quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

Um olhar sobre o novo livro do papa Francisco: vamos sonhar juntos

 Um olhar sobre o novo livro de papa Francisco: Vamos sonhar juntos

 

Faustino Teixeira

PPCIR/UFJF 

 

Um livro precioso esse do papa Francisco, que nasceu de uma longa entrevista com Austen Ivereigh. Foi um livro gestado na quarentena, quando o papa aceitou o desafio do entrevistador, logo após ter nomeado uma comissão no Vaticano “para consultar peritos de todo o mundo sobre o futuro da pós-pandemia”[1]. O período das conversas ocorreu entre junho e agosto de 2020.  O papa logo aceitou a proposta, para a surpresa do entrevistador, 

 

“mas deixou claro que necessitaria (...)  de mais do que apenas uma série de perguntas. Como ficou evidente em suas homilias cotidianas, transmitidas ao vivo a partir de sua resistência durante o confinamento, ele tinha muito a dizer, e não bastava o formato de perguntas e respostas” (VSJ 152 – pós-escrito  por Austen Ivereigh).

 

O livro segue o modelo tradicional do ver-julgar-agir, remodelado por Francisco com os termos contemplar-discernir-propor. Dá no mesmo:

 

“Primeiro, examinar a realidade, por mais incômoda que ela seja, sobretudo a verdade do sofrimento nas periferias da sociedade. Segundo, discernir as diferenças forças em jogo, distinguindo o que constrói do que destrói, o que humaniza do que desumaniza e, desse modo, escolhendo o que é de Deus e resistindo ao contrário. Por último, propor um olhar novo e passos concretos que surjam do diagnóstico sobre o mal que nos afeta e de como podemos atuar de outra maneira” (VSJ 152 – pós-escrito  por Austen Ivereigh).

 

O entrevistador assinala que ao final das gravações percebeu o clima de grande “energia, paixão e amor” em Francisco e “a intensidade com que vivia aquele momento: como sofria com os outros e seu senso de urgência” (VSJ 154)

 

prólogodo livro começa como uma curiosa citação do evangelho de Lucas, quando diz que Satanás “quer peneirar você como trigo” (Lc 22,31). Eu logo me lembrei de Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa, onde o demo tem um papel central para desviar o rumo dos que buscam o caminho. Como bem assinalou Walnice Nogueira Galvão, que é das grandes especialistas no livro, “o Diabo ganha pequenas paradas, rápidas e logo concluídas dentro do grande fluir de tudo o que existe e que é Deus; mas nessas pequenas paradas pode se danar um homem (...). Tentar parar esse fluir através de uma certeza é a tarefa do Diabo. ´Deus é paciência. O contrário é o diabo`(GSV, 18)”[2].

 

Francisco começa falando da crise em que vivemos, sinalizando que “entrar em crise implica ser peneirado. É um momento em que tanto os nossos parâmetros como as nossas formas de pensar são sacudidos e as nossas prioridades e os nossos estilos de vida são postos em questão” (VSJ 7). É também, diz Francisco, um momento de provação, e a saída da crise é sempre surpreendente: “sai-se melhor ou pior; mas nunca igual” (VSJ 7). É o que ocorre na história: “Quando o coração das pessoas é posto à prova, elas tomam consciência do que as estava prendendo” (VSJ 8). É o mundo que está em gestação, mesmo nas crises, onde toda a criação, como diz São Paulo, “geme e sofre as dores do parto” (Rm 8,22). Cita ainda Francisco uma passagem provocante do profeta Isaías, onde Deus interroga o profeta: “Venham e discutiremos. Se vocês estiverem dispostos a obedecer, comerão os frutos da terra, mas, se vocês recusam e se revoltam, serão devorados pela espada” (Is 1,18-20).

 

Parte I – Tempo de Ver

 

Francisco inicia sua reflexão nessa parte lembrando de nomes que transbordam em seu coração nesse tempo da pandemia. São pessoas que estão nas suas orações e pensamentos, “pessoas com muitos nomes e rostos, pessoas que morreram sem dizer adeus àqueles que amavam, famílias em dificuldades porque não há trabalho e que inclusive passam fome” (VSJ 17). Menciona os enfermeiros, médicos, profissionais de saúde, sacerdotes, religiosos e religiosas “e tantas outras pessoas com vocação para servir” VSJ 19).

 

Francisco lança o desafio de não se deixar tomar nem pelo narcisismo, desânimo ou pessimismo. O narcisismo reflete uma perigosa “cultura do espelho” e do ensimesmamento, onde as pessoas acabam se afogando no solipsismo. O desânimo, por sua vez, provoca uma cultura da queixa e obstaculiza o que vem oferecido pelos outros como saída. Os que assim se deixam levar, só enxergam o que julgam perdido. E o pessimismo é uma porta que se fecha para o futuro e as novidades que pode anunciar (VSJ 22).

 

Francisco realça que a crise pela qual estamos passando é sinalizadora para voltarmos “a entrar em contato com a realidade”. Sublinha que “precisamos passar do virtual para o real, do abstrato para o concreto, da cultura do adjetivo para a do substantivo” (VSJ 23). Assinala a importância de assumirmos com coragem a “cultura do cuidado que responda com rapidez a todas as denúncias”. É algo que virá com o tempo, mas que deverá nos tomar por inteiro, como um “compromisso irremediável no qual devemos empenhar-nos com todas as nossas forças” (VSJ 32).

 

Em passagem ainda na primeira parte do livro, percebo um certo “escorregão” no ritmo de abertura que marca Francisco em suas falas, e isto se deve ao grande impedimento que bloqueia uma reflexão mais arejada da igreja católica no campo da moral. Quando se toca em certos assuntos, não há como captar a energia vital que o tempo atual nos exige. Como diz com acerto o teólogo francês Christian Duquoc, o peso da instituição em certos campos é quase irremovível, dificultando a tremenda tarefa da igreja ser capaz de romper seu circuito reduzido. Indica que é mesmo muito duro a tarefa de “renunciar a si mesma”[3]. Para Duquoc é bem pesada a “pretensão eclesiástica de testemunhar a verdade”, e isto mesmo entre setores mais abertos, educados pelo Vaticano II. Uma tal pretensão vem reforçada pelo discurso doutrinal que serve, na prática, para amortecer a precariedade da instituição eclesial[4]. Em carta singular escrita por Teilhard de Chardin para a sua amiga Léontine Zanta, em maio de 1927, dizia que “as nossa igrejinhas nos escondem a Terra”[5]. Não é de se admirar, que em seu polêmico livro onde defende a restauração da igreja, o cardeal Ratzinger, na ocasião prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, falava em “drama da moral”, reconhecendo que ali estava o principal ponto de desencontro entre os teólogos e o magistério da igreja”[6]. Isso continua valendo até hoje. Enquanto o mundo celebra avanços importantes como estão acontecendo na Argentina, o papa Francisco mantém o freio nas suas reflexões nesse campo. Daí discordar do que ele afirmou no livro: “Se você pensa que o aborto, a eutanásia e a pena de morte são aceitáveis, seu coração terá dificuldade em se preocupar com a contaminação dos rios e a destruição das florestas” (VSJ 42). Totalmente de acordo com sua crítica à pena de morte, mas quanto aos outros dois pontos, a reflexão deve ser bem mais matizada, seguindo pistas fundamentais traçadas por teólogos morais desde tempos, e cito aqui o grande Jaime Snoek, que atuou na Universidade Federal de Juiz de Fora.

 

O papa Francisco assinala que passou por três “Covids” em sua vida: a doença, a Alemanha e Córdoba. No primeiro caso, fala de sua doença aos 21 anos, em 1957, quando viveu o limite da dor e da solidão. Foi um passo importante para a mudança na sua vida. Depois veio o exílio voluntário na Alemanha, em 1986, que nomeou como “covid da desconexão”. Disse a respeito: “Você é tirado de onde está e enviado para o desconhecido, e nesse processo aprende que o que realmente importa é o lugar que deixou para trás” (VSJ 49). A terceira “covid” aconteceu quando foi enviado para Córdoba, entre 1990 e 1992. Foi quando atuou como provincial dos jesuítas e depois reitor na comunidade jesuíta. Ali passou um ano e dez meses. Foi um tempo precioso no reforço da oração, mas também de muitas tentações. Foi também uma oportunidade preciosa de ler os 37 volumes da história dos papas, escrito por Ludwig Pastor (VSJ 50).

 

Francisco se irrita com o fechamento das pessoas no tempo atual: “Aquelas que se dedicaram mais a sua forma de agir seguem colocando em prática a fórmula de sempre – procuram conservar o modo de fazer as coisas” (VSJ 52). Mas se regozija com a presença ativa do povo, em suas profundas demandas de mudança: “É povo pedindo uma mudança profunda, uma mudança que surja das raízes, das necessidades concretas, que brote da dignidade e da liberdade dos povos” (VSJ 53).

 

 

Parte II – Tempo de escolher

 

Para Francisco, como bom jesuíta, esse tempo é o do discernimento e das escolhas. É “um tempo de provação” que faculta uma boa condução ao futuro. Indica que “para este segundo passo, não precisamos apenas nos conectar com a realidade, mas de um conjunto de critérios que nos guiem: saber que somos amados por Deus, chamados enquanto povo ao serviço e à solidariedade” (VSJ 59). Para o devido discernimento, é necessário abrir caminhos essenciais de reflexão e silêncio, e sobretudo de oração: “Ouvir o chamado do Espírito e cultivar o diálogo, numa comunidade que nos apoie e nos convide a sonhar” (VSJ 59). 

 

O momento, diz Francisco, é o de “recuperar valores, no sentido real da palavra: regressar àquilo que tem de fato valor. O valor da vida, da natureza, da dignidade da pessoa, do trabalho, dos vínculos – todos esses valores-chaves da vida humana, que não podem ser negociados nem sacrificados” (VSJ 60). E pistas bonitas são abertas por Jesus de Nazaré, em suas narrativas fundamentais, com a “gramática do Reino de Deus”. Menciona também o perene valor da Doutrina Social da igreja, sobretudo no âmbito da solidariedade e da subsidiariedade.

 

A situação do Coronavírus acabou por acelerar o desejo de “uma mudança de época”. Ou seja, “os parâmetros, suposições e modelos que antes serviam como base para nossas ações já não funcionam mais. Estamos passando agora por situações que jamais imaginamos que iria acontecer – o colapso ambiental, uma pandemia global, o retorno dos populismos” (VSJ 62-63). Estamos também diante do grande risco dos fundamentalismos, onde as pessoas se sentem mais “protegidas” de situações desestabilizadoras em troca de certo ´quietismo existencial”. Como diz com acerto o sociólogo Peter Berger, “o fundamentalismo é um esforço para restaurar a verdade ameaçada”[7]. A nebulosa fundamentalista ganha também espaço nas igrejas e religiões. Trata-se do fundamentalismo escriturístico e doutrinal. O teólogo Claude Geffré relaciona o fundamentalismo a uma forte “experiência de conversão”, relacionada à leitura da texto bíblico lido e pregado. Ele expressa o clima com uma citação bem apropriada, que explicita essa obstinada busca por um fundamento seguro: “Levaram meu Senhor e não sei onde o puseram” (Jo 20,2).  

 

Francisco expressa sua gratidão a Romano Guardini, que foi tema de sua tese doutoral não concluída. Com ele aprendeu 

 

“a não exigir certezas absolutas, pois isso é sinal de espírito ansioso. Sua sabedoria me permitiu enfrentar problemas complexos que não podem ser resolvidos simplesmente com normas, mas com um estilo de pensamento que permite passar pelos momentos de conflito sem ficar preso neles” (VSJ 64).

 

O papa pontua que “a tradição não é um museu, a verdadeira religião não é um congelador e a doutrina não é estática, mas cresce e se desenvolve, como uma árvore que permanece a mesma mas fica cada vez maior e produz sempre mais frutos” (VSJ 65).

 

Francisco lamenta nesse nosso tempo, o que vem sendo sentido de forma muito especial nessa nova pandemia, o abandono dos idosos. Trata-se para ele de “um triste sinal dos nossos tempos”. Sublinha que “boa parte das mortes por Covid-19 foi observada em casas de repouso. Os que morreram eram vulneráveis, não apenas pela idade, mas por conta das condições em muitos desses abrigos: falta de recursos, pouca atenção, muitas mudanças de pessoal, baixa remuneração dos funcionários” (VSJ 66). Para Francisco, “o abandono dos idosos é uma enorme injustiça”. Lembra uma passagem do livro do profeta Joel: “Os filhos e as filhas de vocês se tornarão profetas; entre vocês, os velhos terão sonhos e os jovens terão visões” (Jl 3,1).

 

Os profetas e discípulos de Jesus têm hoje como tarefa primordial captar o vento do Espírito, com extrema atenção aos rumos que suscita: “A voz de Deus nunca impõe, mas propõe, ao passo que o inimigo é barulhento e insistente e até mesmo monótono. A voz de Deus pode nos corrigir, mas suavemente, sempre encorajando, consolando, nos dando esperança” (VSJ 70).

 

Francisco reforça o papel fundamental exercido hoje pelas mulheres na igreja, que agora passam a ocupar cargos importantes no Vaticano. Foi uma decisão amadurecida e que vai dando seus primeiros frutos. E diz:

 

“Nomeei outras mulheres para cargos relevantes, mas como essas nomeações foram feitas de cada vez, ao longo de vários anos, não chamaram muito a atenção. Mas quando em 2020, nomeei de uma só vez seis mulheres para o Conselho da Economia do Vaticano, essas indicações viraram notícia” (VSJ 75).

 

Francisco aprecia nas mulheres o seu senso prático, e indica que durante sua longa experiência pastoral pôde aprender muito com suas recomendações, sempre sensatas e pé no chão.

 

Durante vários momentos do livro, Francisco coloca a igreja em alerta diante do risco da arrogância e da prepotência. Sublinha que o que o preocupa “é a condição espiritual expressa na arrogância de crer que a Igreja necessita ser salva de si mesma, e que trata a Igreja como se fosse uma corporação na qual os sócios podem exigir uma mudança de gerência” (VSJ 80). 

 

Em seus anos de estudo de Guardini, Francisco aprendeu como lidar com as contradições de forma positiva. Elas não podem ser confundidas com as contraposições. Pensar assim reflete um afastamento da realidade: “O mau espírito – o espírito do conflito, que afeta o diálogo e a fraternidade – transforma sempre as contraposições em contradições, exigindo que escolhamos um dos lados e reduzindo a realidade a simples binários” (VSJ 88). 

 

Linda a passagem do livro onde Francisco fala do caminho profundo do transbordamento. A expressão “transbordar” é uma possível tradução do grego perisseuo, que é 

 

“a palavra usada pelo salmista cuja taça transborda com a graça de Deus, no salmo 23. É o que Jesus promete (Lc 6,38) e que será derramado em nosso colo quando perdoarmos. É a palavra utilizada no Evangelho de João (Jo 10,10) para caracterizar a vida que Jesus veio trazer, e o adjetivo usado por São Paulo (2 Cor 1,5) para descrever a generosidade de Deus” (VSJ 90).

 

Para Francisco, “tais transbordamentos de amor acontecem sobretudo nas encruzilhadas da vida, em momentos de abertura, fragilidade e humildade, quando o oceano do amor de Deus rebenta os diques da nossa autossuficiência e permite assim, uma nova imaginação do possível” (VSJ 90). O pensador que foi para mim decisivo para entender com clareza o que é consciência possível, para além da consciência real, foi o marxista Lucien Goldmann, em seus preciosos livros traduzidos ao português. São livros que valem muito a pena ser lidos[8].

 

Parte III – Tempos de agir

 

Francisco inicia essa parte com uma bela citação do poeta Rabindranath Tagore: “Aproximaste de mim o distante e fizeste do desconhecido um irmão” (VSJ 107). No campo do agir, a opção de Francisco é bem clara, na linha dos bispos latino-americanos, com a escolha preferencial dos mais pobres e excluídos. Foi assim que deu início ao seu pontificado em Lampeduza, juntos aos excluídos. Os poderosos, diz Francisco, 

 

“se aproveitam e extraem deles tudo o que podem, sem darem nada em troca. A indiferença, o egoísmo, a cultura do bem-estar acomodado e as profundas divisões na sociedade, que degeneram em violência – todas essas coisas são sinais de que o povo perdeu a consciência da sua dignidade. Deixou de acreditar em si mesmo” (VSJ 108). 

 

No profético livro de Davi Kopenawa e Bruce Albert, A queda do céu, o grande líder Yanomami denuncia com vigor o que ele chama de “comedores de terra”, que avançam sem pudor sobre o território indígena a caça dos tesouros sob a terra. Como sublinha, “esses brancos parecem querer devorar a terra, como tatus-canastras e queixadas! Se deixarmos seu número aumentar, vão devastar a floresta toda, do mesmo jeito que estão fazendo aqui”[9].

 

Nas calamidades, como essa da Covid 19, a vulnerabilidade dos povos vem à tona, com todo o seu ímpeto, e expõem as seguranças falsas e supérfluas em torno das quais havíamos organizado nossos planos, nossas rotinas e prioridades” (VSJ 109).

 

Na proposta de Francisco, encontra-se em primeiro lugar o resgate da dignidade do povo. Trata-se de recuperar sua vida e sabedoria, sua “maneira de olhar o mundo”, que tem tanto a nos ensinar (VSJ 113). O mesmo reconheceu Bruno Latour em obra preciosa sobre os modos de existência. Dizia que hoje estamos assistindo de forma singular o “retorno progressivo às cosmologias antigas e suas inquietudes”. E tomamos consciência de que elas não são assim inconsistentes como pensam os ilustrados e  poderosos de nosso tempo[10].

 

O papa Francisco relata sua experiência com os cartoneros na Argentina, de onde colheu muitos frutos importantes para a sua reflexão pessoal. Ali pôde reconhecer o que significa a “cultura do descarte”. Sinaliza que eles, “ao se organizarem, criaram a dinâmica da própria conversão, uma reciclagem de suas próprias vidas. E no processo mudaram a maneira como os argentinos viam o lixo, ajudando-os a compreender o valor de reutilizar e reciclar” (VSJ 136). Aprendeu também muito com os encontros dos movimentos populares no Vaticano. Justas as suas reivindicações em favor da terra, do teto e do trabalho e sua luta contra todas as discriminações e violências (VSJ 138).

 

No epílogo, conclui com um lindo poema sobre a Esperança, de autoria de Aléxis Valdez, e cito aqui as quatro primeiras estrofes:

 

            “Quando a tempestade tiver passado

e as estradas estiverem amansadas

e nós formos sobreviventes

de um naufrágio coletivo.

 

Com o coração em lágrimas

E o destino abençoado

Nos sentiremos felizes

Simplesmente por estarmos vivos.

 

E daremos um abraço

Ao primeiro desconhecido

E louvaremos a sorte

De conservar um amigo.

 

E então recordaremos

Tudo aquilo que perdemos

E de uma vez aprenderemos

Tudo o que não aprendemos (...)” (VSJ 149).

 

.....

 

 

 

 

 

 

 

 

                  



[1]Papa Francisco. Vamos sonhar juntos. O caminho para um futuro melhor. Em conversa com com Austen Ivereigh. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2020, p. 151. O li livro será sempre citado no texto com a sigla VSJ, seguida da página.

[2]Walnice Nogueira GALVÃO. As formas do falso. 2 ed. São Paulo: Perspectiva,1986, p. 130.

[3]Chrsitian DUQUOC. “Credo la chiesa”. Precarietà istituzionale e regno di Dio. Brescia: Queriniana, 2001, p.  165.

[4]Ibidem, p. 134-135.

[5]Teilhard de CHARDIN. Cartas a Léontine Zanta. São Paulo: Herder, Lisboa, 1967, p. 99.

[6]Vittorio MESSORI & Joseph RATZINGER. Rapporto sulla fede. Cisinello Balsamo: Paoline, 1985, p 87.

[7]Peter L. BERGER. Os múltiplos altares da modernidade. Rumo a um paradigma da religião numa época pluralista. Petrópolis: Vozes, 2017, p. 34.

[8]Lucien GOLDMANN. Ciências humanas e filosofia. São Paulo: Difel, 1967, p. 47-50.

[9]Davi KOPENAWA & Bruce ALBERT. A queda do céu. Palavras de um xamã Yanomami. São Paulo: Companhia das Letras, 2015, p. 339.

[10]Bruno LATOUR. Enquête sur les modes d´existence. Une anthropologie des Modernes. Paris: La Découvert, 2012, p. 452.

terça-feira, 29 de dezembro de 2020

A arte de Heraldo do Monte

 A arte de Heraldo do Monte

 

Faustino Teixeira

 

"Estudei música por puro amor, 

acho que ela é uma espécie de deusa 

que escolhe pessoas e as escraviza com sua beleza"

 

Heraldo do Monte

 

Fiz a leitura atenta e cuidadosa do livro de Heraldo do Monte: Brasil de dentro - as cordas livres de Heraldo do monte. O texto do livro está primoroso, depois seguem as partituras. Baseio-me aqui na linda e singular introdução ao livro, escrita por Budi Garcia, intitulada: Dedilhando as cordas.

 

É impressionante ler sobre esse músico, dos mais finos instrumentistas que o Brasil já conheceu. Ele estudou 10 anos de clarinete. Sozinho estudou também violão, cavaquinho e bandolim. Vai se lançar depois como um dos maiores intérpretes na viola. O que mais se destaca nele é a capacidade incrível de improviso. 

 

Um músico "que pensa fora da caixa", se comparado a outros guitarristas. Como diz Airto Moreira, "ele tocava jazz muito bem, tinha aquele som aveludado e ele tocava música brasileira também... qualquer tipo de música (...). O Heraldo, além de tocar guitarra e violão, tocava também viola caipira, de dez cordas". Para Hermeto Paschoal, "Heraldo é um dos músicos mais completos do mundo".

 

Seu encontro com Geraldo Vandré foi decisivo. Foi contratado por ele para acompanhá-lo junto com outros dois grandes músicos: Airto Moreira (percussão) e Theo de Barros (violão). Era o "Trio Novo". Eles saíram juntos em viagens para um trabalho com a Rhodia. Foi mais ou menos nessa ocasião que saiu o clássico disco de Vandré, Cinco anos de canção (Som Maior). 

 

Com a integração de Hermeto Paschoal, formou-se o "Quarteto Novo", um dos mais espetaculares, criativos e geniais conjuntos músicas que o Brasil conheceu. O grupo vai trabalhar com Geraldo Vandré, que sempre percebeu o enorme talento do conjunto. O Quarteto foi muito ajudado e incentivado por Vandré.


A princípio, Heraldo não queria tocar viola, algo que nunca lhe passou pela cabeça. Era preconceito mesmo de um músico urbano como ele. Atuaram com Vandré no programa Disparada, na TV Record até julho de 1967, quando a programação se encerrou.

 

O Quarteto Novo, incentivado por Vandré, lançou um dos discos mais preciosos da música instrumental brasileira, lançado em novembro de 1967, depois III Festival da Música Popular, exibido pela TV Record, que teve como vitoriosa a canção Ponteio, com a presença do Quarteto acompanhando Maria Medalha.

 

A presença do Quarteto Novo nos Festivais de Música foi marcante, no acompanhamento de Vandré (Disparada e Ventania); Edu Lobo (Ponteio). E depois ainda, a canção O violeiro (de Homero Moutinho Filho), defendida por Jair Rodrigues no I Festival de Música Popular Brasileira. Na canção Ponteio, Heraldo tem uma participação singular, colaborando para a grande performance do refrão: "Quem me dera agora eu tivesse a viola pra cantar". E a viola de Heraldo cantou vibrante. De repente, ele passou a ser reconhecido como grande violeiro. E teve o papel fundamental de quebrar um bloqueio da presença da viola na música instrumental:

 

"A ´intelligentzia` (como diz Heraldo, com certa ironia) agora teria que aceitar que a viola é capaz de estar nos melhores palcos da nossa música instrumental, de tocar coisas antes impensadas ao instrumento".

 

Tinha a viola de Heraldo e também a maravilhoso queixada de burro do Airto Moreira, um verdadeiro achado; bem como a maravilhosa flauta de Hermeto Paschoal, que começou a usar esse instrumento na ocasião da formação do quarteto.

 

Como assinala Budi Garcia, na introdução do livro, 

 

"o projeto do Quarteto Novo concentrava-se mais na criação de uma linguagem de improvisação brasileira, em oposição às improvisações características dos conjuntos de Bossa Nova, nas quais se notava uma tendência ao emprego sistemático daquilo que Heraldo se refere como Bebop”.

 

O único disco do Quarteto Novo tem como marca singular a potencialidade da improvisação. É o marco do disco. Um caráter mesmo inovador, com a presença da "improvisação brasileira com elementos nordestinos". 

 

O autor da introdução lembra a presença do "Ahhh!" de Vandré, ao fundo, durante a faixa "O ovo". No disco comparecem músicas de Vandré: "Fica mal com Deus", "Canto Geral" e "Canta Maria". Também de Vandré no disco, a parceria com Airto Moreira em "Misturada". Uma das músicas presentes no disco, Vandré também já tinha gravado em seu primeiro disco, em 1963: Vim de santana (Theo de Barros).

 

Sem dúvida "o disco é uma obra prima". E realça Budi Garcia: 

 

"Todos ali estão radiando. Hermeto está inacreditavelmente fluente à flauta, instumento que ele vinha tocando há pouco tempo na ocasião daquele disco. Prova de sua enorme capacidade. Ele não só faz o uso convencional do instrumento - que já tem aquele timbre tradicional mágico, podendo ser delicado ou selvagem - como lança mão de recursos de expansão desse som clássico, com o uso de técnicas labiais alternativas e a própria voz emitida em conjunto com o som da flauta".

 

Os outros também brilharam, desde Theo de Barros, com seu violão harmonioso, também convincente ao contrabaixo a Airto Moreira, num equilibrado uso da bateria e da percussão, que depois ganhará um reconhecimento internacional e Heraldo do Monte, "reinventando a viola, dando forma a uma guitarra brasileira, iluminando o som do grupo com os raios ensolarados de seu nordeste".

 

E Heraldo sinaliza que algo que o fascina na música do Nordeste, e em especial em Pernambuco, é a influência moura: "essa influência está presente no canto, na emissão de voz, dos repentistas e nos apoios".

 

Na visão de Budi Garcia, "além do brilho individual dos músico, há toda uma trama de sons, ritmos e texturas que fazem do trabalho uma notável realização". O disco deu "uma chacoalhada no cenário da MPB e ecoou além mar". 

 

Era uma música 

 

"que ia ao encontro dos anseios mais profundos de transformação que o espírito da época pedia, em relação à cultura brasileira, mas numa direção bem diferente daquela tomada pela Tropicália empreendida por Caetano Veloso e Gilberto Gil". O Quarteto buscava o ritmo brasileiro mais profundo, despindo-se de toda roupagem jazz, "para atingir os rincões da expressão mais radicalmente nossa que podia haver naquele momento".

 

Como bem definiu Budi Garcia, o Quarteto Novo, com seu disco, "tornou-se uma espécie de ´chancela` da sonoridade de um Brasil ´de dentro`, que veio inspirar a quem dela quisesse fazer uso, na época e mesmo depois".

 

Ficou conhecida a viagem que o Quarteto Novo fez na França, em 1967, junto com Edu Lobo e Nara Leão. O nome do espetáculo já dizia tudo: Uma noite no Rio. A repercussão foi singular, tendo no público figuras públicas como Brigitte Bardot, Sacha Distel, e Bob Timons. 

 

O grupo depois se dissolve. Em 1968, no disco de Geraldo Vandré, Canto Geral, já não constava a presença do Quarteto Novo. Conforme indica Budi Garcia, Vandré "pode ter se chateado um bocado com os últimos acontecimentos: o grupo acompanhar Edu Lobo no Festival e este vencer, de fazerem com ele o show na França, êxitos esses que o próprio Vandré bem quisesse ter alcançado em companhia do Quarteto".

 

Airto Moreira seguirá carreira nos Estados Unidos, seguido depois por Hermeto Paschoal. Heraldo do Monte ficou no Brasil, tendo recusado diversos convites para trabalhar no exterior; também ficou Theo de Barros. Cada um, porém, seguiu o seu caminho particular.

 

Heraldo do Monte se firmou na carreira solo, com vários discos importantes, entre os quais: O violão de Heraldo do Monte (1970); Heraldo do Monte (1980); Cordas Vivas (1983); Cordas Mágicas (1986); Viola Nordestina (2000); Guitarra Brasileira (2004); Heraldo do Monte (2016 - pela Biscoito Fino). 

 

Vale citar aqui o belo disco infantil de Heraldo do Monte: MPBaby - Moda de viola, com lindas interpretações, voltadas para as crianças, de "Meu limão, meu limoeiro", "Viola enluarada" e "Trenzinho caipira". Na gravação, ele utiliza sua viola de 12 cordas, presenteada por Ivan Vilela.

 

Merecem destaque sua participação com o Zimbo Trio, em particular no disco Tudo Bem; sua presença nos festivais de jazz em São Paulo (quando então firma sua amizade com o guitarrista Joe Pass); suas gravações na Eldorado, sua colaboração no espetáculo Consertão, que depois se transformou em disco (com Elomar e Arthur Moreira Lima). E ainda a colaboração bonita com Dominguinhos, sobretudo depois de 1990, "nos quais gravaram discos juntos, foram premiados, viajaram muito o Brasil e aproximaram-se ainda mais como músicos amigos que foram".

 

Heraldo do Monte firma-se então como músico consagrado no Brasil. Diz que desde o Quarteto Novo "nunca mudou de direção", entranhando-se na nervura da Música Popular Brasileira. Ele é não só músico, mas tem um "lado caboclo", e igualmente um "lado inquieto, elétrico", fruto de sua paixão pela guitarra, seu principal instrumento. Foi "das cordas de sua guitarra que tirou o sustento da família, mas também o seu maior patrimônio. Em verdade todas as tantas cordas que toca, cordas vivas, mágicas, livres".

 

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sábado, 26 de dezembro de 2020

Aprendizados no campo da metodologia de orientação acadêmica

 Aprendizados no campo da metodologia de orientação acadêmica

 

Faustino Teixeira

PPCIR/UFJF

 

 

            Atuei por muitos anos na atividade acadêmica, desde os anos da PUC-RJ até meu ingresso na UFJF, em 1989. Tudo começou em 1978, quando ingressei no Mestrado em Teologia sob a preciosa orientação de João Batista Libanio, que foi quem sempre me incentivou nos caminhos da formação pessoal e acadêmica. Devo muito a ele em todo o meu aprendizado. Foi ele quem me estimulou a ir para a PUC-RJ e quem me incitou a fazer o doutorado em teologia na Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma, iniciado em 1982. 

 

            Com ele aprendi os passos essenciais da metodologia acadêmica e dos segredos da orientação acadêmica. Foi ele quem me ajudou sobremaneira a quebrar os difíceis bloqueios na arte da organização e da redação. Foi a partir de seu impulso que fiquei mais leve, destemido e livre para poder ingressar nesse desafiante trabalho da exposição pública das ideias. 

 

            Tenho também que reconhecer a presença de dois outros grandes mestres na minha formação acadêmica: o meu orientador de doutorado, Felix Pastor, que pude conhecer ainda antes de ingressar na Gregoriana. Foi minha turma de mestrado que suscitou sua vinda para o ensino na PUC-RJ. Com maestria, ele ensinava um semestre no Brasil e outro em Roma, sendo responsável pela orientação de inúmeros doutores que atuam hoje na teologia no Brasil, América Latina e outros lugares do mundo. Com ele pude também aperfeiçoar o método que havia aprendido com o Libanio, curiosamente nomeado como “método eletrônico”. Isso num tempo onde não havia ainda computador. Tanto minha dissertação de Mestrado na PUC-RJ como o doutorado foram redigidos em máquina de datilografia. Um trabalho extremamente difícil, sobretudo no doutorado, com uma tese de 1.100 páginas sobre a experiência das CEBs no Brasil.

 

O outro professor que foi muito importante na minha orientação, que me orientou no pós-doutorado foi Jacques Dupuis, docente na Gregoriana. Com ele pude desenvolver a arte da liberdade, da coragem e da ousadia. Escrever sem temor, evitando auto-censuras ou bloqueios de outras ordens, que deterioram a criatividade e a abertura ao mundo. Dizia sempre em sala de aula: “Não sei ensinar o que eu não penso”. Esse mote me acompanha até hoje, e suscitou um caminho bonito em minha reflexão, que me traz alegria, serenidade e destemor.

 

Recordo-me ainda da presença de outro professor em minha vida, tão importante para o apoio na esfera metodológica, Clodovis Boff. Nossa turma de Mestrado na PUC-RJ, no final da década de 1970, teve o privilégio de contar com um corpo docente de excelência, que ajudou a formar uma boa parte dos leigos que atuam hoje na teologia brasileira. Entre eles, Clodovis Boff, que tinha retornado de seu doutorado na Bélgica, sob a orientação competente de Adolphé Gesché. Sua obra Teologia e Prática(Vozes, 1978) foi objeto de um curso no Mestrado, e toda a sua tessitura envolvia a questão metodológica. Certa vez, fui conversar com ele sobre o meu projeto de dissertação de Mestrado. Quando mostrei o esquema para ele, num toque de olhar, examinou o texto e deu-me um conselho certeiro: o tema estava amplo demais. Aconselhou-me a restringir-me ao primeiro capítulo, que tratava da origem das CEBs no Brasil, deixando os outros dois para um trabalho futuro no doutorado. Segui fielmente o seu conselho e assim ocorreu. São luzes que acontecem na vida acadêmica e que dependem muito dos mestres e orientadores que encontramos pelo caminho.

 

Em outro momento, já no doutorado, lembro-me que fui conversar com o meu orientador, Felix Pastor. Estava naquele momento meio travado na redação. Em menos de meia hora, a experiência do mestre discerniu o problema. Entrei com uma questão difícil, e saí com dois capítulos definidos. Outra luz na caminhada. E assim ocorre com os que têm o privilégio de encontrar um ambiente propício de receptividade e acolhida.

 

A partir desses exemplos, pude tecer o meu caminho de orientador, tendo a alegria de constatar que nunca perdi sequer um aluno no trabalho de orientação: 21 doutorados concluídos (1 em andamento), 33 mestrados e algumas supervisões de pós-doutorado. Todos concluíram com sucesso os seus trabalhos, vencendo as crises, as dificuldades, a falta de horizontes. Tudo com base numa metodologia da paciência, buscando ouvir o outro, entendendo o seu momento, aguardando a reflexão chegar no seu devido lugar. Esse é um segredo bonito. Há uma passagem num livro de Rainer Maria Rilke que me ajudou muito a entender esse processo. Ele diz:

 

“O senhor é tão moço, tão no início de tudo, e gostaria de lhe pedir da melhor maneira possível, estimado senhor, que tenha paciência com tudo o que é insolúvel em seu coração e que tente se afeiçoar às próprias questões como quartos trancados e como livros escritos numa língua bem desconhecida. Não busque agora as respostas; não lhe podem ser dadas porque não poderiam viver. E se trata de viver tudo. Viva agora as questões. Viva-as talvez aos poucos, sem notar, até chegar à resposta um dia distante”[1].

 

                  A vida acadêmica é complexa, e nem todos estão preparados para avançar em seus meandros. Há casos de pessoas que precisam ser orientadas a perseguirem outros caminhos, evitando o excessivo desgaste de uma vida que vem alimentada por uma vocação. Esse discernimento é essencial, e o bom orientador percebe logo isso, e pode ajudar muito o aluno a encontrar o seu caminho. 

 

            Ter um mestre é essencial para esse crescimento pessoal. Há uma passagem clássica num livro que utilizo muito nos meus cursos sobre zen budismo, A arte cavalheiresca do arqueiro zen(Eugen Herrigel), onde o autor relata a relação entre o discípulo e o mestre. Sinaliza que o caminho de aprendizado é áspero: 

 

“Muitas vezes, a única coisa que mantém o discípulo animado é a fé no mestre, em que só agora reconhece o domínio absoluto da arte: com sua vida dá-lhe o exemplo do que seja obra interior, e convence-o apenas com sua presença. Nessa etapa, a imitação do discípulo atinge a maturidade, conduzindo-o a compartilhar com o mestre o domínio artístico. Até onde o discípulo chegará é coisa que não preocupa o mestre. Ele apenas lhe ensina o caminho, deixando-o percorrê-lo por si mesmo, sem a companhia de ninguém”[2].

 

Com a leitura de Herrigel pude perceber que o trabalho decisivo não pertence unicamente a nós, mas depende da criação de um clima propício onde algo pode acontecer e revelar horizontes novidadeiros. É o que ocorre, por exemplo, na arte do tiro com arco, que para seu sucesso é necessário penetrar na dimensão “espiritual”, interior. Há que ter despojamento e despreocupação. Diz Herrigel que a natureza misteriosa do tiro com arco está no “combate do arqueiro contra ele mesmo”[3]. E acrescenta que o mérito do tiro não pertence ao arqueiro, pois o sucesso desse “algo” que ocorre se processa com o eu “esquecido de si mesmo e de toda intenção”[4].

 

É uma sabedoria ancestral, como podemos igualmente perceber no pensamento de Chuang Tzu, recolhido na obra de Thomas Merton a respeito. Uma reflexão que remonta há 2.500 anos na Ásia:

 

“Quando um arqueiro atira sem alvo nem mira

está com toda a sua habilidade.

Se atira para ganhar uma fivela de metal

Já fica nervoso.

Se atira por um prêmio em ouro

fica cego ou vê dois alvos –

está louco.

 

Sua habilidade não mudou. Mas o prêmio

cria nele divisões. Preocupa-se.

Pensa mais em ganhar

do que em atirar –

e a necessidade de vencer

esgota-lhe a força[5].

 

                  Ainda com Rilke aprendi algo que se relaciona profundamente com tudo o que referi aqui. O trabalho acadêmico profundo requer condições fundamentais, a começar pelo cuidado com o mundo interior. Em sua sétima elegia de Duíno, sublinha que o mundo só existirá “interiormente”[6]. É também o conselho que ele dá ao candidato a jovem poeta: 

 

“Procure entrar em si mesmo, Investigue o motivo que o manda escrever; examine se estende suas raízes pelos recantos mais profundos de sua alma; confesse a si mesmo: morreria, se lhe fosse vedado escrever? Isto, acima de tudo, pergunte a si mesmo na hora mais tranquila da sua noite: ´Sou mesmo forçado a escrever?`. Escave dentro de si uma resposta profunda”[7].

 

                  É a partir de tais pressupostos que posso apontar aqui algumas pistas que fui percebendo ao longo de minha trajetória acadêmica para ajudar no trabalho delicado de orientação dos alunos. Servir-me-ei aqui, sobretudo das agudas reflexões tecidas por João Batista Libanio em dois livros que foram lume na minha trajetória pessoal e na minha atividade de orientador acadêmico. São os livros: A arte de formar-se (2001) e Introdução à vida intelectual(2001). Ao final, partilho algumas notas pessoais que fui passando para os meus orientandos ao longo de minha atuação aqui na UFJF, no programa de pós-graduação em ciência da religião.

 

As condições para o trabalho acadêmico: pistas abertas por João Batista Libanio

 

            Em precioso livro sobre A arte de formar-se(2001), João Batista Libanio levanta uma questão fundamental para aqueles que buscam ingressar com seriedade no mundo acadêmico, e sobretudo no mundo da produção escrita. Trata do que significa aprender a conhecer e a pensar. É o tema do capítulo primeiro de seu livro. Retoma a ideia de que estamos numa cultura da informação, que requer muito atenção, lucidez e capacidade de reflexão objetiva e de síntese. Estamos todos envolvidos num ciclo de informação que é impressionante. O desafio é aprender a relacionar e a contextualizar. As coisas estão aí e nos oferecem lições, que Libanio sintetiza com felicidade: as coisas e seu mundo exterior podem nos educar significativamente, desde que tenhamos um olhar lúcido sobre elas. Elas “educam-nos o sentido da observação”, e esse caminho de educação passa pela tranquila observação. No processo de aprendizado das coisas é que processamos a dinâmica de modificar nossa atitude diante delas. 

 

Na visão de Libanio, “pensar é analisar e sintetizar, separar e unir”. Acionar o pensamento criativo é estar sempre em suspensão com as certezas absolutas, ou seja, saber com clareza criar uma argúcia da desconfiança crítica permanente. Isso possibilita o acesso à complexidade do real, com suas nuances singulares. Para tanto, o caminho do desenvolvimento da capacidade de relação: “Relacionar é superar uma visão dualista que pensa o mundo  sempre divididamente entre sujeito e objeto, material e espiritual, natureza e cultura, ser humano e mundo, razão e emoção, feminino e masculino, mente e corpo, transcendência e imanência etc. Positivamente, significa articular o máximo possível entre esses polos”[8]. O pesquisador deve se dar conta de que se encontra num “mundo de incertezas”, e toda a calma, paciência e discernimento devem envolver o trabalho de reflexão. O clima que deve envolver o pensar é de radical repulsa a qualquer dogmatismo e inflexibilidade na reflexão. Há que estar sempre aberto e disponível para colocar-se em questão, a todo tempo. É o caminho de situar-se num horizonte complexo. Serve também de ajuda para o pesquisador o precioso livro de Otto Maduro, Mapas para a festa, onde aborda reflexões latino-americanas sobre a crise e o conhecimento[9].

 

            Em livro mais específico sobre a vida intelectual, Libanio conseguiu a proeza de favorecer um guia introdutório que considero excepcional para os que buscam o trabalho acadêmico e de redação[10]. O livro é a rota que me inspirou a escrever essa linhas do artigo, e nele me baseio. No capítulo primeiro, trata das atitudes fundamentais da vocação intelectual. Indica que diferentemente da profissão, que envolve preparação técnica, competência e eficiência, a vocação, por sua vez, “fala de decisão e realização pessoal, chamado interior, paixão, amor e gosto pelo que se faz”[11]. O que alimenta a vocação é a motivação, e esta é essencial para os que se dirigem ao trabalho acadêmico. Há que ter motivação para o sucesso de qualquer empreitada. Vemos, com certa tristeza, que muitos alunos buscam o seu caminho na pós-graduação sem se ater devidamente a tal dispositivo, mas acabam por inserir sua pesquisa tendo em conta não a sua motivação, mas as linhas de pesquisa que estão disponíveis nos programas a cujo ingresso almejam. 

 

Em razão disso, a escolha dos temas nem sempre se coaduna com a vocação específica do egresso, e isso produz fadiga e dispersão, quando não desânimo e desistência. É algo sério que vem ocorrendo no Brasil. E em casos de programas ligados a faculdades particulares, muitas vezes os orientadores são provocados a orientarem dissertações ou teses que extrapolam o seu campo específico de conhecimento, dificultando muito o trabalho preciso da orientação. Dentre os desafios de uma vocação intelectual está o reconhecer que o prazer pela pesquisa deve envolver o estudante integralmente, produzindo a necessária temperatura vital para o sucesso da pesquisa. É um caminho que implica “disciplina, responsabilidade, de horas de estudo, de tenacidade, de vigílias, de trabalho, de aplicação”[12]. Como bom jesuíta, Libanio, nos adverte que “uma vida intelectual bem regrada amadurece a personalidade”[13].

 

            Dentre as exigências de uma vocação intelectual está o firme desejo de tomar a sério a “decisão de querer pensar”, e isto começa pelo árduo trabalho de leitura, “despojando-se, enquanto possível, dos preconceitos ideológicos, religiosos e dogmáticos”[14]. E aqui cabe o exemplo singular do pensamento de Otávio Velho, que sugere uma antropologia apofática, que se despe de preconceitos intelectuais prévios, que acabam por condicionar negativamente a pesquisa. Em vez de o pesquisador atender ao campo, ele acaba por querer provar no campo a literatura prévia que marcou o seu conhecimento, tentando enquadrar a visão no conhecimento e perdendo a possibilidade de se admirar com a novidade captada no real. Otávio Velho defende uma perspectiva que se define pelo “esforço de empatia” e de aperfeiçoamento do “ouvido musical” para a religião. Adverte que o campo do estudo da religião vem demarcado por uma “absoluta impossibilidade” de manutenção de uma “postura de mera observação”. O que para determinado olhar pode indicar uma limitação “nativa”, revela, na realidade, a ampliação do quadro de compreensão do fenômeno analisado[15].

 

Não sem razão, Otávio Velho vem postulando ultimamente uma “antropologia apofática”, que silencia um pouco mais a teorização e o conhecimento prévio, em favor da captação do que há de imprevisível e surpreendente no mundo do outro. Faz uma crítica ao processo crescente de escolarização em programas de pós-graduação em antropologia, onde o foco deixou de ser o trabalho de campo. Com base nos trabalhos de Tim Imgold, chama a atenção ao sempre fundamental aprendizado de “ver as coisas”, de ouvi-las e senti-las de forma sempre novidadeira. Indica que “o reconhecimento do outro não pode ser apenas intelectualista e que se assim o for, corremos o risco de a nossa atividade ser atingida no que ela tem de mais precioso”[16].

 

            Retomando Libanio, temos que nos dar conta de que nos inserimos num campo de superespecialização, que acaba complicando o trabalho de síntese e recolhimento do aluno, diante de um excesso de informações disponibilizadas pela internet. Saber pensar é ter sempre o pé no chão, buscando “situar os problemas, as realidades em seus contextos”. Evitar toda e qualquer unidimensionalização no trabalho reflexivo. Há que se abrir ao máximo para o mundo interdisciplinar e multidisciplinar: “Trata-se de criar um habitus mentis de nunca abordar uma questão fora do conjunto em que se situa. Numa imagem simples: nunca se dependura um cabide sem antes estender o varal”[17].

 

            Para o sucesso do trabalho, um passo decisivo é a “cultura do estudo e da leitura” e um cuidadoso trabalho de uso do tempo. O trabalho intelectual tem que ser decidido, programado e cumprido. Diz Libanio que a primeira regra é não jogar fora o tempo: “Saber tomar o tempo necessário para as ações conforme sua natureza, sem sacrificá-lo em nome de uma lógica da eficácia”[18]. Essa questão do tempo é de prioridade. Indica Libanio que 

 

“tem-se sempre tempo para o que é prioritário. O dia em horas igualmente para todas as pessoas. Toca-lhes dividi-lo em atividades. Para as atividades escolhidas para caber dentro de 24 horas, ter-se-á sempre tempo. Para as descartadas, não se encontra tempo. Logo o problema não é falta de tempo, mas de localização das ações no interior do quadro temporal”[19].

 

            De forma sábia, Libanio assinala que “as atividades não requerem o mesmo tipo de energia, atenção, qualidade de empenho”. Quando nos debruçamos sobre estudos mais teóricos e especulativos, a demanda é maior. Ele assevera: 

 

“Quanto mais repousada e descansada alguém tiver a mente, de quanto mais silêncio e tranquilidade dispuser, quanto mais agradável e recolhido for o ambiente, tanto mais valioso será esse tempo de estudo. Sua rentabilidade costuma ser maior . Portanto, a qualidade do tempo se mede pelas circunstâncias favoráveis ou não à atividade intelectual”[20].

 

De sua longa experiência no campo da orientação, bem como de sua presença ativa nos trabalhos de assessoria pastoral e vivencia jesuíta, Libanio guarda consigo alguns valores que são fundamentais: a honestidade como passo essencial; uma abordagem de aproximação do objeto de pesquisa de forma aberta e sem preconceito; Uma preocupação de penetrar no pensamento do outro, buscando captar sua lógica interna e suas demandas; e o cuidado decisivo de honestidade da exposição de seu pensamento, evitando distorções, plágios ou equívocos. E nesse processo dinâmico, o esforço contínuo para “reformular de diversas maneiras a mesma questão”[21].

 

No âmbito da estruturação da questão a ser trabalhada, outros requisitos se colocam para o pretendente ao trabalho acadêmico. Trata-se de saber com clareza qual o objeto que pretende investigar ao longo do tempo estabelecido para o trabalho. É necessário encontrar, com precisão, um marco referencial. Ele é “o resultado da organização das experiências, teorias, reflexões, ideias, dos pontos de vista, práticas, valores que alguém vai acumulando durante sua história humana”[22]. É o momento crucial de se “captar o sentido do problema, a estrutura teórica da questão”. Tudo há de convergir num “esquema claro, didático, lógico do tema, no qual as partes estejam bem articuladas entre si”[23]. O recurso ao dicionário é sempre essencial, inclusive para ruminar as palavras-chave que vão orientar o roteiro. Nesse campo, aconselho sempre aos alunos o precioso Dicionário analógico da língua portuguesa[24]. É uma dica preciosa sobretudo para o momento da redação do trabalho.

 

Trabalhar com alegria e empenho exige do pesquisador esse incentivo no âmbito emocional. A assimilação profunda ocorre quando os novos elementos que vão emergindo integram-se no “marco referencial da pessoa”. Há que atender, de forma séria e dedicada às condições externas de descanso. Libanio, como jesuíta regrado, sinaliza isso como essencial. Só quando o corpo colabora o trabalho encontra o clima propício para sua realização. Diz Libanio que “é fundamental manter a saúde física e psíquica, não só evitando o esgotamento como também cuidando de manter o organismo e o psiquismo sadios”[25]. O tempo dedicado ao descanso é indispensável: “O descanso merece grande cuidado”. E a regra geral é: “O descanso se faz pelo oposto[26]. Cansaço físico pede repouso. Cansaço psíquico pede exercício físico”[27]. E ele exemplifica: 

 

“As pessoas cuja atividade principal é física descansam vendo TV, filmes, lendo coisas leves que distraiam. Quem, por outro lado, empenha suas energias fundamentais nas atividades intelectuais, desopila por meio do esporte, da ginástica, do contato com a natureza, de passeios e não ficando diante da TV, da internet, fechando-se em salas de cinema ou mesmo dedicando-se a leituras de distração, ainda que tais atividades sejam mais leves do que o estudo empenhativo”.

                  

                  Seguem outros conselhos importantes: 

 

“À noite, cultivar atitudes tranquilas e repousantes, como leituras de espiritualidade, dos místicos, de poetas, ou ouvir música, dar passeios gratificantes, curtir conversas agradáveis. Música barulhenta, filmes violentos e emocionais, leituras de textos difíceis, redação de trabalhos exigentes, estudos pesados são desaconselhados, em geral na parte da noite, pois afetam negativamente o descanso do sono”.

 

                  Os grandes místicos, como Thomas Merton, na sua experiência espiritual, louvam o cuidado com o tempo da gratuidade, essencial para propiciar o clima pessoal para o trabalho intelectual. São aparentemente contraditórios, mas se irmanam profundamente na preparação do mundo interior. Diz Merton que “não é só a ação ou a experiência que enriquecem o nosso ser. Tudo depende da qualidade dos nossos atos e experiências”[28].

 

Uma forma de driblar ou vencer nossa tendência dispersiva ou desordenada é saber encontrar as pausas fundamentais no ritmo de nosso trabalho. Sinaliza Merton que “há ocasiões, portanto, em que, para guardarmos a nossa existência, temos simplesmente de ficar sem fazer nada. E para um homem que se deixou arrastar completamente fora de si por sua atividade, nada é mais difícil do que ficar em sossego, sem fazer nada. O próprio ato de repousar é o ato mais difícil e mais corajoso que ele pode realizar: e, e muitas vezes, está acima de suas forças”[29]. Diz com acerto que a felicidade não é resultado da intensidade, mas do equilíbrio interior. E isso é fundamental para o trabalho acadêmico.

 

            Retomando o livro do Libanio, ele sinaliza ainda a atenção à dose certa de realismo para cada pessoa. Cada um tem seu estilo. No meu caso, o momento mais rico para a concentração e a escrita é o período da manhã, logo bem cedo. Outros têm experiências positivas diversas. O correto é encontrar o caminho adequado para cada um, mas buscando sempre equilibrar o trabalho com o descanso. Não sem razão, o papa Francisco, em suas últimas reflexões tem acentuado um risco sério de nosso tempo, que é o da “rapidación”, do ritmo super acelerado das coisas e das pessoas que estão no trabalho. A velocidade que hoje se impõe a todos, nessa louca lógica da produtividade excessiva, “contrasta com a lentidão natural da evolução biológica”[30].

 

Em sua obra conjunta com Déborah Danowski, o antropólogo Eduardo Viveiro de Castro faz menção ao que considera “um dos debates mais apaixonantes atualmente em curso” que gira em torno da “velocidade da história”. Como “gesto barreira”, indica uma perspectiva de desaceleração, visando uma “ecologia política do ralentamento”[31]. Os italianos falam com propriedade da necessidade de uma decrescita felice.

 

            As repercussões disso no mundo acadêmico são desastrosas. O que vemos por todo canto é alunos e docentes adoecendo diante das infindas cobranças de produtividade e de eficácia. As exigências dos centros de fomento, com pressões sobre os diversos programas, são inúmeras e cada vez mais rigorosas. Os tempos urgem, são curtos, e os pesquisadores têm que se integrar na marra, com o risco de perder bolsas, financiamentos e mesmo credenciamentos no ensino. Quem sai mais prejudicado, a meu ver, é a produção acadêmica, que se torna mais pobre, superficial e sofrida, delineando um perfil de pesquisador focado apenas no seu trabalho, e desinteressado na abertura relacional. Isso se vê com frequência nos congressos acadêmicos, onde os pesquisadores correm de GTs em GTs, munidos de suas pesquisas, sem ter o tempo devido para acalentar e arranjar dentro de si o espaço para a reflexão serena e desapegada.

 

            Em seu livro, Libanio chama a atenção para outro detalhe importante, nem sempre viável em nosso tempo de acomodações mais precárias. Trata-se da questão do ambiente para o estudo. O ambiente geral é essencial. Buscar uma atmosfera tranquila, que seja um incentivo de animação e empenho. A atmosfera deve entrar a favor. Ajuda muito manter aceso um circuito positivo de relações humanas, de amizade, o que enriquece o tônus sadio para o trabalho. É o que Peter Berger chama com acerto de “estruturas de plausibilidade” e um “aparelho conversacional” ativo[32]. Criar tais atitudes de apoio constitui caminho seguro para aumentar o rendimento dos estudos.

 

            Os orientadores da pesquisa devem atender a um dado muito importante no trabalho de contato com os alunos. Ajudá-los a compreender que a produção literária é um “fator fundamental de personalidade”. Isto pode ajudar ou inibir a atividade criativa. Indica Libanio que 

 

“uma vez que alguém se aventure no mundo das publicações, cai imediatamente sob possíveis críticas, quer quanto a suas ideias, quer quanto à sua maneira de escrever. Pessoas inseguras, perfeccionistas, obsessivas, rigoristas têm enorme dificuldade de escrever e publicar seus escritos. Nunca os julgam suficientemente bons para tal. Temem o mínimo sinal de rejeição, que pode ser sentido na crítica. Psicanalistas alertam-nos para o enorme temor que o ser humano tem de ser rejeitado. Prefere então nunca escrever nem publicar nada, como medo de ser criticado. Escrever, portanto, antes de tudo é um fator de personalidade”[33].

 

                  Outra dica preciosa vem de Michel Beaud, no seu livro: Arte da tese(1994)[34]. O autor assinala que toda produção intelectual tem que preservar o mínimo de encantamento e gratuidade. Deve nascer do coração, com motivação forte. Imaginar que o tema escolhido terá que motivá-lo por muitos anos, e que vai fixar-se na pele como uma tatuagem[35]. Fundamental, igualmente, é saber escolher o orientador da pesquisa. Deve ser alguém dotado de capacidade, sensibilidade e estratégia bem definidas para ajudar o aluno a vencer as diversas barreiras que enfrentará ao longo de sua via. O orientador é um elemento essencial para o sucesso de um trabalho: alguém que “enfaticamente influenciará, marcará, facilitará ou atrapalhará” o início da carreira de um profissional da área. 

 

O autor lembra ainda outro dado bem significativo, que também aprendi com meus orientadores: a escolha do assunto. Ele “não deve ser nem tão amplo que não se consiga abarca-lo com pertinência, nem tão restrito que não tenha substância, arriscando-se a uma prolixidade vazia”[36]. Pela minha experiência no campo, sempre orientei meus alunos a trabalharem um tema num autor. É bem mais simples e plausível para a execução de um tema. 

 

Igualmente Umberto Eco, no seu clássico trabalho, Como se faz uma tese[37],  assinala que uma boa tese se constrói na dinâmica de interação profunda com o orientador do trabalho. A escrita de uma tese é um “exercício de comunicação”, num processo de interação, abertura e aprendizado. O estudante que se propõe a apresentar um projeto de dissertação ou tese deve estar bem consciente do horizonte que tem pela frente. Como diz Umberto Eco, “quem quer fazer uma tese deve fazer uma tese que esteja à altura de fazer”. Há que saber colocar claramente o problema inicial, e se acercar das condições para a realização do pretendido. E também não esquecer da questão das línguas exigidas pelos programas para a realização da pesquisa. Daí a importância de estar atento para os requisitos linguísticos que o tema apresentado vai exigir do candidato. Muitas vezes escolhe-se o tema, que implica utilização de recursos linguísticos complexos, sem se dar conta dos riscos que estão implicados.

 

            Outro grande pesquisador nesse campo da metodologia, Ciro Flamarion Cardoso, indicou caminhos pertinentes para a execução de projetos acadêmicos num artigo precioso, publicado pela Universidade Federal Fluminense: Como elaborar um projeto de pesquisa[38]Dentre os critérios que presidem a escolha de um tema ele enumera o critério de relevância, o critério de viabilidade e o critério de originalidade. Enumera também os elementos que devem estar presentes num projeto sério: a identificação do problema, os objetivos propostos, as hipóteses de trabalho, o quadro teórico, as fontes e metodologia, o cronograma de execução e o referencial bibliográfico.

 

            Na obra já citada, Libanio enumera igualmente os passos que devem marcar a estruturação do trabalho acadêmico. Indica que o trabalho deve obedecer a regras estruturais, com lógica interna bem delimitada e definida. É o desafio de superar um conhecimento mais genérico para um conhecimento elaborado e sistemático. Apresento aqui em forma pontual alguns dos passos que ele indica para a elaboração de um tema ou projeto: estabelecer um quadro maior da problemática, estabelecer um nexo ou relação com uma questão imediatamente anterior e com a seguinte, definir os conceitos, definir o problema específico[39]. Em seguida ocorre o desenvolvimento do trabalho, dando-se conta das consequências envolvidas no processo. O trabalho se enriquece também quando apontam-se alguns problemas conexos e já se consegue prever as objeções que poderão surgir pelo caminho. E nunca esquecer de distribuir bem o tempo para o trabalho concreto[40].

 

Num dos capítulos finais de seu livro, Libanio aborda propriamente a questão da confecção do trabalho, com pistas importantes, envolvendo os aspectos epistemológicos e didáticos. Chama a atenção para o rigor do trabalho científico, a qualidade do trabalho, a correção da linguagem. Indica que o estudante deve demonstrar “que percebeu bem e conhece o assunto e sabe formulá-lo de modo pessoal e próprio. A originalidade não consiste tanto na ideia nunca antes dita, mas muito na maneira peculiar de organizar o tema”[41]. Insiste para que o texto apresentado seja “conciso, enxuto, sem divagações ou repetições”. E não ter temor ou receio de cortar todo e qualquer excesso. O que vale é a “lei da economia das palavras”. 

 

Como conselho, indica a importância de começar sempre pelo texto, deixando a introdução e a conclusão para o final, mas sempre tendo por perto o esquema geral definido com anterioridade. E que cada parte do trabalho guarde entre si uma progressividade. Há que manter um fio condutor seguro. Deve-se buscar também uma linguagem e estilo agradáveis[42]. Assegurar a consciência de que o trabalho não é fixo, mas aberto a contínuas mudanças e transformações, que devem estar previstas. São preciosos os conselhos dados por Libanio para a redação da introdução e conclusão do trabalho, e vale a pena se concentrar sobre eles no momento final do trabalho[43].

 

O método eletrônico

 

            Com base no meu trabalho de orientação, ao longo de mais de três décadas, da PUC-RJ à UFJF, elaborei um esquema sucinto para ajudar meus orientandos no trabalho de elaboração do projeto de pesquisa. O objetivo proposto, sempre em conversa com as turmas de orientação, foi de encontrar um esquema de trabalho. Sempre considerei o sumário das dissertações e teses como o esqueleto central do trabalho a ser desenvolvido. Para facilitar o debate, tive como hábito regular de encontrar-me mensalmente com todos os meus orientandos do período para discutirmos os passos das pesquisas de cada um. Esse foi um segredo capital para o sucesso no trabalho de orientação. Fui compensado pela pronta seriedade de todos, que nunca deixaram de participar das reuniões para discutir as questões da redação de cada um.

 

            Ao longo de minha experiência, busquei elaborar um esquema de ajuda para a turma, com as dicas que fui captando no processo de comunicação e orientação. Decidi deixar o esquema como foi sempre apresentado a eles, sem maiores desenvolvimentos. Defini os seguintes passos:

 

1. Montar o quadro referencial bibliográfico: dois tipos de procedimentos

 

a)   Elaborar uma bibliografia por ordem de chegada

b)  Elaborar o fichário definitivo da bibliografia em ordem alfabética

 

Indico aos alunos trabalharem com folhas de cor distinta para a elaboração dessas duas bibliografias. Quando falo em ordem de chegada, quero dizer o seguinte. Na medida em que o aluno vai encontrando um artigo, texto, livro ou capítulo de livro que vai utilizar no trabalho, ele vai acrescentando na página, sem preocupação de ordem alfabética, mas numerando a ordem de chegada do texto. Simultaneamente, em outra página, vai elaborando a bibliografia em ordem alfabética, que facilitará muito a montagem do referencial bibliográfico utilizado no trabalho.

 

2. Após certo domínio de leitura sobre o tema escolhido o pesquisador já pode elaborar um esquema provisório da dissertação ou tese. É um passo dos mais complexos, exigindo dos alunos muita concentração e determinação. Por minha experiência no campo, pude verificar que para ganhar sua forma “definitiva”, o aluno passa por várias experimentações. Tive caso de alunos que chegaram a propor mais de 30 roteiros diferentes, até poder encontrar o definitivo. E aconselho cada aluno a guardar a memória desse trabalho, para se dar conta da evolução adquirida.

 

O sumário:

 

Introdução     (1)

 

1......

1.1.                  (3)

1.2.                  (5)

1.3.                  (7)

 

2....

2.1.                  (9)

2.2.                  (11)

2.3.                  (13)

 

3....

3.1.                  (15)

3.2                   (17)

3.3                   (19)

 

Conclusão       (21)

 

O esquema apresentado segue, em geral, o sumário de uma dissertação de  Mestrado, com três capítulos. Para cada item do sumário indica-se um número, o que está entre aspas ao lado do tópico preciso. Enumera-se então os diversos tópicos de forma a possibilitar a inserção de um novo número, caso seja necessário, em razão do desenvolvimento do trabalho. O ideal é que a numeração seja feita de dois em dois números, como no quadro acima. E que esse esquema possa ser o definitivo, para não se perder o aproveitamento da leitura feita até então.

 

3. Uma vez procedido o esquema, montar pastas para cada item, com a indicação precisa na capa da pasta sobre o tema a ser trabalhado, e o período previsto para a sua redação. Cada item do sumário se transforma numa pasta, que pode ser um envelope pardo ou de outra cor, onde as referências bibliográficas referentes àquele determinado ponto estarão inseridas. Em cada pasta serão anexadas as folhas com a indicação precisa da fonte relacionada ao tema em questão, utilizando-se o nome dos autores trabalhados, o código da bibliografia de chegada, com a referência das páginas onde a questão vem situada. No caso exemplificado, teremos 11 pastas, já incluindo aquelas referentes a introdução e a conclusão.

 

Com o tempo o pesquisador vai saber de memória a que tema relaciona tal número do código do esquema utilizado. Esse número poderá ser afixado a lápis nos próprios textos ou livros trabalhados, de forma a facilitar a pesquisa. Por exemplo, se ao ler determinado livro o pesquisador reconhece que o tema tem a ver com determinado item do sumário, ele numera a lápis no próprio livro o número que está na numeração (veja o número em parênteses), para depois ser recolhido, mediante fotocópia ou anotação, com o acréscimo na pasta correspondente. Para facilitar o trabalho das pastas, é conveniente ampliar o esquema de cada pasta com a indicação precisa do conteúdo contido na página indicada. Isso pode acontecer mediante uma síntese do próprio pesquisador ou mesmo utilizando-se o recurso do xérox da página mencionada. E manter viva a atenção para o modo como a citação vem inserida. Se for literal, manter sempre as aspas. Se for um breve resumo feito pelo pesquisador, será necessário voltar à fonte indicada para fazer a citação correta.

 

            Com o tempo as pastas vão ganhando aos poucos um conteúdo teórico significativo. Quando elas estão cheias, significa que o tema tem plausibilidade. Quando não há conteúdo nas pastas, ou esse é muito precário, significa que o tema não tem pertinência. Pode também ocorrer que uma determinada página tenha muito material, isso pode ser um indicativo da necessidade de subdividir o tema, criando-se uma nova pasta, que indica um novo item, a ser acrescentado no sumário. O fato de numerar deixando a possibilidade de uma nova inserção de número ajuda muito.

 

A partir daí se dá o início ao processo redacional: cada pasta vai, na verdade, significar um artigo a ser redigido. Quando se dá início à redação, o conteúdo das outras pastas cai no esquecimento. O pesquisador vai concentrar toda sua atenção e energia na elaboração da redação da pasta em questão. Aconselho aos pesquisadores de fazer várias leituras do conteúdo da pasta e depois numerar todos os itens, em ordem crescente, num fichamento extenso, que demanda tempo,  mas que será recompensado  pela facilidade posterior de redação. 

 

Em seguida, vem o difícil exercício de encontrar eixos fundamentais no conteúdo descrito, e em torno deles reunir as citações que vão nessa mesma linha. Ou seja, trata-se agora de organizar os eixos que vão formar os vários parágrafos ou partes do artigo. Uma vez definidos os eixos, agora é concentrar-se para encontrar a melhor distribuição dos temas em ordem progressiva de compreensão, para que a redação tenha uma progressividade.

 

5. Para facilitar ainda mais a compreensão, sintetizo um exercício de elaboração de um artigo (que no caso pode ser uma parte do esquema já elaborado pelo pesquisador)

 

  1. Captar o material bibliográfico relacionado ao tema a ser desenvolvido (livros e artigos). 
  2. Faça um preciso fichamento de todo o material bibliográfico relacionado ao tema, tanto nos livros como nos artigos.
  3. Busque criar frases que resumam os conteúdos, sempre iniciadas com um ponto, que será depois numerado. Evitar frases muito longas. O ideal é não ultrapassarem duas linhas. Ao final de cada frase é necessário indicar de forma precisa o livro ou artigo citado e a página de referência.
  4. Uma vez realizado o fichamento, que leva tempo e exige paciência, fazer várias leituras das folhas até encontrar temas chaves que sirvam para a elaboração do esquema de trabalho.
  5. Depois de nuclear os vários temas, definir de forma clara a sua ordem, de forma que favoreça um bom encaminhamento da redação.

 

Para facilitar o entendimento dos leitores partilho aqui um exercício preciso de gestação de um artigo que escrevi sobre Ernesto Cardenal. Isso para favorecer a visualização do processo que rege a redação de um determinado texto.

 

Visualização:

 

Artigo: O Cântico Espiritual de Ernesto Cardenal[44]

 

Referências:

 

  1. Luce López-Baralt. El cántico místico de Ernesto Cardenal. Madrid: Trotta, 2012.
  2. Sylma García González. “Yo tuve una cosa con él y no es un concepto”. Madrid/Frankfurt am Main: Iberoamericana/Vervuert, 2011.
  3. Ariana Fabbri. “Y son cosas que los que se aman se dicen en la cama”. La poesia mística de Ernesto Cardenal. Tesi dottorale. Università di Bologna, 2007.
  4. Maria Enrica Castiglioni. Para qé metáforas? La poetica de Ernesto Cardenal
  5. Teófilo Cabestrero. Ministros de Deus, ministros do povo. Petrópolis: Vozes, 1983.
  6. Ernesto Cardenal. La santidade de la revolucion. Salamanca: Sigueme, 1976.
  7. Ernesto Cardenal. O evangelho de Solentiname. Madrid: Trotta, 2006.
  8. Ernesto Cardenal. Vida Perdida. Memorias 1. Madrid: Trotta, 2005.
  9. Ernesto Cardenal. Las ínsulas extrañas. Memorias 2. Madrid: Trotta, 2002
  10.  Ernesto Cardenal. La revolución perdida. Memorias 3. Madrid: Trotta, 2004
  11.  Thomas Merton & Ernesto Cardenal. Correspondência (1959-1968). Madrid: Trotta, 2003.

 

Fichamento dos textos, segundo os temas relacionados:

 

  1. Luce López-Baralt. El cántico místico de Ernesto Cardenal. Madrid: Trotta, 2012.

. ......................... (1: 32)

. ......................... (1:45)

. ......................... (1:64)

. ......................... (1:72)

. ......................... (1:110)

 

  1. Sylma García González. “Yo tuve una cosa con él y no es un concepto”. Madrid/Frankfurt am Main: Iberoamericana/Vervuert, 2011.

 

. ........................ (2: 77)

. ........................ (2:81)

. ........................ (2: 97)

. ........................ (2: 110)

. ........................ (2: 88)

 

            Depois de feito o fichamento geral, a atenção se volta para a nucleação dos eixos que vão possibilitar a reunião dos itens que se relacionam com o tema em questão. Essa nucleação vai favorecer o processo de construção do artigo. Os eixos deverão estar inseridos num esquema que garante sua progressividade e lógica interna. Exemplifico abaixo:

 

  1. Sua importância como místico

 

. Cardenal, um místico em sentido estrito da palavra (1:25)

. A crítica, em geral, deixa de lado essa dimensão estritamente mística de Cardenal (1:12)

. E essa dimensão mística vem suscitando hoje um crescente interesse na crítica (1:12-13)

. O crescente interesse da crítica nesta perspectiva mística de Cardenal (2:9)

 

  1. A especificidade da experiência mística

 

. A inefabilidade essencial da experiência mística (1:26)

. As experiências místicas como “caprichos de Deus”, acessíveis tb àqueles que não são santos (1:15)

. As características fundamentais da experiência mística: sua essência inefável, sua qualidade no ética e seu traço efêmero (1:32)

. O místico e a limitada força da linguagem humana (2:16)

 

  1. Traços de sua biografia

 

. Uma biografia de Cardenal (4:122s)

. Formação acadêmica (2:36)

. Cardenal na Universidade (2:35)

. Na Universidade de Columbia (8:45)

. A continuidade dos estudos sacerdotais no México e Colômbia (2:42)

 

            Abaixo temos outros eixos que foram escolhidos, e que seguiram a mesma dinâmica dos anteriores que exemplifiquei.

 

  1. Obras publicadas
  2. A experiência da conversão
  3. Sua vida na Trapa
  4. O influxo de Merton e a convivência com Merton
  5. A fundação de Solentiname
  6. Sua incursão na luta política
  7. Sua retomada da reflexão sobre a mística
  8. Uma experiência erotizada de Deus
  9. Extras

 

Ainda que de forma bem sintética, busquei apresentar pela primeira vez, depois de tantos anos, o método de trabalho que marcou meus anos de atividade acadêmica. Nunca tinha feito isso de forma mais sistemática, embora os orientandos que passaram por meu caminho, conseguiram captar muito bem esse método, cada qual fazendo suas inserções criativas e modificações peculiares. E tudo deu muito certo. Reconheço com grande alegria que os frutos dessa opção metodológica foram alvissareiros, e posso verificar no caminho seguido por meus orientandos as marcas positivas desse longo empenho. Daí ter resolvido deixar por escrito algo a respeito, para servir de ajuda ou apoio a outros que pretendem seguir esse belo caminho de vida.

 

 

 

 

 

 



[1]Rainer Maria RILKE. A melodia das coisas. Contos, ensaios, cartas. 2 ed.  São Paulo: Estação Liberdade, 2011.

[2]Eugen HERRIGEL. A arte cavalheiresca do arqueiro zen. São Paulo: Pensamento, 1978.

[3]Ibidem, p. 17.

[4]Ibidem, p. 64.

[5]Thomas MERTON. A via de Chuang Tzu. 3 ed. Petrópolis: Vozes, 1977.

[6]Rainer Maria RILKE. Elegias de Duíno. 6 ed. São Paulo: Biblioteca Azul, 2013, p. 63.

[7]Rainer Maria RILKE. Cartas a um jovem poeta. A canção de amor e de morte do porta-estandarte Cristovão Rilke. 4 ed. São Paulo: Biblioteca Azul, 2013.

[8]João Batista LIBANIO. A arte de formar-se.São Paulo Loyola, 2001, p. 31 (nesta parte estamos concentrados no capítulo primeiro de seu livro).

[9]Otto MADURO. Mapas para a festa. Reflexões latino-americanas sobre a crise e o conhecimento. Petrópolis: Vozes, 1994.

[10]João Batista LIBANIO. Introdução à vida intelectual. São Paulo: Loyola, 2001.  

[11]Ibidem, p. 27.

[12]Ibidem, p. 32.

[13]Ibidem, p. 29.

[14]Ibidem, p. 44.

[15]Otávio Velho. O que a religião pode fazer pelas ciências sociais. In: Faustino Teixeira (Org.). A (s) ciência (s) da religião no Brasil. São Paulo: Paulinas, 2001, pp. 233-250; Rita Segato. Um paradoxo do relativismo: o discurso racional da antropologia. Religião e Sociedade, v. 16, ns 1-2, 1992, pp. 114-135.

[16]Otavio Velho. Trajetórias e diversidade: um caso brasileiro. Mimeo, p. 8. 

[17]João Batista LIBANIO. Introdução à vida intelectual, p. 48.

[18]Ibidem, p. 58.

[19]Ibidem, p. 59.

[20]Ibidem, p. 60.

[21]Ibidem, p. 124.

[22]Ibidem, p. 125.

[23]Ibidem, p. 124.

[24]Francisco Ferreira dos Santos AZEVEDO. Dicionário analógico da língua portuguesa. 2 ed. Rio de Janeiro: Lexikon, 2010.

[25]João Batista LIBANIO. Introdução à vida intelectual, p. 130.

[26]Libanio utilizava sempre a expressão: “per oppositum” para arrolar essa importante questão.

[27]João Batista LIBANIO. Introdução à vida intelectual, p. 130.

[28]Thomas MERTON. Algum homem é uma ilha. Campinas: Verus, 2003, p. 113.

[29]Ibidem, p. 114. 

[30]Papa FRANCISCO. Carta encíclica Laudato si, sobre o cuidado da casa comum. São Paulo: Paulinas, 2015, nº 18.

[31]Débora DANOWSKI & Eduardo VIVEIROS DE CASTRO. Há mundo por vir?  Ensaio sobre os medos e os fins. Florianópolis/São Paulo: Cultura e Barbárie/ISA, 2014, p. 148.

[32]Peter L. BERGER. Rumor de anjos. A sociedade moderna e a redescoberta do sobrenatural. 2 ed. Petrópolis: Vozes, 1997, p. 65-69.

[33]João Batista LIBANIO. Introdução à vida intelectual, p. 164.

[34]Michael BEAUD. Arte da tese. Bertand do Brasil, 1994.

[35]Ibidem, p. 25.

[36]Ibidem, p. 167.

[37]Umberto ECO. Como se faz uma tese.  23 ed. São Paulo: Perspectiva, 2010.

[39]João Batista LIBANIO. Introdução à vida intelectual, p. 203-206.

[40]Ibidem, p. 201-202.

[41]Ibidem, p. 223.

[42]Ibidem, p. 221-226.

[43]Ibidem, p. 230-231.

[44]Esse era o nome inicial. Depois modificou-se. Aliás, o nome do artigo vem sempre por último. Faça sempre um nome provisório, que depois sofre aperfeiçoamento.