O essencial cuidado
espiritual
Faustino Teixeira
Estamos
vivendo um tempo propício, um tempo de luz, de despertar para um novo ritmo
espiritual voltado para a atenção e o cuidado. O cuidado que se volta para o
mundo interior e para o mundo ambiente. O livro de Anselm Grün e
Leonardo Boff, O divino em nós
(Vozes, 2017), toca na nervura desse desafio essencial. Já anunciava Rilke em
seus escritos sobre a importância vital do mundo interior, da visita regular à
dimensão mais profunda de cada um. Essa é a cadência da espiritualidade, que
sorve sua razão mais viva no mundo da interioridade, da profundidade, podendo
aí captar as vozes do Mistério sempre maior. É na “cela interior” ou “centelha
da alma” que reside a dimensão mais profunda de nós mesmos.
Esta é a convicção
que anima todos os grandes místicos de distintas tradições religiosas. A partir
desse fundo essencial somos capazes de perceber que não estamos sós, mas
interligados, radicalmente, a todo o cosmos. Somos, na verdade, formados pelos
mesmos elementos da Terra. O Mistério está em toda parte. Pode ser encontrado e
celebrado em cada movimento da criação, como mostrou o papa Francisco na sua
encíclica sobre o cuidado com a casa comum: numa “folha, em uma vereda, no
orvalho, no rosto do pobre” (LS 233).
A percepção da espiritualidade vem
ampliada por essa secreta mirada, que nos conecta com o todo, como o fio de uma
malha na textura do mundo da vida. Trata-se de uma espiritualidade que rompe
radicalmente com o antropocentrismo, quebrando a imagem do ser humano como uma
“outra coisa” ou como um ser excepcional e favorecendo um novo olhar, que capta
o humano no oceano vital das vivas conexões, onde cada ser e cada espécie vivem
uma dinâmica rica de irmandade, com seus direitos característicos.
Somos todos
“espécies de companhia” numa jornada animada por um “oceano de energia”.
Estamos todos banhados pelo hálito do Misericordioso e pela força de seu
Espírito. Do Espírito que enche o universo e nos convoca ao cuidado essencial,
na busca de uma razão sensível e cordial. Essa obra nos indica que quanto mais
estivermos conectados com essa ampla rede de inter-retro-conexões, captando o
ritmo e o canto das coisas, em simples gestos cotidianos, maiores as condições
de garantir a sobrevivência de todos no presente e no futuro.
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