sábado, 3 de junho de 2023

Viver em simplicidade

 Viver em simplicidade

 

Sou encantado com os filmes de Win Wenders, em particular “Paris Texas” e “Asas do Desejo”. Há também documentários fabulosos como o “Sal da Terra” e “Um homem de palavra”, sobre o papa Francisco. Agora o diretor lança mais um de seus filmes poéticos e reflexivos, que é “Perfect Days”, que foi exibido no último Festival de Cannes. 

 

Na matéria de Carlos Helí de Almeida, publicada no O Globo de 27/05/2023, o filme vem apresentado de forma muito rica e delicada. Como personagem do filme, Wenders escalou Kôji Yakusho, um dos diletos artistas do diretor Akira Kurosawa. 

 

O roteiro é simples e singelo: trata-se de um faxineiro de meia idade que se ocupa de cuidar dos banheiros púbicos de Tóquio, no Japão. É um “sujeito caladão e aparentemente feliz com o seu trabalho e o seu estilo de vida. Poucas pessoas o veem, ou prestam atenção a ele. Para muitos, Hirayama é invisível como os anjos”. Daí a presença “invisível” de outro filme de Wenders a inspirar o personagem. Como sinaliza Wenders, o clima do filme é semelhante ao de “Asas do Desejo”. 

 

Em torno do Japão, Wenders já tinha produzido antes “Tokyo-Ga”, em 1985, em torno do diretor Yasujiro Ozu (1903-1963), um dos preferidos do diretor alemão. Agora retoma ao Japão para apresentar um filme altamente poético e singelo. O personagem de “Perfect Days” narra o dia de um funcionário público na cidade de Tokyo, numa função “banal”. Mas há ali uma simplicidade só na superfície, como relata o diretor: “ele é meticuloso em sua rotina diária e perfeccionista na execução de seu trabalho – luvas, escovas, esfregões e borrifadores de material de limpeza sempre à mão. Em sua vã, ouve rock e pop tirados  de velhas fitas cassetes, com preferência pelas músicas de Lou Reed e Path Smith”.

 

Em sua casa, diz o diretor, ele “distrai-se com com livros de grandes autores japoneses e estrangeiros. No intervalo do almaço, lê e tira fotos de suas árvores preferidas, e sorri para o mundo à volta”. Para Wenders, trata-se de um filme “muito espiritual”, que veio do fundo da alma. O roteiro foi realizado em parceria com o diretor e roteirista japonês Takuma Takasai.

 

Como diz o analista Carlos Helí, trata-se “de um filme melancólico e poético sobre um homem em busca da felicidade (...). Um oásis de tranquilidade e otimismo dentro da programação de fimes de Cannes, abarrotada de crises e conflitos”. 

 

Segundo Wenders, o que ele queria contar com o filme “é que existe uma riqueza enorme em uma vida mais simples. Basta vivenciar o dia a dia, o momento. A capacidade de viver o momento é algo que está se tornando cada vez mais difícil e raro. Todos nós temos coisas demais, entretenimentos demais, truques demais”. Um dos caminhos que se abrem, na contramão disso tudo “é viver o momento, apenas ler um livro, ouvir uma música de que você gosta, estar na frente de alguém”. 

 

Como bem definiu o ator protagonista do fime,  “estar no set de Wenders é sentir o lugar onde Hirayama mora, os problemas que ele enfrenta”. Estamos diante de uma história “que foi bem ambientada”. Ele não sabe ao certo se conseguiu tornar-se assim tão próximo do personagem, mas sublinha que gostaria de “ser uma pessoa como ele, que não tem interesses materiais, só quer ler os livros de que gosta e ir para a cama todos os dias com a ideia de que se divertiu bastante e tem uma vida plena”.

 

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