validade de todas religiões mundiais como contextos autênticos de salvação/libertação, os quais não são secretamente dependentes da cruz de Cristo”[36].

Sem desconhecer toda a complexidade que envolve o tema, há hoje um grupo de teólogos católicos que buscam responder positivamente o desafio da diversidade das religiões para o cristianismo, sem romper radicalmente com o inclusivismo, mas aceitando a interlocução fecundante do pluralismo. De forma ainda mais precisa, trata-se de teólogos que expressam sua insatisfação diante da maneira como o tema vem sendo refletido tanto no horizonte do inclusivismo cristocêntrico como no horizonte do pluralismo teocêntrico. Dentre os autores mais representativos desta nova perspectiva podem ser elencados: Jacques Dupuis, Christian Duquoc, Claude Geffré, Edward Schillebeeckx, Andrés Torres Queiruga, Joseph A DiNoia, John B. Cobb, David Tracy, Michael von Bruck (dentre os europeus e americanos)[37]; Michael Amaladoss, Raimundo Panikkar, Aloysius Pieris, Felix Wilfred (dentre os indianos)[38].  Este novo modelo de reflexão teológica sobre o pluralismo religioso ganha uma nomenclatura diversificada. Fala-se em em “inclusivismo aberto”, “inclusivismo mutual”, “inclusivismo recíproco”,  “pluralismo receptivo”, “pluralismo inclusivo” etc. Mas em comum partilha-se, em geral, a mesma convicção sobre o valor do pluralismo de princípio e do caráter irredutível e irrevogável das tradições religiosas.

O desafio dialogal da acolhida de um pluralismo de princípio aparece  em inúmeros autores da teologia das religiões. Pode-se verificar que este tema ganhou expressão mais viva onde a tradição cristã encontra-se em situação de minoria cognitiva, como no caso da Índia. Os teólogos asiáticos foram pioneiros nesta reflexão e seu influxo se fez sentir de forma expressiva nos documentos da Federação das Conferências Episcopais Asiáticas (FABC). Dentre os teólogos indianos, Raimundo Panikkar foi um dos pioneiros nesta avaliação positiva do pluralismo religioso. Já é de longa data sua defesa de um pluralismo de direito. Para Panikkar, não se pode captar a riqueza da experiência humana desconsiderando ou negando a realidade da diversidade. Para ele, “o pluralismo é uma das experiências mais enriquecedoras que a consciência humana pode realizar”, pois é ela que favorece a percepção da importância da acolhida da contingência[39].

Em âmbito do magistério católico, os primeiros movimentos de abertura nesta direção foram realizados pelas reflexões produzidas pela FABC, nascida em 1970. Já na Primeira Assembléia Plenária da FABC, realizada em Taiwan em abril de 1974, os bispos asiáticos sinalizaram a positividade das outras tradições religiosas no plano divino da salvação, enquanto portadoras de um “patrimônio de experiências religiosas”. Esta tendência de abertura será afirmada nos documentos posteriores desta Federação e de seus organismos conexos. Destaca-se como preocupação constante da FABC a abertura ao pluralismo religioso e sua articulação com a história da salvação. Fala-se em “pluralismo receptivo”, indicando a dinâmica inter-relacional e de complementaridade que vigora entre as religiões no único plano salvífico. Para o magistério asiático, a variedade das culturas e religiões é vista como “manifestação da infinita riqueza do Deus de todos os homens”, que durante toda a história cobriu de atenção e cuidado a caminhada diversificada dos povos. Retomando esta mesma sensibilidade, o breve documento do então Secretariado para os Não-Cristãos sobre a Igreja e as outras religiões (DM-1984) introduzirá em âmbito mais oficial este posicionamento de grande abertura à realidade do pluralismo religioso, sinalizando a visão da imanência universal de Deus no mundo.

 

3, Teologia da Libertação e Teologia das Religiões: Peculiaridades e Convergências

 

Um dos importantes desafios levados a cabo pela Associação Ecumênica dos Teólogos do Terceiro Mundo (EATWOT) foi o estabelecimento de uma maior aproximação e diálogo entre a teologia da libertação e a teologia das religiões. De fato, enquanto a teologia da libertação esteve mais centrada na questão dos pobres, do sofrimento e da injustiça, a teologia das religiões buscava responder ao desafio do pluralismo religioso. Nos primeiros dez anos de sua existência, esta Associação teológica esteve mais sob o influxo da teologia da libertação. Vale lembrar igualmente que os teólogos da libertação tiveram grande influência sobre muitos teólogos das religiões. A nova geração de teólogos indianos, que marcou o desenvolvimento da reflexão sobre o pluralismo religioso, sofreu um grande influxo seja do Vaticano II como da teologia da libertação. Estes teólogos “acolheram com particular interesse os novos modelos de pensamento teológico e de práxis pastoral da América Latina. Logo depois do Concílio, Gustavo Gutiérrez torna-se um nome familiar e o seu texto fundamental sobre a teologia da libertação (1971) encontra ávida acolhida”[40].  Durante a década de 80, haverá um novo desenvolvimento na EATWOT, com uma presença mais decisiva da linha de reflexão dos teólogos asiáticos e de sua preocupação com a questão do pluralismo religioso, da inculturação e do diálogo entre as religiões. A teologia da libertação saiu enriquecida com esta nova presença. Hoje  percebe-se com mais clareza, a singularidade das ênfases específicas que marcam as teologias asiática, latino-americana e africana, mas questiona-se uma compartimentalização estanque e rígida de seus desafios[41].  

O que vem sendo constatado nestes últimos anos é a urgente necessidade de uma maior interação entre a teologia da libertação e a teologia das religiões. Como bem acentuou Paul Knitter,

 

os teólogos da libertação estão percebendo que a libertação econômica, política e especialmente nuclear é uma tarefa grande demais para uma única nação, cultura ou religião. Torna-se necessário compartilhar, em âmbito intercultural e inter-religioso, a teoria e a práxis da libertação. E os teólogos das religiões estão percebendo que um diálogo entre as religiões que não promova o bem-estar de toda a humanidade não é diálogo religioso.[42]

 

Estava lançado um duplo desafio. De um lado, a importância da ampliação dos confins regionais da teologia da libertação e do envolvimento do movimento de libertação para outras religiões; de outro, a importância da teologia das religiões manter sempre acesa a opção pelos empobrecidos e excluídos, levando a sério a questão da pobreza e da opressão.[43] Não há como negar a singularidade e riqueza que animam a reflexão destas duas teologias. Constituem expressões das mais criativas e revitalizantes que pontuam o pensamento teológico contemporâneo, e que buscam responder a uma das questões que mais desafiam as Igrejas e religiões no tempo atual: a realidade dolorosa de tantos pobres, a riqueza da dinâmica cultural multifacetada e a diversidade das religiões.

Talvez a convergência mais profunda que vincula a teologia da libertação com a teologia cristã das religiões é a mesma paixão pelo horizonte mais amplo do Reino de Deus. Estas teologias não cansam de afirmar sua esperança e sua luta em favor de uma dinâmica reinocêntrica. Na perspectiva de um pluralismo de princípio, vigora a chave hermenêutica da presença universal do Mistério em toda a criação e história. A missão eclesial não perde o seu lugar, mas vem redefinida em chave reinocêntrica. O testemunho permanece como essencial, mas sempre entendido na dinâmica de um “intercâmbio de dons”. Os cristãos não têm porque omitir para os outros a sua experiência de encontro com o Senhor, a alegria deste “mistério de amor”. Este desejo de compartilhá-lo com os outros deve, porém, ser motivado por este mesmo amor. O testemunho autêntico ocorre não em razão de uma obrigação ou “mandato”. Um testemunho realizado sob tais bases provoca, antes, a crise e o descrédito da própria Igreja. E o fundamental não é a provocação em favor da mudança de religião, mas da mudança de perspectiva de vida: de uma vida auto-centrada para uma vida centrada no mistério de Deus. Daí ser a conversão mais profunda a que direciona todos para o mistério de Deus.

O caminho seguido por setores importantes da teologia das religiões não foi o da exclusão da referência singular a Jesus Cristo, mas o questionamento de um “cristocentrismo que não é cristão”, e que acaba absolutizando o cristianismo[44]. A “experiência de Jesus”, a presença viva de seu “mistério”, que provocou impacto nos seus primeiros discípulos,  continua hoje a interpelar os seres humanos em favor de um horizonte alternativo de afirmação de vida. O teólogo indiano, George Soares Prabhu, falecido precocemente, trabalhou de forma admirável a importância da experiência e significado de Jesus para os cristãos na Índia, o que vale substancialmene para a América Latina. A preocupação concentra-se sobre o significado de Jesus, e não sobre a “estrutura de seu ser”; sobre o “mistério de Jesus”, e não sobre os “mecanismos” utilizados para explicar este mistério. A cristologia tradicional acabou concentrando-se sobre tais mecanismos e “abafou” e “embotou” o  mistério que dá vida. A compreensão de Jesus que emerge como desafio para o terceiro mundo e aberta à dinâmica dialogal deve estar animada pela dialética do Jesus da fé e o grito pela vida:

 

Jesus é um nome salvador pelo mistério Absoluto que ele experienciou por nós. Mas o inexaurível  Mistério Absoluto tem, como o hinduísmo ensina, um milhar de nomes salvadores. (...) Todos esses nomes nos falam da incrível riqueza da experiência religiosa da humanidade, que reúne formas de religiosidade tão abundantes como as flores de uma floresta. Querer disputar sobre a superioridade de uma ou de outra destas não parecerá nem prático, nem sábio. Verdadeiramente, o problema da unicidade de Cristo como discussão na teologia hoje parecerá, para mim, como um problema acadêmico com pequeno significado. (...) Na Ásia, ao menos, é Deus (e não Cristo)  quem sempre permanece no centro. Este é o porque, talvez, dos asiáticos não terem produzido notáveis cristologias, mas muitas teologias: a verdadeira ‘unicidade’ de Cristo é a unicidade do caminho da solidariedade e luta (um caminho que não é nem masculino nem feminino) que Jesus mostrou como o caminho para a Vida. Nós ‘seguimos’ Jesus ao longo deste caminho porque nós experienciamos o Mistério Absoluto nele e realizamos este seu caminho como sendo verdadeiramente o caminho para a Vida. Convidamos outros para percorrê-lo conosco e compartilhar da experiência que temos tido, sem afirmar que é o único caminho ou o único melhor[45]

 

Como desafio em aberto insere-se a exigência de uma acolhida mais decisiva da simbologia inter-religiosa do Reino de Deus, entendido como “mistério que provoca uma profunda relação entre todas as religiões sem ligar-se de maneira exclusiva a nenhuma delas”[46]. Ao acolher esta simbologia, acolhe-se igualmente a realidade e o valor da alteridade, que faz de cada tradição um mistério de incomensurabilidade que não pode  ser reduzido em seu significado mais profundo. Este mistério da diferença está presente em toda dinâmica inter-pessoal. Como assinala a poeta Lya Luft, há um “espaço de silêncio intransponível mesmo nos mais íntimo amores”[47]. Um silêncio de incomensurablilidade que preserva igualmente a singularidade de cada tradição religiosa. A presença e o reconhecimento deste enígma não obstruem, porém, o desafio do dinamismo dialogal. O outro é alguém único, mistério, mas que igualmente convida ao encontro e se disponibiliza para o aprendizado da diferença.

Esta paixão comum pelo Reino, que convoca ao exercício da alteridade, é também convocação a uma dinâmica radical de compaixão, que busca a afirmação da vida e a justiça para todos. Em favor de uma “ecumene da compaixão”, o teólogo Johann B. Metz expressou de forma feliz a razão de ser do discurso teológico: “o discurso sobre Deus só pode ser universal, ou seja, significativo para todos os seres humanos, se em seu núcleo, traduz um discurso sobre um Deus sensível ao sofrimento dos outros”[48].

(Artigo publicado no livro: ASETT (Org). Pelos muitos caminhos de Deus. Desafios do pluralismo religioso à teologia da libertação. Goiás: Rede, 2003, pp. 65-84)

[1] Claude GEFFRÉ. Croire et interpréter: le tournant herméneutique de la thélogie. Paris: Cerf, 2001, p. 9.

[2]  Jacques DUPUIS. Il cristianesimo e le religioni: dallo scontro all´incontro. Brescia: Queriniana, 2001, p. 34.

[3] Este é o termo hoje mais preciso para tratar a questão, embora tradicionalmente fala-se mais em teologia das religiões. Neste trabalho os dois termos serão adotados, sendo o segundo aplicado, sobretudo, ao tratar o histórico desta reflexão teológica.

[4] SECRETARIADO para os Não-Cristãos. A Igreja e as outras religiões. São Paulo: Paulinas, 2001, n. 41 (Documento Diálogo e Missão).

[5] Jacques DUPUIS. Il cristianesimo... Op.cit., p. 469. Os teólogos asiáticos foram pioneiros neste reconhecimento do pluralismo de princípio. Num belo documento dos bispos da Índia, datado de 1969, afirmava-se: “As outras religiões não são muros para se atacar ou abater. Constituem morada do Espírito que nós ainda não visitamos; são receptáculos da Palavra de Deus que nós optamos por ignorar”. Felix A MACHADO. Diventare un’autentica chiesa locale: fare teologia nell’Asia del Sud. In: AAVV. Teologia delle religioni: bilanci e prospettive. Milano: Paoline, 2001, p.169.

[6] Peter BERGER. O dossel sagrado. São Paulo: Paulinas, 1985, p. 159.

[7] CONGREGAÇÃO para a Doutrina da Fé. Declaração Dominus Iesus. São Paulo: Paulinas, 2000 (Aqui siglada como DI).

[8] Segundo a declaração Dominus Iesus, a fé teologal consiste na “aceitação da verdade revelada por Deus Uno e trino”; já a crença nas outras religiões traduz “a experiência religiosa ainda à procura da verdade absoluta e ainda carecida do assentimento a Deus que se revela” (DI 7). Trata-se de uma distinção que vem confirmar a adesão à teologia do acabamento, que busca marcar de forma nítida a diferença substancial entre o cristianismo e as outras religiões.

[9] Gustavo GUTIÉRREZ. Teologia da libertação. Petrópolis: Vozes, 1975, p. 26.

[10] Ibidem, p. 162.

[11] Ibidem, p. 155. Como indica Jon Sobrino, “a teologia da libertação leva muito a sério a dimensão essencialmente histórica do reino de Deus. Isto significa que não deixa sua aparição para o final da história, embora só no final se dará sua plenitude, mas insiste em sua realização atual no presente da história”: Jon SOBRINO. Jesus, o libertador. Petrópolis: Vozes, 1994, p. 193.

[12] Gustavo GUTIÉRREZ. A força histórica dos pobres. Petrópolis: Vozes, 1981, p. 69.

[13] Leonardo BOFF. Die Kirche als Sakrament im Horizont der Welterfahrung. Paderborn: Verlag Bonifacius-Druckerei, 1972. O  capítulo assinalado está sendo publicado na revista Numen do programa de pós-graduação em ciência da religião da UFJF, acrescido de um post scriptum do mesmo autor.

[14] Leonardo BOFF. A Igreja como sacramento e as religiões da terra. Art.cit., Mimeo, p. 10

[15] Ibidem, p. 9. Esta perspectiva retorna, ainda que de forma um pouco mais matizada, em outros livros do autor: “A graça que empapa o mundo, atingiu em Jesus Cristo e em sua comunidade (a Igreja) sua expressão sacramental mais densa”: Id. A graça libertadora no mundo. Petrópolis: Vozes, 1976, p. 148; “A Igreja constitui (...) uma elite cognitiva, com consciência mais profunda da realidade salvadora presente no mundo e afetando a todos”: Id. Teologia do cativeiro e da libertação. Petrópolis: Vozes, 1980, p. 209.  No post scriptum ao capítulo de sua tese doutoral, escrito em 2000, L.Boff reconhece que sua visão teológica na ocasião era ainda “refém da visão católica”, ou seja, uma visão que “parte como dado não discutido que a Igreja detém, sozinha, a plenitude dos meios de salvação. Por isso ela representa a culminância não ultrapassada e ultrapassável do desígnio de Deus”. L. Boff lança uma interrogação: em que medida esta visão guarda algo de narcisismo eclesial, ou seja, de uma Igreja que “só vê a si mesma nos outros”. Em realidade, conclui, “ela não reconhece a alteridade como alteridade”.

[16] Gustavo GUTIÉRREZ. Teologia da libertação. Op.cit., p. 210 e 213.

[17] Veja por exemplo a reflexão de C.Boff sobre os graus de eclesialidade. C.BOFF. Comunidade eclesial comunidade política.  Petrópolis: Vozes, 1978, p. 56. Segundo C.Boff, é necessário uma significativa densificação do Reino para que a Igreja mereça plenamente o nome de Igreja: uma Igreja madura e inteira, ainda que não completa e perfeita, uma vez que se encontra sempre sob reserva escatológica. Mas esta Igreja madura, conforme assinala, está “munida da plenitude dos meios salutares”: Ibidem, p. 56.

[18] Carlos PALÁCIO. Trinta anos de teologia na América Latina. In: L.C.SUSIN (Org.). O mar se abriu: trinta anos de teologia na América Latina. São Paulo: Loyola/SOTER, 2000, p. 63.

[19] Diego IRARRAZAVAL. Vertientes teologicas actuales. Balance desde abajo, adentro, adelante. In: : L.C.SUSIN (Org.). O mar se abriu: trinta anos de teologia na América Latina. São Paulo: Loyola/SOTER, 2000, p. 101. Para Irarrazaval, há uma “dívida eclesial” da teologia com respeito à fe do povo. Ele sublinha que “a teologia da libertação, escassamente, levou a sério a complexa e maravilhosa trajetória religiosa de nossos povos”: Id. Religiões do povo e sua teologia. In: L.C.SUSIN (Org.). Sarça ardente. São Paulo: Paulinas/SOTER, 2000, p. 384. O teolólogo Jon Sobrino reconheceu que em sua obra este tema só apareceu de forma bem fragmentada. Cf. J.SOBRINO. Teología desde la realidad. In: L.C.SUSIN (Org.). O mar se abriu. Op.cit., p. 169.

[20] Aloysius PIERIS. El rostro asiatico de Cristo. Salamanca: Sigueme, 1991, p. 100.

[21] João Batista LIBÂNIO. Teologia da libertação: roteiro didático para um estudo. São Paulo: Loyola, 1987, p. 279.

[22] III CONFERÊNCIA Geral do Episcopado Latino-Americano. A evangelização no presente e no futuro da América Latina. Petrópolis: Vozes, 1979, n. 452.

[23] João Batista LIBÂNIO. Religião e teologia da libertação. In: L.C.SUSIN (Org.). Sarça ardente. Op.cit., p. 81-85.

[24] Para maiores detalhes cf. Faustino TEIXEIRA. A interpelação do diálogo inter-religioso para a teologia. In: L.C.SUSIN (Org.). Sarça ardente. São Paulo: Paulinas/SOTER, 2000, p. 421-429.

[25] Manifesto do I Encontro da Assembléia do Povo de Deus. In: F. TEIXEIRA. O diálogo inter-religioso como afirmação da vida. São Paulo: Paulinas, 1997, p. 150.

[26] Pedro CASALDÁLIGA. O macroecumenismo e a proclamação do Deus da vida. In:  F. TEIXEIRA. O diálogo inter-religioso como afirmação da vida. Op.cit., p. 31-38; Id & José María VIGIL. Espiritualidade da libertação. Petrópolis: Vozes, 1993, p. 192s; Marcelo BARROS. O sonho da paz. Petrópolis: Vozes, 1996. Uma das experiências em curso hoje no Brasil das mais inovadoras neste campo está associada ao nome de Marcelo Barros. Trata-se da experiência de macroecumenismo vivido e celebrado no Mosteiro da Anunciação de Goiás (GO).

[27] Gustavo GUTIÉRREZ. Teologia da libertação. São Paulo: Loyola, 2000, p. 13 e 19. Ver ainda: J.I.GONZÁLEZ FAUS. Los pobres al centro. In: L.C.SUSIN (Org.). O mar se abriu. Op.cit., p. 197.

[28] Gustavo GUTIÉRREZ. Situação e tarefas da teologia da libertação. In: L.C.SUSIN (Org.). Sarça ardente. São Paulo: Paulinas/SOTER, 2000, p.55-57. Para Gutiérrez, o trabalho teológico deverá se debruçar sobre este tema, entendendo-o como um sinal dos tempos, buscando nele discernir, “à luz da fé, o novo campo hermenêutico que lhe é proporcionado para pensar a fé e para um falar de Deus que tenha algo a dizer às pessoas de nosso tempo”: ibidem, p. 52.

[29] Peter BERGER. Rumor de anjos. 2 ed. Petrópolis: Vozes, 1997, p. 45.

[30] Paul TILLICH. Il futuro delle religioni. Brescia: Queriniana, 1970, p. 117-137 (a versão original é de 1966). Infelizmente, Tillich não teve o tempo suficiente para elaborar uma reflexão mais sistemática sobre o diálogo inter-religioso, pois morreu um pouco depois. Sua intenção era renovar toda a sua teologia sistemática com base neste novo desafio.

[31] Ibidem, p. 118.

[32] Paul TILLICH. Le christianisme et les religions. Paris: Aubier, 1968, p. 133.

[33] Karl RAHNER. Cristianesimo e religioni non cristiane. In: Saggi di antropologia soprannaturali. Roma: Paoline, 1975, p. 545. Esta tese de Rahner reaparecerá no decreto Ad gentes (n.9) do Concílio Vaticano II: “O que de verdade e graça há no coração e no espírito dos homens ou nos ritos e culturas próprias dos povos, não só não se perde, mas é purificado, elevado e consumado para a glória de Deus”.

[34] Com este autor se introduz na reflexão a distinção: as religiões como caminhos legítimos e ordinários de salvação e a Igreja como caminho extraordinário de salvação. Esta tese, que encontrará viva resistência na aula conciliar,  será substancialmente invertida na exortação apostólica Evangelii nuntiandi de Paulo VI (cf. EN n. 80).

[35] Para uma síntese cf. Faustino TEIXEIRA. Teologia das religiões. São Paulo: Paulinas, 1995.

[36] John HICK. A metáfora do Deus encarnado. Petrópolis: Vozes, 2000, p. 121. E continua: “aqueles entre nós que advogam esta posição pluralista o fazem porque ela nos parece mais realista, em termos religiosos, do que as alternativas mais antigas. Pois vemos que dentro de cada uma das grandes tradições, naquilo que elas têm de melhor e mais ou menos na mesma proporção, se realiza a transformação salvífica da vida humana...”: Ibidem, p. 122.

[37] Uma boa abordagem sobre os desdebramentos atuais da teologia das religiões pode ser encontrada na obra de Monique AEBISCHER-CRETTOL. Vers uns oecuménisme interreligieux: jalons pour une théologie chrétienne du pluralisme religieux. Paris: Cerf, 2001 (sobretudo pp. 317-629).

[38] Há que ressaltar a resistência imposta pelos teólogos asiáticos ao esquema ocidental de caraterização da teologia das religiões em exclusivista, inclusivista e pluralista. Para eles, este esquema é muito simplificado e redutor. Veja por exemplo a crítica feita ao mesmo por A.Pieris: Liberación, inculturación, diálogo religioso: un nuevo paradigma desde Asia. Navarra: Verbo Divino, 2001, p. 259. Para os teólogos indianos, em particular, o esquema inclusivista que tende a relacionar o valor salvífico das religiões com a fé implícita em Jesus Cristo não ganha grande acolhida, já que não corresponde à experiência real e vivida pelos crentes de outras tradições. Cf. George GISPERT-SAUCH. La teologia indiana dopo il Vaticano II. Rassegna di Teologia, v. 42, n. 1, 2001, p. 24.

[39] Raimon PANIKKAR. Entre Dieu et le cosmos.  Paris: Albin Michel, 1998, p. 166. Ver ainda: Id. Sobre el dialogo intercultural. Salamanca: Editorial San Esteban, 1990, p. 17-94.

[40] George GISPERT-SAUCH. La teologia indiana dopo il Vaticano II. Art.cit., p. 11. Para um estudo mais detalhado sobre o itinerário da teologia indiana cf. Jose KUTTIANIMATTATHIL. Practice ant Theology of Interreligiou Dialogue. A critical Study of the Indian Christian attemps since Vatican II. Bangalore: Kristu Jyoty Publications, 1995 (trata-se de uma tese doutoral defendida na Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma). Influxo semelhante aconteceu entre outros teólogos das religiões, como Paul Knitter: “A teologia da libertação tornou-se para mim não um mero ‘novo método’, mas a ocasião para compreender o significado da religião e do ser fiel discípulo de Jesus”: Id. Una terra molte religioni. Assisi: Cittadella Editrice, 1998, p. 29.

[41] Como sublinhou Gustavo Gutiérrez, “é preciso evitar a tentação de classificação, que consiste em distribuir tais desafios aos vários continentes: o da modernidade, ao mundo ocidental; o da pobreza, à América Latina e à África; e o do pluralismo religioso, à Ásia”: In: L.C.SUSIN (Org.). Sarça ardente. Op.cit., p. 77.

[42] Paul KNITTER. A teologia católica das religiões numa encruzilhada. Concilium, v. 203, n. 1, p. 111, 1986.

[43] Como assinalou Knitter, assim como a teologia da libertação não pode relativizar em sem método teológico a atenção dada ao contexto cultural e religioso global, a teologia das religiões, por sua vez, deve  estar atenta à comum e humana experiência do sofrimento como “kairos hermenêutico para o encontro inter-religioso”: Id. Una terra molte religioni. Op.cit., p. 109 (e também p. 33, 37 e 146); Id. Per una teologia della liberazione delle religioni. In: J.HICK & P.KNITTER. L’unicità cristiana: un mito? Per una teologia pluralista delle religioni. Assisi: Cittadella Editrice, 1994, p. 314-318.

[44] Adolphe GESCHÉ. O cristianismo e as outras religiões. In: F.TEIXEIRA. Diálogo de pássaros. São Paulo: Paulinas, 1993, p. 56-57.

[45] George Soares PRABHU. The Jesus of Faith. India (Pune). Mimeo, p. 27-28.

[46] M.M.QUATRA. Regno di Dio e missione della Chiesa nel contesto asiatico: uno studio sui documenti della FABC (1970-1995). Tese de Doutorado em Missiologia. Faculdade de Missiologia, Pontifícia Universidade Gregoriana. Roma, 1998, p. 325.

[47] Lya LUFT. Mar dentro. 3 ed. São Paulo: ARX, 2002, p. 30.

[48] Johann B. METZ. La compasión. Un programa universal del cristianismo en la época de pluralismo cultural y religioso. Revista Latinoamericana de Teologia. v. 19, n. 55, p. 27, 2002.

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