terça-feira, 13 de abril de 2010

Paul Tillich e as religiões

A substância católica e as religiões

 

Faustino Teixeira

PPCIR/UFJF e

Pesquisador CNPQ

 

Introdução

 

O que mais fascina no pensamento de Paul Tillich (1886-1965) é a sua dinamicidade e capacidade de abertura permanente. É inegável a sua contribuição para a teologia das religiões no tempo atual, e de modo particular a afirmação das bases para um “ecumenismo inter-religioso”.[1] Os últimos anos de sua atividade teológica estavam delineando uma mudança de perspectiva ainda maior no seu pensamento com respeito às religiões. E isto se deve à recíproca colaboração com Mircea Eliade na Universidade de Chicago e, em particular, sua viagem ao Japão em 1960. Eliade relata em artigo a forte influência que esta visita ao Japão significou em sua vida, sobretudo a possibilidade de um contato direto com um “ambiente religioso vivo” e diversificado.[2] Foi sob o impacto desta inovadora experiência que nascem as quatro Bampton Lectures, realizadas em 1961 na Columbia University, publicadas em livro dois anos mais tarde sob o título “O cristianismo e o encontro das religiões no mundo”[3]. Em sua última conferência, realizada em outubro de 1965, na Universidade de Chicago, Tillich indicava a necessidade de uma renovação de sua teologia sistemática, no sentido de uma nova “interpretação do estudo teológico sistemático e dos estudos histórico-religiosos”[4]. Tratava-se de acionar a reinterpretação da tradição teológica à luz das novas reflexões indicadas pela história das religiões. É verdade que em sua viagem ao Japão, Tillich deparou-se com o mundo das outras religiões, e em particular com o budismo zen, o que provocou o questionamento de certo “provincianismo ocidental” e um interesse particular para o tema do diálogo inter-religioso. Não há como negar a singularidade desta viagem ao Extremo-Oriente, que marca uma mudança em sua compreensão da situação religiosa plural, mas ela traduz, em realidade, o amadurecimento de reflexões que já estavam presentes  anteriormente[5].

 

Na introdução do terceiro volume de sua teologia sistemática, Tillich indica que “uma teologia cristã que não é capaz de dialogar criativamente com o pensamento teológico de outras religiões perde uma oportunidade histórica e permanece provinciana”[6]. A viagem ao Japão faculta uma ampliação de sua perspectiva teológica sobre este tema, de modo a firmar sua convicção na  universalidade da revelação, na vitalidade e potencial das outras religiões e no alargamento da compreensão das expressões religiosas humanas, para além da perspectiva teísta.

 

Não é fácil enquadrar a reflexão de Tillich sobre as religiões entre os tradicionais paradigmas existentes. Trata-se de um pensamento marcado por grande complexidade e nuances diversificadas. O teólogo busca distanciar-se de duas perspectivas correntes: seja do exclusivismo da revelação, defendido por Karl Barth, seja de uma teologia da secularização. Como bem sublinhou Jean-Marc Aveline, é inadequado identificar a posição de Tillich como sendo exclusivista, inclusivista ou pluralista, dada a especificidade de sua abordagem. A importância dada pelo autor à dimensão de profundidade das religiões e de unidade dialética que as preside, rompe com qualquer perspectiva exclusivista. A distinção realizada entre o cristianismo como fenômeno histórico e não absoluto e o telos transcendente da história, supera a perspectiva inclusivista. Assim como a singularidade concedida a Jesus Cristo como o “centro da história”, instaura uma tensão com a perspectiva pluralista[7].  Para Aveline, “o conceito de teonomia se opõe ao exclusivismo, o de kairos ao relativismo e o de demoníaco corrige o inclusivismo”[8]. 

 

Uma importante pista que este artigo busca seguir, vai na linha de resgatar e ampliar o entendimento de um conceito chave presente na obra de Paul Tillich, a “substância católica”, que traduz a marca da Presença Espiritual em toda a dinâmica da criação; mostrar sua relação de reciprocidade com o “princípio protestante”, que impede qualquer identificação de uma realidade histórica com o mistério maior, de forma a favorecer a captação da dinâmica do pluralismo religioso e do essencial dialogo entre as diversas tradições religiosas.

 

  1. A universalidade da revelação

 

Em linha de descontinuidade com a perspectiva ortodoxa de Karl Barth a respeito da relação do cristianismo com as outras religiões, Paul Tillich enfatiza a idéia de que “as experiências reveladoras são universalmente humanas”[9]. Não há como conceber para Tillich a idéia de uma humanidade “abandonada por Deus”, de uma história carente da presença do Espírito. A seu ver, a história da humanidade, em todos os seus períodos e lugares, esteve abraçada pela “Presença Espiritual”. Sempre disponível ao espírito humano, o Deus misericordioso “irrompe, com poder salvífico e transformador, em toda a história em experiências revelatórias”[10]. A história da revelação não é algo que ocorre paralelamente ou à parte da história concreta, mas está a ela intimamente ligada. Ela é o lugar onde se cumpre a história da revelação[11]. As religiões são igualmente marcadas por “poderes reveladores e salvíficos”[12]. E a revelação para Tillich tem um significado bem preciso, identificando-se com aquilo que diz respeito ao ser humano “de forma última”[13], incondicionalmente. É uma realidade que toca a dimensão mais profunda de cada ser: sua dimensão ontológica.

 

Com base na percepção da presença universal do Logos e do Espírito de Deus, Tillich abre espaço para o questionamento da visão tradicional que tende a identificar o cristianismo como religião absoluta. Em sua visão, nenhuma religião pode alimentar a pretensão de ter o monopólio da revelação divina. Sem desconhecer o dado das ambigüidades na história religiosa da humanidade, Tillich soube identificar com grande delicadeza a presença da universalidade e riqueza dos “dons” de Deus, que sempre antecedem a dinâmica da busca religiosa realizada pelos seres humanos. Mesmo marcando em sua perspectiva teológica o lugar singular do cristianismo e o papel central ocupado por Jesus Cristo, enquanto revelador do Novo Ser, Tillich mantém em aberto o papel positivo das outras religiões no plano da salvação.

 

Mesmo reconhecendo os traços de grande abertura de Tillich em sua compreensão universalista de revelação, deve-se registrar a presença de contrastes na  visão deste teólogo em passagens mais precisas a respeito do tema, que mostra certo titubeio em avançar para além da posição tradicional defendida em momentos precisos de sua teologia sistemática. No primeiro volume desta obra, Tillich fazia a distinção entre revelação preparatória e revelação receptora. E  argumentava:

 

“O centro da história da revelação divide todo o processo em revelação preparatória e receptora. A portadora da revelação receptora é a igreja cristã. O período da revelação receptora começou com o início da igreja. Todas as religiões e culturas fora da igreja, conforme o julgamento cristão, ainda estão no período de preparação”[14]

 

 Trata-se de uma distinção utilizada pelo autor para marcar a diferença qualitativa que a aparição de Jesus introduz na história da revelação. Para Tillich, Jesus é aquele que traz o Novo Ser redentor, conferindo um novo sentido para a revelação do mistério de Deus. Seguindo a linha de sua reflexão cristológica, Tillich indica que com Jesus Cristo “a história chegou ao fim”, ou seja, à sua meta qualitativa, enquanto traduz o “aparecimento do Novo Ser como realidade histórica”. Mas isto não significa o encerramento do processo revelatório, que continua quantitativamente em curso[15]. 

 

Na visão de Tillich, o aparecimento de Jesus como o Cristo determina uma qualidade distinta à “Comunidade Espiritual”. Se antes de sua recepção esta comunidade estava em período de “latência”, com a sua presença entra no período de “manifestação”. Mas os dois períodos, ainda que qualitativamente distintos, estão animados pela “Presença Espiritual”[16]. Esta é uma distinção utilizada por Tillich no terceiro volume de sua teologia sistemática, para estabelecer a relação entre o cristianismo e as outras tradições religiosas. O teólogo identifica a presença de uma Comunidade Espiritual latente na “assembléia do povo de Israel”, nas “comunidades devocionais islâmicas”, nas “comunidades que adoram os grandes deuses mitológicos”, nos “grupos sacerdotais esotéricos” etc. São comunidades que se encontram “sob o impacto da Presença Espiritual”, mas de forma ainda latente, pois carecem a seu ver dos critérios da “fé e o amor do Cristo”. Para Tillich, estas comunidades estão orientadas teleologicamente para a Comunidade Espiritual manifesta, dirigindo-se “inconscientemente ao Cristo”[17]. 

 

Este critério eclesiológico adotado por Tillich para distinguir o cristianismo das outras tradições religiosas é, de fato, mais restritivo com respeito a posições mais arrojadas defendidas pelo teólogo em outros textos do mesmo período. É uma perspectiva que vem sendo progressivamente questionada pela reflexão teológica em torno do pluralismo religioso. Não há como manter a plausibilidade de um pluralismo religioso de princípio quando se busca defender uma “ordenação” das outras tradições religiosas ao cristianismo ou à igreja. A legitimidade do pluralismo acaba sendo minada pela perspectiva de um “teologia do acabamento”, que identifica no cristianismo o “remate” e o cumprimento da positividade que pode ser encontrada nas outras tradições religiosas. O desafio que se coloca para aqueles que buscam encontrar em Tillich pistas fundamentais para uma teologia aberta das religiões é descortinar os traços mais abertos que estão envolvidos na sua reflexão sobre a substância católica e o espírito protestante. É no âmbito desta reflexão que se pode encontrar a chave fundamental para a superação de um provincianismo eclesiológico ainda presente em alguns textos do autor, com repercussões negativas no campo missiológico.

 

  1. Uma cristologia cristomórfica

 

A perspectiva cristológica defendida por Paul Tillich é distinta daquela defendida por Karl Barth. Pode-se falar de mudança de tônica: de um cristocentrismo para um cristomorfismo, para utilizar uma terminologia tomada de Langdon Gilkey[18]. Na visão de Tillich, no evento de Jesus como o Cristo “a unidade eterna de Deus e ser humano se tornou realidade histórica”[19], fazendo emergir o “Novo ser na totalidade de seu ser”[20],  mas não se pode com isso desconhecer a finitude autêntica de Jesus: “como ser finito, ele está sujeito à contingência de tudo que não é por si mesmo, mas que é ´lançado` à existência”[21]. Há uma relação paradoxal entre Jesus e o Cristo. Se para Tillich, o Cristo está no centro da dinâmica reveladora de Deus, Jesus não é o todo deste centro. A manifestação empírica do Cristo em Jesus de Nazaré instaura, necessariamente limites que não podem ser olvidados[22]. Como indica Jean-Marc Aveline,

 

“Tillich refuta sustentar uma adequação perfeita entre a pessoa de Jesus de Nazaré e a realidade designada pelo termo ´Cristo`, preferindo deixar aberta a possibilidade de outras realizações da realidade crística em outras culturas e outros períodos da história. Ele mantém, contudo, que só a realização em Jesus confessado como o Cristo é normativa, sendo as outras análogas”[23]. 

 

Ao situar Cristo no centro da história, Tillich está expressando algo que traduz uma experiência de confissão existencial, mas que não pode ser objeto de uma constatação fora de seu emprego na igreja. E isto se aplica igualmente a determinadas expressões bíblicas que apresentam Jesus como via única de salvação. São expressões claramente performativas, exortativas, que encontram plausibilidade no âmbito do contexto litúrgico-doxológico, mas que não podem ser aplicadas de forma objetiva, e nem ser utilizadas para condenar as outras tradições religiosas. Tillich tem razão quando sublinha que

 

“Jesus é o Cristo para nós, a saber, para aqueles que participam deste continuum histórico a que Cristo confere um sentido. Esta limitação existencial não limita qualitativamente sua significação, mas deixa a porta aberta a outras auto-manifestações divinas antes e depois de nosso continuum histórico”[24].

 

Esta reflexão cristológica de Tillich insere-se em sua visão mais ampla sobre a presença universal do Logos  e do Espírito de Deus que se faz presente em toda a história da humanidade[25]. E como assinala Claude Geffré, é uma posição teológica em larga consonância com a tradição católica, que busca afirmar a dinâmica de uma revelação universal que transborda amplamente as fronteiras do cristianismo, e abre “um caminho fecundo para exorcizar a pretensão de monopólio da revelação divina por uma religião cristã”[26].

 

  1. As religiões sob a Presença Espiritual

 

Uma das importantes contribuições dadas por Paul Tillich em favor da reciprocidade entre as religiões situa-se no âmbito da dimensão mística. Trata-se da pista da profundidade que habita cada tradição religiosa. O diálogo acontece não a nível de superfície, onde as distâncias são muito mais acentuadas, mas a nível de profundidade. Foi  com base em Tillich que Paul Ricoeur utilizou a imagem da esfera para exemplificar este dado: na superfície as distâncias são imensas, mas na medida em há um direcionamento para o centro, em profundidade, verifica-se uma inusitada aproximação. Para Ricoeur,

 

“não existe ponto de vista de Sirius, de observador superior de onde se possa abraçar a multiplicidade das religiões; é sempre do seio de um compromisso determinado que se pode reconhecer, lateralmente de algum modo – quer dizer, sem sobrevôo nem visão se profundidade -, os valores das outras religiões, se bem que é aprofundando meu compromisso que posso encontrar aquele que, partindo de outro ponto perspectivo, realiza um movimento análogo”[27].

 

Esta pista da aproximação pela profundidade indica a importância da perspectiva mística para se poder acessar o mistério que subjaz na pluralidade religiosa. Mas a tendência comum é resistir a este “recanto mais secreto de nós mesmos” e se manter estável à superfície, no “ambiente das coisas familiares”, evitando o confronto com o “Desconhecido”, e o desafio de “medir a profundeza do Mundo abaixo de nós”[28]. Mas aquele que tem a coragem e “ousadia” de fazer uma tal experiência depara-se com a surpresa de um encontro com o mistério que é “eterno descobrimento” e “eterno crescimento”, de um mistério que é envolvente e que banha cada rincão das culturas e tradições religiosas. E para poder captar o seu enigma é necessário “educar” a vista, como indica Teilhard de Chardin[29].

 

O teólogo Roger Haight está coberto de razão ao assinalar que “as pessoas que não conseguem reconhecer a verdade salvífica das outras religiões podem implicitamente estar operando com uma concepção de Deus distante da criação”[30]. A perspectiva apontada pela experiência mística vai noutra direção, que é de reconhecimento e acolhida da presença de um mistério que está sempre disponível. E o que se pode verificar é algo ainda mais radical: na medida em que se aprofunda e se adentra na experiência religiosa de uma particular tradição, cresce de forma concomitante a consciência de que o mistério experimentado transborda a própria tradição. Para Tillich, o cristianismo encontra-se diante de um desafio singular, que é o de transcender sua particularidade. Mas não pelo caminho do abandono da própria tradição, mas de seu aprofundamento mediante a oração, o pensamento e a ação: “na profundidade de toda religião viva há um ponto onde a religião como tal perde sua importância e o horizonte para o qual ela se dirige provoca a quebra de sua particularidade, elevando-a à uma liberdade espiritual que possibilita um novo olhar sobre a presença do divino em todas as expressões do sentido último da vida humana”[31] 

 

Na visão de Tilich, toda a história humana está marcada pela Presença Espiritual, assim como as tradições religiosas. Mas a forma de captação de sua presença sofre a refração da dinâmica contingencial e limitada da mesma história. É semelhante ao que ocorre com a mudança de direção sofrida pelos raios luminosos provenientes dos astros ao atravessarem a atmosfera terrestre. A Presença Espiritual nunca se esgota nas formas fragmentárias de sua manifestação no tempo, ela transcende “condições, crenças e expressões de fé individuais”[32]. Embora a Presença Espiritual nunca seja ambígua, encontra-se sempre presente na história de forma “fragmentária e antecipatória”. Não pode haver nem história nem religiões sem a presença de ambigüidades[33]. Na linha da tradição mística sufi, Ibn ´Arabi (1165-1240) mostrou com pertinência o equívoco de querer atar ou vincular a realidade última (o Real) a imagens categoriais e fixas. O resultado de tal operação de vinculação pode ser, às vezes, desastroso. Ao comentar sobre a questão, Michael Sells assinalou:

 

“Dado que o real é infinito, não pode ser limitado aos confins de uma única crença; o deus da crença não é o Deus verdadeiro, mas somente um ídolo intelectual. A tragédia é que de fato o real se manifesta verdadeiramente nessa imagem, mas ao limitar o real a essa imagem particular e ao negar suas outras manifestações, terminamos por negar o real em sua infinitude”[34]

 

A realidade da Presença Espiritual é um convite permanente às religiões para superarem a tendência de “profanização” e “demonização” presentes na dinâmica de suas ambigüidades. Nesse sentido ela constitui uma “superação” da religião, uma provocação permanente no sentido de seu aperfeiçoamento espiritual. Como mostra Tillich,

 

“onde o Espírito divino supera a religião, ele impede a reivindicação de absolutismo, tanto por parte da igreja quanto por parte de seus membros. Onde o Espírito divino é efetivo, rejeita-se a reivindicação de uma igreja de representar a Deus com exclusão das demais. A liberdade do Espírito se opõe a esta reivindicação. E quando o Espírito divino está presente, a reivindicação de um membro da igreja por posse exclusiva da verdade é minada pelo testemunho do Espírito divino acerca de sua participação fragmentária e ambígua na verdade”[35]. 

 

Segundo Paul Tillich, o que expressa essa superação da religião pela Presença Espiritual é o “princípio protestante”, uma categoria chave em sua abordagem teológica, e que vem articulada com a “substância católica”. Enquanto o “princípio protestante” é uma barreira protetora contra as forças de “profanização e demonização” das igrejas e religiões, não se atendo às igrejas da Reforma; a “substância católica” traduz a “corporificação concreta da Presença Espiritual”[36]. O aprofundamento da compreensão destas duas categorias centrais no pensamento de Tillich e o exercício de sua extensão às outras religiões tornam-se chave essencial para o diálogo inter-religioso[37], além de indicar que este encontro vem animado por uma indispensável dimensão experiencial e mística.

 

 Tudo isto contribui para mostrar que o diálogo inter-religioso constitui um caminho essencial para o aprofundamento da compreensão do próprio mistério que se experimenta em determinada “comunidade de escuta e interpretação”. E Tillich soube reconhecer isto ao enfatizar o dado de que toda religião se baseia numa experiência de revelação. O cristianismo deixa de ser o “cumprimento” ou “realização” das outras religiões, firmando-se como uma tradição de escuta e acolhida da alteridade, permeável ao “enriquecimento” da experiência de Deus que acontece também alhures.

 Publicado em: Revista Eletrônica Correlatio nº 10 - Novembro de 2006

http://www.metodista.br/ppc/correlatio/correlatio10/a-substancia-catolica-e-as-religioes



[1] Claude GEFFRÉ. De babel à pentecôte. Essais de théologie interreligieuse. Paris: Cerf, 2006, p. 82 (Paul Tillich et l´avenir de l´oecuménisme interreligieux); Monique AEBISCHER-CRETTOL. Vers un oecuménisme interreligieux. Jalons pour une thélogie chrétienne du pluralisme religieux. Paris: Cerf, 2001, pp. 245-254; Reinhold BERNHARDT. La pretensión de absolutez del cristianismo. Bilbao: Desclée de Brouwer, 2000, p. 160.

[2] Mircea ELIADE. Paul Tillich e la storia delle religioni. In: Paul TILLICH. Il futuro delle religioni. Brescia: Queriniana, 1970, p. 36.

[3] Paul TILLICH.  Le christianisme e les religions. Paris: Aubier, 1968 (o original de 1963).

[4] Paul TILLICH. Il significato della storia delle religioni per il teologo sistematico. In: ____. Il futuro delle religioni, p. 133.

[5] Jean-Marc AVELINE. L´enjeu christologique en théologie des religions. Le débat Tillich-Troeltsch. Paris: Cerf, 2003, pp. 511 e 519.

[6] Paul TILLICH. Teologia sistemática. 5 ed. São Leopoldo: Sinodal/EST, 2005, p. 472. Tillich passou boa parte da vida elaborando sua teologia sistemática. O primeiro volume foi publicado em 1951, o segundo em 1957 e o terceiro em 1963. Este terceiro volume, publicado já depois de sua viagem ao Japão não consegue, em geral, romper com a perspectiva teológica vigente nos outros volumes, embora posições mais inovadoras pudessem aparecer em diversas conferências realizadas entre os anos de 1961-1965. Isto leva determinados intérpretes a falar em certo “contraste” na visão de Tillich. Como indica John Dourley, “na mesma época em que essas novas posições começavam a ser moldadas e em visível tensão com elas, Tillich se apegava às antigas perspectivas conservadoras ao escrever o volume final de sua Teologia Sistemática”: Substância católica e princíprio protestante: Tillich e o diálogo inter-religioso. Correlatio, n.1, abril 2002, p. 1: http://www.metodista.br/correlatio/num_09/numante1.php#1.

[7] Jean-Marc AVELINE. L´enjeu christologique en théologie des religions, p. 660. Mas os posicionamentos a respeito são diferenciados: Paul Knitter insere a reflexão de Tillich no modelo de “substituição parcial”, segundo o qual se reconhece a presença reveladora de Deus nas outras religiões, mas não a dinâmica autônoma de sua salvação, que vem vinculada a Jesus Cristo (Introduzione alle teologie delle religioni. Brescia: Queriniana, 2005, pp. 75-90); Reinhold Bernhardt vê similaridade com a posição inclusivista de Rahner (La pretensión de absolutez del cristianismo, p. 161); Jacques Dupuis já o situa entre os pluralistas de cristologia normativa (Rumo a uma teologia cristã do pluralismo religioso. São Paulo: Paulinas, 1999, pp. 260-261).

[8] Jean-Marc AVELINE. L´enjeu christologique en théologie des religions, p. 660. Para Tillich, a teonomia distingue-se da autonomia e da heteronomia. Não se trata simplesmente da aceitação “de uma lei divina imposta à razão por uma autoridade suprema”, mas de uma “razão autônoma unida à sua própria profundidade”. O que distingue uma cultura teônoma é a orientação dada pelo Espírito: Paul TILLICH. Teologia sistemática, pp. 98 e 692. O Kairos traduz para Tillich a “plenitude do tempo”, que marca o tempo forte da “irrução da manifestação central do Reino de Deus”, identificado também por Paulo com o momento do envio do Filho por Deus (que marca para ele o centro da história): Ibidem, pp. 800-801. O demoníaco traduz para Tillich os traço de corruptibilidade, ambigüidade e destrutividade que permeiam todas as religiões, enquanto fenômenos contingentes e fragmentários.

[9] Paul TILLICH. Il significato della storia delle religioni per il teologo sistematico. In: ____. Il futuro delle religioni, p. 118.

[10] Paul TILLICH. Teologia sistemática, p. 593.

[11] Jean-Marc AVELINE. L´enjeu christologique en théologie des religions, p. 619.

[12] Paul TILLICH. Il significato della storia delle religioni per il teologo sistematico. In: ____. Il futuro delle religioni, p. 118.

[13] Paul TILLICH. Teologia sistemática, p. 122.

[14] Ibidem, p. 154.

[15] Ibidem, p. 409. Tillich argumenta que “se a revelação final foi aceita, nem por isso o processo revelatório terminou; ele continua até o fim da história”: ibidem, p. 154. Em semelhante linha de reflexão, o teólogo Jacques Dupuis vai assinalar que em Jesus a revelação divina alcança sua “plenitude qualitativa” (de intensidade), mas deixa em aberto sua dimensão quantitativa, na medida em que não significa um “obstáculo para a continuação da auto-revelação divina por meio dos profetas e dos sábios de outras tradições religiosas, como por exemplo, o profeta Maomé”. Para Dupuis, em Jesus Deus pronuncia sua palavra “decisiva”, mas não “definitiva” e conclusiva. Cf. Jacques DUPUIS. Rumo a uma teologia cristã do pluralismo religioso. São Paulo: Paulinas, 1999, pp. 346-347; Id. La teologia del pluralismo religioso rivisitata. Rassegna di Teologia, v. 40, n. 5, set./ott. 1999, p. 671.

[16] E esta “Presença Espiritual” para Tillich “transcende condições, crenças e expressões de fé individuais”.

[17] Paul TILLICH. Teologia sistemática, pp. 605-607. É uma posição teológica que se aproxima bastante daquela defendida no campo católico por Karl Rahner. A idéia de “ordenação” à igreja é também tradicional na teologia e magistério católico-romano. É uma perspectiva que tem suas raízes em Tomás de Aquino (ST IIIa, q.8, a.3, ad 1), sendo assumida a nível magisterial na encíclica Mystici corporis de Pio XII, em 1947 (DzH 3821). Segundo John Dourley, Tillich assume aqui traços de uma reflexão bem conservadora, se comparada com outros textos escritos no mesmo período, depois de sua viagem ao Japão: cf. substância católica e princípio protestante..., pp. 5-6.

[18] Jean-Marc AVELINE. L´enjeu christologique en théologie des religions, p. 456.

[19] Paul TILLICH. Teologia sistemática, p. 434.

[20] Ibidem, p. 410.

[21] Ibidem, p. 419 e também p. 420. Ver também: Monique AEBISCHER-CRETTOL. Vers un oecuménisme interreligieux, p. 232-234.

[22] Algo semelhante diz Jacques Dupuis: “a particularidade histórica de Jesus confere limitações inevitáveis ao evento-Cristo”: Jacques DUPUIS. Rumo a uma teologia cristã do pluralismo religioso, p. 412. É importante sublinhar que ao enfatizar a particularidade histórica de Jesus, a reflexão teológica está abrindo portas para uma perspectiva aberta para o diálogo inter-religioso.

[23] Jean-Marc AVELINE. L´enjeu christologique en théologie des religions, pp.  644-645.

[24] Paul TILLICH. Teologia sistemática, p. 391. Não há, segundo Tillich, fundamento para uma exclusividade da revelação. Ninguém está autorizado a limitar as possíveis e inusitadas manifestações do incondicionado. E isto significa a abertura para a “eventualidade de outras revelações”: Jean-Marc AVELINE. L´enjeu christologique en théologie des religions, p. 353.

[25] “Para Tillich, uma teologia é cristológica na medida em que perscruta a presença e a ação do Logos de Deus em toda a criação, na história das religiões e da culturas...”: Jean-Marc AVELINE. L´enjeu christologique en théologie des religions, p. 326.

[26] Claude GEFFRÉ. De babel à pentecôte..., pp. 92-93.

[27] Paul RICOEUR. Em torno ao político. São Paulo: Loyola, 1995, pp. 188.189 (Leituras I). Ver ainda: Christian DUQUOC. L´unique Christ. La symphonie différée. Paris: Cerf, 2002, p. 125.

[28] Teilhard de CHARDIN. O meio divino. Lisboa: Presença, pp. 80-82 (trata-se de uma das passagens místicas mais densas e belas em torno da descida do ser humano à profundidade de seu ser).

[29] Ibidem, pp. 42-43. Para Chardin, “Deus está infinitamente próximo e em toda a parte”. Em sua visão, o grande mistério do cristianismo não está na Aparição de Deus, mas na sua “Transparência” no Universo. Mas é um mistério que sempre se esquiva do abraço, e só pode ser alcançado no esforço limite de captá-lo “presente e atraente no fundo inacessível de cada criatura”: ibidem, p. 128 e 130.

[30] Roger HAIGHT. Jesus, símbolo de Deus. São Paulo: Paulinas, 2003, p. 479.

[31] Paul TILLICH. Le christianisme et les religions. Paris: Aubier, 1968, p. 173. Ver ainda: Jean-Marc AVELINE. L´enjeu christologique en théologie des religions, p. 573. O exemplo de Thomas Merton pode ser aqui apontado como significativo para esta experiência de intensificação de uma experiência religiosa, de sua “realização tradicional e interior”, mas ao mesmo tempo disponível para a sua “ultrapassagem”, na medida em que marcada pela abertura sempre renovada ao aprendizado de novas experiências e linguagens: cf. Thomas MERTON. O diário da Ásia. Belo Horizonte: Vega, 1978, p. 248; Paul KNITTER. Introduzione alle teologie delle religioni, pp. 448-449; David TRACY. Pluralidad y ambigüedad. Madrid: Trotta, 1987, p. 143.

[32] Paul TILLICH. Teologia sistemática, p. 607.

[33] Ibidem, p. 594.

[34] Michael SELLS. Tres seguidores de la religión del amor: Nizām, Ibn ´Arabī y Marguerite Porete. In: Pablo BENEITO (Ed.). Mujeres de luz. La mística feminina, lo femenino en la mística. Madrid: Trotta, 2001, p. 141. Como indica Ibn ´Arabī, a “Divindade das convicções dogmáticas é prisioneira das limitações”, enquanto nada pode conter a “Divindade absoluta”, pois ela é “a essência das coisas e a essência de Si mesma”: Le livre des chatons des sagesses. Beyrouth: Al Bouraq, p. 713 (Tome second).

[35] Paul TILLICH. Teologia sistemática, p. 687.

[36] Ibidem, pp. 687-688. Ver também: Id. A era protestante. São Bernardo do Campo: Ciências da Religião, 1992, pp. 242-243 e 246; Jean-Marc AVELINE. L´enjeu christologique en théologie des religions, pp. 636 e 651; Claude GEFFRÉ. De babel à pentecôte..., p. 106. Como mostra Paul Knitter, “há dentro da religião um verme (Tillich o chamava de ´elemento demoníaco`), mediante o qual esta tenta domesticar Deus e capturar a divindade na segurança da consciência humana”. Daí, segundo este autor, a necessidade de sua permanente reforma. O “princípio protestante” de Tillich atuaria, assim, como uma “vigilância nos confrontos da própria corruptibilidade”: Paul KNITTER. Introduzione alle teologie delle religioni, pp. 119-120. Mas como o próprio Tillich sublinhou, “ele sozinho não é suficiente”, necessita de ser complementado pela “substância católica”.

[37] Monique AEBISCHER-CRETTOL. Vers un oecuménisme interreligieux, p. 252; John DOURLEY. Substância católica e princípio protestante, p. 6.

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