terça-feira, 13 de abril de 2010

O Moisés de Frida Kahlo

Moisés: o núcleo da criação

Faustino Teixeira
PPCIR-UFJF

Não há quem consiga ficar indiferente à força estética e ao vigor vital de Frida Kahlo (1907-1954), esta artesã das cores que fez de sua existência um exemplo singular de liberdade, coragem e criatividade. Vale para ela o que a escritora Lya Luft falou sobre as mulheres ensolaradas, cuja “luminosidade se espalha por toda parte. Mesmo abaladas por alguma fatalidade, ainda que lhes falte o que para tantas sobra em beleza ou luxo, têm em si uma espécie de obstinado sol que se desprende delas como um perfume” . O seu atual reconhecimento na América Latina não se dá unicamente por sua arte, mas também por sua coragem de ser e por sua sede de vida. Os mexicanos ainda hoje reconhecem em Frida a “alma do México”, por traduzir e simbolizar com a sua vida a luta do país contra a violência e a busca de identidade. No quadro que vamos examinar, “Moisés ou o Núcleo da criação”, de 1945, estão presentes os diversos traços que delineiam a força geradora de sua arte e a tônica de sua espiritualidade, entendida como obstinada sede de habitar o universo e de se abrir aos outros e aos contornos do real. É uma artista que a partir da experiência do limite e das fronteiras consegue recompor a dinâmica existencial e apontar um sentido escondido: “na sua dor e esperança, ela resgata o holos, a inteireza da existência, a integração de todas as coisas, a totalidade da vida. Essa dimensão é visível nos quadros que retratam sua dor, mas também nos que refletem sua visão de mundo (...)” .

A pintura como expressão de uma vida

A linguagem pictórica de Frida Kahlo guarda uma especificidade própria. A sua sintaxe nasce de uma história de dor e esperança. Sua pintura é expressão de uma vida. Através da arte ela dribla a dor e enuncia uma palavra que traduz as raízes de sua intimidade, fazendo transbordar questões que tocam a fundo a dinâmica do humano. Sua pintura, na verdade, é uma biografia, pois aproxima-se mais da obra de um escritor. É como “uma espécie de diário, ou a correspondência de toda uma vida” .

A obra de Frida nasce de um “corpo em dor”, das chagas abertas pelas intempéries da vida: doenças, ferimentos, amputações, abortos, traições e solidão. Encontrou na arte a resposta aos óbices da vida, a força e o poder revolucionário de transgredir o real. Essa mulher-coragem não hesita em expor as imagens de sua intimidade e resgatar com as cores o sopro de vida. Na arte encontra “asas para voar” e transpor os limites de sua sinistra realidade. Trata-se de alguém que “forjou na própria carne dilacerada seu estilo de ser, sua transcendência, e talvez seja um dos modelos exemplares de que o desamparo pode, mesmo como fonte permanente de angústia, ganhar uma feição criativa” . No auto-retrato “Árvore da esperança, mantém-te firme”, de 1946, Frida expõe a dualidade de sua existência: de um lado a Frida de corpo nu e enfraquecido, com as cicatrizes expostas, de rosto encoberto e voltado para um deserto árido e fendido; de outro, a Frida que mantém acesa a esperança, de olhar sereno, que tem numa das mãos o colete que a aprisionava ao corpo e na outra a bandeira com a mensagem da árvore da esperança, cujos versos foram retirados de uma de suas canções preferidas . O quadro reflete o duelo interior que acontece na vida da artista: a vontade de viver que se enfrenta com “o apelo de deixar fluir em direção à morte” . Mas como em muitos de seus quadros, o sol está sempre a iluminar Frida, reforçando em seu coração o alento de continuar acesa.

A liberdade era um traço característico da obra de Frida. Sua arte não cabia em rótulos estigmatizados. Diante da pergunta feita por André Breton, sobre sua possível filiação ao surrealismo, ela descarta essa hipótese e assinala que aquilo que pinta é a sua própria realidade . Em seu diário íntimo, redigido entre os anos de 1944 a 1954, como forma de enfrentar a crescente solidão e mergulhar mais fundo na intensidade da vida, assinala: “A pintura preencheu a minha existência” .

Em ousadia que rompe com os padrões da época, Frida revela os emblemas da feminilidade: “São pinturas provocativas que expõem pela primeira vez imagens da intimidade mais secreta das mulheres: imagens de nascimento e aborto, órgãos internos à vista, entranhas do corpo feminino tornadas objeto de arte elevada” . Uma arte que desvela também a cidadania de uma sexualidade ambivalente, como a que vem expressa no belo quadro “Dois nus na floresta”, de 1939 . Mas a feminilidade vem igualmente expressa em sua beleza e gratuidade, no colorido dos trajes tradicionais mexicanos (tehuana) e na delicadeza das expressões, olhares e gestos. Frida tinha o dom de compor auto-retratos. Neles ela sempre aparece “vestida com roupas simples e não sofisticadas ou com vestes índias, exprimindo assim a sua identificação com a população indígena e, consequentemente, a sua própria identidade nacional” .

O trabalho sobre Moisés

O trabalho de Frida Kahlo sobre Moisés insere-se numa série de realizações pictóricas realizadas pela artista na década de 40. O contexto histórico do período é marcado por grandes tribulações. Em 1939 tem início a Segunda Guerra Mundial. Neste mesmo ano terminava a Guerra Civil Espanhola, com a vitória dos nacionalistas. Em agosto de 1940 ocorre o assassinato de Leon Trotski, que tinha sido acolhido por Frida e Rivera na Casa Azul em janeiro de 1937 . Com a invasão da Rússia pelos alemães, em 1941, cresce a oposição de Stalin a Hitler, o que favorecerá a maior aproximação de Frida ao Partido Comunista. O desencadeamento do conflito mundial vai provocar no México um grande desenvolvimento econômico, em razão da busca de matérias-primas para a indústria armamentista americana. Mas no âmbito político, o México passa por certa mudança de rumo, inclinando-se mais à direita, o que terá repercussões na política cultural. Frida Kahlo foi sempre uma entusiasta da revolução mexicana (1910-1920) e uma apaixonada pela causa comunista. Sua adesão ao Partido Comunista Mexicano acontece em 1928, permanecendo até o final de 1929, quando dele se afasta em protesto contra a expulsão de Rivera. Sua reintegração ao Partido se dará em1948.

No âmbito afetivo e profissional, o início dos anos 40 foram bem proveitosos para Frida Kahlo. Em 1940 Frida e Rivera casam-se novamente, depois de passarem pouco mais de um ano divorciados. Frida vive um momento de tranqüilidade que vai se refletir nos quadros deste período. As coisas simples e que mais ama vão brilhar em suas telas, em obras de grande beleza e arte. Como dizia Emmy Lou Packard, uma das assistentes de Rivera, “eram estas coisas comuns da vida – animais, crianças, flores, o campo – por que Frida mais se interessava” . O valor de sua obra artística ganha um reconhecimento público. Participa de importantes exposições coletivas, entre as quais a Exposição Internacional do Surrealismo, realizada na cidade do México em janeiro de 1940. Passa também a ser membro do Seminário de Cultura Mexicana, em 1942, um organismo sob a tutela do Ministério da Educação Pública. Aceita igualmente o convite para ser professora da Escola de Pintura e Escultura, a mais prestigiosa escola de arte mexicana, com o encargo de 12 aulas semanais de pintura.

Mas em 1944 a saúde começa novamente a fraquejar, tendo que usar um colete de aço . É desta época o impressionante auto-retrato intitulado “A coluna partida”. Em 1946 sofre uma delicada intervenção cirúrgica na coluna vertebral, que deixa em suas costas profundas cicatrizes. Em carta ao seu patrono, o engenheiro Eduardo Morillo Safa, a quem dedicou o auto-retrato “Árvore da esperança, mantém-te firme” assinala: “Já estou quase a acabar o seu primeiro quadro, que é obviamente o resultado da horrível operação: estou sentada, à beira de um abismo, com o meu colete de couro numa mão. Atrás, estou deitada numa maca de hospital – virada para a paisagem – com parte do meu corpo descoberta, e assim pode ver as cicatrizes dos cortes que estes filhos da mãe destes cirurgiões me fizeram” . São do mesmo período outros quadros que expressam sua dor, sofrimento e desencanto: “Sem esperança” (1945), “Paisagem” (1946/1947) e “O veado ferido” (1946) .

O quadro Moisés insere-se neste período difícil de Frida Kahlo. O quadro data de 1945, e foi premiado em 1946, na exposição de arte anual do Palácio de Bellas Artes. Sua inspiração veio da leitura do livro de Freud, “Moisés, o Homem e a Religião”. Há que assinalar um fato curioso que aproxima Frida Kahlo de Freud. Os dois autores voltam-se para a figura de Moisés num momento crucial e doloroso de suas vidas. No caso de Frida, é o período do agravamento de sua saúde, que vem barrar um momento importante de afirmação profissional. Com respeito a Freud, ele passa a se interessar por Moisés nos anos derradeiros de sua vida, quando estava acometido de câncer na mandíbula, enfrentava a perda de discípulos próximos e a realidade do nazismo, que o obrigou a emigrar com a família para a Inglaterra. E não é fortuita esta aproximação, como mostra Moacyr Jaime Scliar em sua tese doutoral: “Há uma razão óbvia para isto: Moisés é o líder que tira o seu povo de uma situação de opressão e o conduz para um novo destino, uma figura na qual Freud deve ter pensado muitas vezes enquanto tentava penosamente escapar de um destino que se afigurava tão sombrio quanto o dos judeus escravizados pelo Faraó” .

Com base no relato bíblico do livro do êxodo, pode-se associar a Moisés três idéias-força. É alguém que passou por uma experiência de desamparo, mas que conseguiu acolhida. A criança que havia sido abandonada em seu cesto de papiro à beira do rio, e que chorava, recebe o cuidado e a atenção da filha do faraó, que assegura as condições para o seu crescimento junto à sua mãe. Uma vez crescido, o menino será adotado pela filha do Faraó, que lhe dá o nome de Moisés, por ter saído das águas (Ex 2,1-10) . Uma vez crescido, Moisés será aquele que se compadece dos filhos de Israel, que vivem “sob o peso da servidão”, e assume o clamor de Deus em favor de sua libertação. Moisés torna-se o enviado e servidor de Deus, o libertador que luta para resgatar os filhos de Israel da servidão do faraó (Ex 3,7-10). Mas é também o portador do mistério de Deus, aquele que provoca uma importante revolução na forma de conceber a divindade. Ele introduz aquilo que hoje denominamos henoteísmo, ou seja, uma forma singular de politeísmo que, sem negar a existência de outros deuses, busca cultuar uma única divindade: “Não terás outros deuses diante de mim” (Ex 20,3). Com esse henoteísmo, Iahweh passa a ser o único Deus que conta para Israel. É no processo de evolução secular do henoteísmo original que a religião de Israel encontrará sua dinâmica mais importante, singular e prodigiosa, com o monoteísmo absoluto configurado no século VII AEC no livro do Deuteronômio, meio milênio depois de Moisés. Com Moisés, a forma de conceber Iahweh será igualmente bem distinta daquelas que configuravam as potências divinas conhecidas até então. Trata-se agora de um Deus sublime e majestoso, de um Deus sempre maior e distante dos seres humanos, que não pode ser representado sob forma alguma. A critica ao antropomorfismo revela-se na recusa a dar um rosto a Iahweh. Moisés proíbe as imagens e tudo aquilo que pudesse evocar a “humanidade” de Iahweh. Essa nova visão religiosa vem igualmente animada por grande profundidade espiritual. Como assinala Jean Bottéro, um dos maiores historiadores das religiões semitas, Moisés inaugura uma compreensão de Deus “verdadeiramente transcendente”, um Deus do coração, diverso de toda e qualquer representação humana, um Deus que rompe as explicações quiméricas e que simplesmente existe, está presente: “Eu sou aquele que é” (Ex 3,14). Esta expressão bíblica encontra semelhança com o nome próprio de Deus, YHWV, que na tradição escriturística tornou-se impronunciável, sendo substituído por Adonai (o Senhor). Essa imagem transcendente de Deus será inspiradora para os místicos das três grandes tradições monoteístas: do Deus que se manifesta sempre com véus, condição essencial para captar-lhe a beleza. Com Moisés transforma-se também o culto a esse Deus sem imagem. A centralidade não está mais nas oferendas, sacrifícios ou cerimoniais que busquem satisfazer as necessidades de Iahweh, mas no seguimento de sua vontade na história. Segundo Moisés, a forma de dedicar-se a Ele está associada à obediência de sua vontade, ou seja, à conduta correta. Firma-se, assim, os dois traços da dinâmica religiosa instaurada com Moisés: a afirmação do Deus transcendente e a religião moral .

As três idéias-força que estão associadas a Moisés, ou seja, o desamparo, a libertação e o mistério, encontram-se presentes no quadro de Frida Kahlo sobre “Moisés ou o núcleo da criação”. A pintura é de uma complexidade extrema e não há como desvelar todos os seus significados. Para que se possa acessar o seu conteúdo, é necessário captar a especificidade da linguagem pictórica pessoal da autora e o seu vocabulário peculiar. Há toda uma simbologia latente e um rico imaginário que povoa a arte de Frida. Nele atuam traços de religiosidade, da arte popular mexicana, da cultura pré-colombiana. Como aponta Andréa Kettenmann, a artista “usou símbolos que, uma vez decodificados, nos permitem ter um conhecimento profundo sobre a sua obra e as circunstâncias que presidiram a sua criação. A mensagem não é hermética: os trabalhos devem ser vistos como resumo metafóricos de experiências concretas” . Mas há, em particular, no quadro sobre Moisés, a tradução de uma visão de mundo peculiar, marcada pelo traço libertador e revolucionário. Na obra desta “surrealista ´naive`” revela-se a figura de uma apaixonada pela revolução, de alguém que se engaja na luta pela transformação das Américas. Trata-se de uma artista que “servia à causa do nacionalismo pós-revolucionário usando em seus trabalhos alguns princípios do surrealismo para afirmar os traços inconfundíveis da cultura mexicana” .

Não é somente o leitor que observa o quadro, mas é também por ele observado. Há o imperativo de se deixar tocar pela maravilha, pelo estupor, pelas entranhas que habitam o seu interior. Nada mais fascinante do que o prazer estético diante de uma obra de arte. Como sublinha Pareyson,

“(...) de um lado é a percepção de uma novidade que de súbito se impõe de maneira tão peremptória que não é possível furtar-se ao seu fascínio, e suscita uma emoção que perturba e sacode de modo tão mais forte quanto mais inesperado for o apelo constituído pelo objeto. De outro lado, é um súbito cessar de toda atividade em um átimo de contemplação pausada, na qual a atenção, de súbito solicitada, se detém e se fixa repousando sobre o objeto que desse modo encontrou um expectador” .

Este fascínio pode ser encontrado no quadro sobre Moisés. Há uma profusão de imagens e símbolos, uma pletora de energia e encantamento. Na tela, a presença de revolucionários que Frida sempre admirou, de personagens religiosos de relevo, de buscadores do mistério e arautos do diálogo. Há também símbolos que marcam sua relação profunda com a mãe-terra e com seu México amado, bem como símbolos que traduzem a forte presença do imaginário cristão: Jesus com a coroa de espinhos, Jesus ressuscitado, Maria, a pomba que representa o Espírito Santo e a presença de Deus que tudo vê . O núcleo da criação encontra-se aquecido pelo sol, esta força maior que tem uma presença recorrente nas obras de Frida . E o sol aqui é imenso, com toda uma energia de vida concentrada, como se estivesse anunciando teimosamente que a vida e a esperança não podem morrer, apesar das tentações das sombras, da dor e do desamparo que rondam a humanidade. Mas o quadro também indica que o caos está à espreita, sempre ameaçando o parco equilíbrio do sentido. A ameaça sombria encontra-se distribuída na tela, marcada pela presença de figuras necrófilas como a de Hitler, mas também pelos dois esqueletos, pela imagem do demônio e de seu fogo e pelos troncos secos e retorcidos que “abraçam” a criação indefesa. Sob a presença do sol, está o feto que chora sobre o pequeno Moisés desamparado nas águas do rio . As lágrimas derramam-se por toda a parte, como se estivessem simbolizando a dor e a tristeza de Frida pelo forte desejo não realizado de gerar vida. Outro dado que chama a atenção no quadro sobre Moisés é a força do olhar que anima o pequeno Moisés. O olhar é vivo e sereno, voltado para o futuro. É um olhar que guarda o segredo de uma vocação libertária que está por vir. Em sua testa brilha o terceiro olho da sabedoria .

Esta ambivalência habita o quadro sobre Moisés, mas também está presente em tantas outras obras da pintora:

“este princípio dualista, que caracteriza muitos dos seus trabalhos, remonta à mitologia do antigo México, em que a artista se inspirou. Tornou-se a expressão da sua filosofia da natureza e de vida, a sua visão do mundo. Este dualismo é baseado no conceito asteca de guerra violenta e permanente entre o deus branco Huitzilopochtli, o deus Sol, a personificação do dia, do Verão, do Sul e do Fogo, e o seu adversário Tezcatlipoca, o deus negro do pôr do Sol e personificação da noite e do firmamento, do Inverno, do Norte e da água. A batalha entre estas duas forças assegura o equilíbrio do mundo” .

Também na obra sobre Moisés verifica-se o que é um traço da produção artística de Frida Kahlo, ou seja, o amálgama da potência vital e o desamparo, da vida e morte, da luz e sombra. A tristeza e frustração de Frida, expressas nas lágrimas de um feto que não pode desabrochar vêm contrastadas pela força vigorosa do sol gerador de vida, e que está no centro de tudo. A autora Rachel Sztajnberg levanta a hipótese de um processo sublimatório, onde “a falta é reconhecida, mas o que foi perdido gera uma outra coisa, o objeto se altera e serve de suporte para novos ideais. Assim, os fios se desdobram e uma trama pode ser tecida incluindo os buracos, os espaços vazios que fazem parte imprescindível do bordado como um todo” .

Mas o olhar profundo do pequeno Moisés indica que para Frida a vida é sempre mais forte do que a morte. O poder e a força de seu desejo é sempre recuperar-se para poder ocupar-se das flores por todo o dia; viver a intensidade da experiência amorosa, como a vivida ao lado de Rivera, a quem dedicou um amor incondicional ; ajudar a construir um mundo mais harmônico e justo e poder partilhar com alegria a infinita gratuidade da vida. Frida nunca se rendeu ao desespero, pois tinha sempre a vida diante de si. Se as pernas não mais obedeciam, tinha asas para voar e os olhos vivos que se engrandeciam para admirar o espetáculo da vida. E seu sonho era o de provocar a admiração de todos, tornando-se uma velhinha de longas tranças brancas sobre as costas, lançando para o diabo todos os colete e cadeiras de roda que tanto a atormentaram ao longo da vida, tendo como único apoio um pequeno bastão de bambu .

Já ao final da vida, em 1953, Frida surpreende a todos que estavam presentes em sua primeira exposição individual no México, quando chega de improviso na bela galeria da fotografia Lola Alvarez Bravo, carregada em seu próprio leito. Estava, como sempre, bem vestida e penteada. Não podia mais mover-se como antes, mas como um gesto de esforço derradeiro, como uma última despedida, agarrou a todos os que estavam ali presentes com seus olhos vivos: “os seus olhos não miravam, mas apoderavam-se de todos com todas as forças que ainda dispunha, com toda a intensidade, únicos elementos móveis daquele corpo estragado” . Mas estavam ali vivos e brilhavam para mostrar a força de uma presença.

(Publicado no livro: Edla Eggert. Por uma ética estética da diversidade machucada. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2008, pp. 49-60)

3 comentários:

  1. Muito bom! Ótimo texto, super esclarecedor. Kahlo foi realmente uma mulher extraordinária e misteriosa, um exemplo a ser seguido.

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  2. Ela não é exatamente um exemplo, mas ela é uma pessoa extraordinária e polêmica. Sua obra realistas, que contam sua história, a vida sofrida após o acidente e a má imagem pelo fato de seu marido a trair... mas ela também o traia, com homens, e mulheres. Tudo em sua vida é muito misterioso e dá sim pra fazer um filme, e esse filme é muito bom e eu peço pra vocês que assistam o Filme.
    Hizana-12 anos

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