A teologia face ao pluralismo
religioso
“A história religiosa da humanidade é testemunha
não só da busca tateante do mistério da Realidade última,
mas também da pluralidade dos dons de Deus
em busca do homem” (Claude Geffré)
Faustino Teixeira
PPCIR-UFJF
Resumo
O
pluralismo religioso apresenta-se hoje com uma das questões decisivas para a
teologia cristã, a ponto de delinear uma fisionomia nova para a reflexão em
curso. Não há como fazer teologia no século XXI fora da interlocução criativa
com os diversos caminhos religiosos que vão se apresentando no tempo atual. E a
novidade está em reconhecer a dignidade da diferença, acolhendo esse pluralismo
como um dado positivo no desígnio misterioso de Deus. O pluralismo deixa de ser
visto como expressão negativa, como dado conjuntural ou expressão da cegueira
dos humanos, para ser reconhecido como um fenômeno rico e fecundo. E a questão
que se coloca para o cristianismo é o desafio de manter viva a sua identidade
própria colocando-se à disposição para a escuta e o diálogo construtivo com as
outras expressões religiosas. Partindo de considerações sobre os
posicionamentos teológicos em torno do pluralismo religioso, o texto busca
destacar os embaraços e desafios que se apresentam em particular para a cristologia
e a eclesiologia.
Palavras-chave: Teologia. Pluralismo
Religioso. Diálogo. Cristologia. Eclesiologia.
Introdução
Talvez um dos mais significativos
desafios para o século XXI é o diálogo entre as religiões. Não há como desviar
desse imperativo essencial de nosso tempo. Estamos todos envolvidos num mundo
cada vez mais repleto de “outros”, de identidades religiosas distintas que se
encontram, que se vinculam ou que conflituam. As diferenças estão aí, mais
diretamente visíveis e ao alcance. E podem ser objeto seja da preocupação,
suspeita e altercação; seja da tolerância, reconciliação e diálogo. A grande
aposta vai nessa segunda direção. Como indicou Marco Lucchesi, “o estrangeiro
bate à nossa porta. Não há outro caminho senão o diálogo: na energia crescente,
no vínculo de relação que o constitui. O diálogo é um tesouro precioso, uma
zona de aventura, espanto e inquietação” (LUCCHESI, 2014)
A abertura dialogal vem precedida
pela acolhida benfazeja do pluralismo religioso. O diálogo requer essa disposição
de um olhar receptivo à diversidade das crenças. O pluralismo deixa de ser
visto apenas como um fato conjuntural, e passa a ser reconhecido em sua
positividade, como pluralismo de princípio ou de direito. De forma tão
convocadora, o papa Francisco destaca em sua Exortação apostólica, Evangelii Gaudium, que “a diversidade é
bela” (EG 230). Trata-se de um momento
novo, de um espírito novo, capaz de abertura e ousadia. Um espírito que provoca
também a teologia a romper com esquemas tradicionais e pensar mais alto,
arriscando novos caminhos. De fato, estamos diante de uma situação inédita, que
suscita uma sensibilidade instauradora, capaz de reconhecer a presença de Deus
e de sua graça nas diversas tradições religiosas. Esse é um horizonte que vem
marcar os próximos passos da teologia: estar diante de um pluralismo
insuperável. Como pontuou Claude Geffré, “os teólogos deverão cada vez mais
suportar, intelectualmente, o enigma de uma pluralidade de tradições religiosas
na sua irredutível diferença” (GEFFRÉ, 2013a, p. 60).
A diversidade religiosa não é
novidade no cenário mundial. A história vem marcada por essa riqueza, com as
variegadas respostas dadas às grandes interrogações humanas pelas distintas
religiões. O que ocorre no tempo atual é uma consciência nova da presença,
vitalidade e riqueza das outras tradições religiosas (KNITTER, 2008, p. 15). É
algo que provoca a consciência cristã, e também a teologia cristã. Vivemos uma
situação planetária singular, marcada pelo traço intercomunicativo e interdependente.
Isso provoca a necessidade de uma nova percepção do significado da
multiplicidade das religiões.
Em âmbito da reflexão antropológica,
Lévi-Strauss já tinha aventado sobre as resistências à diversidade das
culturas. O ser humano tem grande dificuldade de lidar com a diversidade,
sobretudo em razão do etnocentrismo, profundamente enraizado. Ao que parece, “a
diversidade das culturas raramente surgiu aos homens tal como é: um fenômeno
natural, resultante de relações diretas ou indiretas entre as sociedades;
sempre se viu nela, pelo contrário, uma espécie de monstruosidade ou de
escândalo” (LÉVI-STRAUSS, 1980, p. 53). Nesse texto, publicado originalmente em
1950, o pensador francês reagia ao etnocentrismo e propunha corajosamente a
defesa da diversidade das culturas, num mundo “ameaçado pela monotonia”.
Enfatizava que esta diversidade devia “ser salva”, e encarada “sem surpresa,
sem repugnância e sem revolta”, facultando um passo distinto e fundamental para
a generosidade entre as culturas humanas (LÉVI-STRAUSS, 1980, p. 87).
A teologia também vem hoje provocada
a acolher essa diversidade, e de modo particular, o pluralismo religioso, no
sentido de levá-lo a sério, em sua significação mais positiva e desafiadora. É
preciso ir ainda mais longe, nos adverte Claude Geffré, no sentido de uma
teologia inter-religiosa, capaz de reinterpretar “a singularidade cristã em
função das riquezas de ordem religiosa de que podem ser testemunhas as outras
religiões”; capaz também de favorecer uma nova inteligência do Mistério de Deus
“a partir das luzes de que dão testemunho as diversas tradições religiosas da
humanidade” (GEFFRÉ, 2013a, p. 9; GEFFRÉ, 2013b, p. 90).
1 A controvérsia em torno ao pluralismo
religioso
Acolher o pluralismo de princípio
requer rever com seriedade toda uma herança teológica cristã fundada no
exclusivismo ou na perspectiva do acabamento, ou seja, a ideia de que as outras
religiões constituem “marcos de espera” para a sua realização no cristianismo.
Este é um traço que está incrustrado na reflexão teológica cristã, e as
resistências a quaisquer mudanças são bem vivas. Daí ter lembrado Jacques Dupuis
sobre a importância de um salto qualitativo na reflexão teológica para que
ocorra de fato uma dinâmica de abertura e colaboração mútua com as outras
religiões. E fala em três aspectos essenciais: na purificação das memórias, da
linguagem teológica e do entendimento teológico. Há que visar uma “mudança das
mentalidades e dos espíritos, na verdade uma ´conversão` (metánoia) a Deus e
aos outros por parte de todos que torne possível uma melhora nas relações”.
Transformações devem igualmente ocorrer na linguagem, rompendo com o modo
muitas vezes “ofensivo e deletério” com que se aborda as outras tradições
religiosas e seus membros. E também no entendimento das outras tradições,
visando uma “compreensão renovada no modo de pensar ´os outros` e seu
patrimônio cultural e religioso”
(DUPUIS, 2004, p. 321).
Um olhar atento sobre o recorte
teológico católico presente desde meados da década de 1940 sobre as outras
religiões aponta esse traço da teoria do acabamento ou da realização. É uma
visão que no Ocidente está relacionada a teólogos como Jean Daniélou, Henri de
Lubac, Hans Urs von Balthasar e outros. Nesta perspectiva, os valores positivos
das distintas religiões são explicitamente reconhecidos, mas destinados a
encontrar o seu “acabamento” (remate) no cristianismo. Em verdade, “estas
religiões não constituem, como antes, obstáculos a vencer, mas situam-se no
plano de uma pedagogia divina como preparação ao evangelho. Nesse sentido,
constituem ´pierres d´attente` (marcos de espera) e a missão da igreja, sua inserção
na pedra angular que é Cristo” (TEIXEIRA, 2012, p. 30).
Mesmo teólogos de ponta, como Karl
Rahner, não escaparam a tal perspectiva, ainda que com nuances novidadeiras. No
âmbito do magistério eclesial, a Declaração Dominus
Iesus (DI), da Congregação para a Doutrina da Fé (CdF - 2000), veio
“consagrar” essa posição teológica[1].
Como exemplo, a rígida separação entre a fé teologal e a crença nas outras
religiões. Na visão defendida pela CdF, a fé teologal consiste na “aceitação da
verdade revelada por Deus Uno e trino”, enquanto as crenças traduzem uma
“experiência religiosa ainda à procura da verdade absoluta e ainda carecida do
assentimento a Deus que se revela” (DI 7)[2]. A
Declaração da CdF não exclui a presença da graça divina nos adeptos das outras
religiões, mas reitera que os mesmos encontram-se objetivamente numa “situação
gravemente deficitária, se comparada com a daqueles que na Igreja têm a
plenitude dos meios de salvação” (DI 22). Em semelhante perspectiva, também a
Notificação da CdF, de janeiro de 2001, em torno do livro de Jacques Dupuis: Verso una teologia cristiana del pluralismo
religioso (1997). Na proposição de número 3, a precisa defesa da teologia
do acabamento: “É conforme a doutrina católica afirmar que as sementes da
verdade e bondade existentes nas outras religiões constituem uma certa
participação na verdade contida na revelação de/em Jesus Cristo”. E estes
elementos de verdade e bondade, ainda
segundo a Notificação, derivam em última instância da mediação fontal de Jesus
Cristo (CdF, 2006, p. 550).
Reagindo ao posicionamento da CdF
com a Dominus Iesus, o teólogo
Jacques Dupuis assinala que o limite do documento foi tomar todas as religiões
do mundo em bloco, sem proceder as devidas distinções, como no caso da
especificidade das religiões abraâmicas. O resultado acaba sendo ofensivo com
respeito ao judaísmo e ao islã, só para ficar num exemplo. Segundo Dupuis, “o
único papel que a Dominus Iesus
dispõe-se a conceder aos elementos das outras tradições religiosas que
´procedem de Deus` consiste no fato de serem ´ocasiões ou pedagogias que
estimulam os corações dos homens a se abrirem à ação de Deus`” (DUPUIS, 2014,
p. 108)[3]. A
distinção operada pela CdF acaba levando a uma lógica que reafirma o tradicional
axioma “extra ecclesiam nulla salus”
(fora da Igreja não há salvação). Segundo Dupuis, afirmações assim gerais
acabam ofendendo a vida religiosa dos membros das outras tradições e carecem de
plausibilidade, pois “não há nenhuma justificação bíblica para refutar a
extensão da existência da fé divina aos membros das outras religiões” (DUPUIS,
2014, p. 77).
Mediante um olhar atento,
verifica-se que a lógica do acabamento, com nuances diversificadas, vigora em
muitos posicionamentos teológicos católicos, mesmo entre os autores que buscam
ampliar sua reflexão com os novos desafios do tempo. É o que se percebe na
resistência à acolhida do pluralismo religioso de princípio. Já a Dominus Iesus tinha reagido a tal
perspectiva, assinalando que ela colocaria em questão o “perene anúncio missionário”
(DI 4). Como justificativa, o temor do relativismo. Os argumentos firmados na
DI acabaram delineando os posicionamentos teológicos que se seguiram, de forma
consciente ou não. Em obra publicada originalmente em 2008, o teólogo e cardeal
Walter Kasper, contesta aqueles que defendem o pluralismo religioso de
princípio. Sinaliza que esta posição encontra hoje um grande consenso, mas “não
é conciliável nem com a fé cristã nem com as religiões judaica e muçulmana”. E
adverte: “Aqueles que buscam realizar a paz entre as religiões baseando-se na
tese do pluralismo religioso, devem primeiramente abolir as três religiões
monoteístas” (KASPER; DECKERS, 2009, p. 276)[4].
Também o teólogo espanhol, Andrés Torres Queiruga, resiste ao tema, advertindo
que por trás da defesa do pluralismo de princípio reside uma lógica
“voluntarista”, como se o mesmo estivesse vinculado a um “querer misterioso de
Deus” e não a uma “inevitabilidade criatural” (QUEIRUGA, 2010, p . 290). Sem
abrir espaço para qualquer exclusivismo, resiste igualmente ao que chama de
universalismo indiferenciado. Defende um “universalismo assimétrico”, reagindo
ao risco de uma equivalência reveladora entre as religiões. Busca marcar o
traço da diferença que vigora entre as religiões e suas “´gradações´ objetivas”
(QUEIRUGA, 2010, p. 360). Em semelhante perspectiva, Jacques Dupuis também
defende uma assimetria quando aborda a complementaridade entre as religiões.
Fala em reciprocidade, mas complementa com a ideia de assimetria. Reconhece a
presença de “valores adicionais e autônomos de verdade e graça” nas outras
religiões, sem porém equipará-las ao cristianismo, em razão da “transcendência
insuperável da revelação e da autocomunicação de Deus na pessoa e na obra de
Jesus Cristo” (DUPUIS, 2004, p. 320)[5]. Também
Claude Geffré, no prefácio de sua obra De
babel a pentecostes, com data de agosto de 2005, mostra certo titubeio ao
tratar o tema do pluralismo de princípio. Assinala que é “inábil falar de um
pluralismo de jure ou de direito”,
mas reconhece como fundamental reiterar um “misterioso querer de Deus
relacionado com aquilo que a Revelação nos ensina a propósito da vontade de
Deus de salvação universal” (GEFFRÉ, 2013a, p. 7)[6].
Um dos teólogos pioneiros na defesa
de um pluralismo de princípio foi Edward Schillebeeck. Em obra que coroa o seu
vasto projeto cristológico, Humanidade, a
história de Deus (1989)[7],
ele levanta a questão decisiva: se o pluralismo das religiões é fenômeno de
fato ou de princípio. Sua resposta é incisiva, e vai na direção da defesa desse
pluralismo como “riqueza” a ser “saudada por todos” e não eliminável
historicamente. As outras tradições religiosas guardam aspectos de beleza e
positividade que não se encontram na
específica experiência do cristianismo (SCHILLEBEECKX, 1994a, p. 212 e 215-216).
Na trilha aberta pelo teólogo belga, outros vieram reforçar essa mesma posição,
como Jacques Dupuis (DUPUIS, 1999, p. 26 e 526-528; DUPUIS, 2004, p. 316-318),
Michael Amaladoss (AMALADOSS, 1993, p. 126 e 128); Claude Geffré (GEFFRÉ, 2004,
p. 134-138; GEFFRÉ, 2013a, p. 52 e 102) e Roger Haight (HAIGHT, 2003, p. 456).
Esses autores comungam de uma visão semelhante, que identifica o pluralismo
religioso como um “desígnio misterioso de Deus”, cujo significado escapa
largamente a qualquer compreensão humana. A pluralidade do fenômeno religioso é
percebida como um valor duradouro, que em verdade concorre para enriquecer a
compreensão e a experiência de um Mistério que
sempre advém. Não há por que temer esta diversidade, ela na verdade
expressa “um adorno do espírito humano e de sua longa história. É algo a ser
celebrado, não lamentado” (DALAI LAMA, 2014, p. 199).
2 A teologia cristã desafiada pelo
pluralismo
Para além de uma lógica exclusiva de
identidade, a teologia cristã deve deixar-se habitar pela dinâmica da
diferença. Romper com a imagem problemática que identifica a diferença como
indigna de Deus. Esse novo procedimento é fundamental para acolher com
dignidade o pluralismo. É o desafio que se apresenta hoje com radicalidade para
o cristianismo. O problema veio colocado com pertinência por Christian Duquoc:
“Como compreender que o cristianismo possa deixar subsistir uma exterioridade
positiva na sua relação com Deus em Jesus ? Ou em outras palavras: como o
cristianismo pode pensar a própria identidade admitindo a positividade das
diferenças religiosas?” (DUQUOC, 1985, p. 135).
Uma abordagem honesta do
cristianismo não coaduna em hipótese alguma com uma perspectiva absolutista ou
exclusivista. Ao contrário, a acolhida da diversidade está radicalmente
implicada no coração do cristianismo. A relação do cristianismo com as outras
religiões deve ser caracterizada por uma atitude de abertura e justamente
porque o Deus de Jesus constitui um símbolo de abertura, um Mistério que
integra “a inquietação, o rumor e a riqueza do plural” (GESCHÉ, 2004, p. 172).
O teólogo Edward Schillebeeckx identifica o fundamento desta abertura nos
desdobramentos da própria prática reinocêntrica de Jesus, de uma prática que aponta
sempre “para além de si rumo ao próprio Deus”[8].
Indica com acerto que o cristianismo em sua singularidade está intimamente
ligado a uma particularidade histórica, que envolve regionalidade e limite.
Assinala que
“a revelação de Deus em Jesus,
tal como no-la prega o evangelho cristão, não significa absolutamente que Deus
absolutize uma particularidade histórica (ainda que seja a de Jesus de Nazaré).
Sabemos, por essa revelação de Deus em Jesus, que nenhuma singularidade
histórica pode ser chamada de absoluta e, por isso, por causa da relatividade
presente em Jesus, todo homem pode se encontrar com Deus também fora de Jesus,
a saber, em nossa história mundana e nas muitas religiões que nela surgiram.”
(SCHILLEBEECKX, 1994a, p. 214)[9].
Na
base da abertura dialogal há, portanto, um “paradoxo da encarnação”, ou seja, a
presença do Absoluto numa particularidade histórica. Essa presença “nos convida
a não qualificar de absoluto o cristianismo como uma religião exclusiva de
todas as outras” (GEFFRÉ, 2013a, p. 131). Em semelhante linha de reflexão, o
teólogo Adolphe Gesché destacou elementos imanentes no próprio cristianismo que
impedem uma consideração exclusivista desta tradição. Dentre os “campos de
imanência” apontou, entre outros, a tradição da teologia negativa e mística, a
reserva escatológica, a doutrina trinitária e a luta contra a idolatria.
Reconhece nesse último âmbito o campo de imanência mais misterioso, em que se
aponta o necessário distanciamento entre Deus e os humanos. Algo que o próprio Cristo
chamou a atenção, indicando que o Pai é sempre maior (Jo 14,28). E argumenta:
“Mesmo na religião da
encarnação de Deus, Jesus não cessa de lembrar que é para o Pai, e não para
ele, que devemos nos voltar, para aí encontrar exatamente o distanciamento e a
mediação que salvam do imediato. Yves Congar relembrou muitas vezes que em
nossa teologia pode haver um cristocentrismo que não é cristão. É um dos
sentidos do segredo messiânico. Ao se abolutizar, o cristianismo se torna
idolatria, e essa contrafação se volta contra ele mesmo e contra sua lógica,
que consiste exatamente em ser luta contra a idolatria, para que a salvação não
seja vã. A idolatria é exatamente a recusa do distanciamento, que se perderia
com a pretensão do acesso total, saturador, de fusão, absoluto” (GESCHÉ, 2004,
p. 187).
A
abertura ao pluralismo de princípio envolve transformações profundas no modo
como a teologia cristã trabalha a cristologia. Sobretudo a recuperação do senso
misterioso e transcendente de Deus. Em sua clássica obra em torno de uma
teologia cristã do pluralismo religioso, Jacques Dupuis reagiu contra o risco
do cristomonismo: a tendência de uma excessiva concentração cristocêntrica do
mistério da salvação. Risco muitas vezes denunciado pela tradição oriental. Daí
sua preocupação em evitar a todo custo atribuir o qualificativo de ´absoluto`
seja ao cristianismo ou mesmo a Jesus Cristo. E a razão aventada é que este
atributo reserva-se à Realidade última ou ao Ser Infinito. Nenhuma realidade
finita, nem mesmo a do Filho-de-Deus-feito-homem pode esgotar o mistério divino
(DUPUIS, 1999, p. 346 e 390; DUPUIS, 2004, p. 211; DUPUIS, 2014, p. 95-96)[10].
Uma atenção especial deve ser
concedida à linguagem teológica adotada, evitando o vocabulário deletério com
respeito aos outros. Um cuidado que deve ser adotado ao falar da figura de
Jesus de Nazaré. Visando o diálogo, deve-se atender prioritariamente a proposta
reveladora de Jesus de Nazaré, e não tanto a sua pessoa individual (QUEIRUGA,
2001, p. 345-346). Esse é o caminho adotado por muitos cristãos na Ásia, para
os quais “proclamar a Cristo significa antes de tudo viver como ele, no meio
dos próximos e vizinhos que não têm a mesma fé e não são da mesma confissão nem
convicção e, pela força de sua graça, fazer o que ele fez. Uma proclamação pelo
diálogo e pelos atos” (FABC, 2000, p. 42).
O teólogo Andrés Torres Queiruga
sublinha a importância de uma séria revisão do cristocentrismo, evitando frases
que hoje revelam-se altamente problemáticas como: “não existe conhecimento de Deus
a não ser em Jesus Cristo”. São expressões que perdem sua plausibilidade no
tempo atual. Elas até podem manter seu sentido
“em uma linguagem interna, de
natureza imediatamente ´confessante`, todavia em rigor, devem ser eliminadas,
não só por serem psicologicamente ofensivas para os demais, mas por serem
objetivamente falsas, pois implicam a negação de toda verdade nas demais
religiões, incluindo o Antigo Testamento” (QUEIRUGA, 2001, p. 347-348).
Vale aqui uma observação sobre essa questão da linguagem
“confessante”. Na trajetória do cristianismo, a linguagem dos discípulos de
Jesus veio muitas vezes marcada por esse traço absoluto. Trata-se, como diz
Dupuis, de uma linguagem de “sobrevivência”, uma linguagem performativa,
“destinada a exortar os discípulos a um seguimento entusiasmado” (DUPUIS, 2004,
p. 218). Para os fieis cristãos o Absoluto ganha uma fisionomia concreta em
Jesus, e só para eles, Jesus apresenta-se como a Palavra e o Caminho. A
confissão essencial feita pelos cristãos de que Jesus é o Cristo e que nele
Deus se revelou de modo decisivo é uma “afirmação existencial e não uma frase
objetiva e objetivável”. Trata-se de um enunciado de fé, mas não de uma
afirmação baseada numa constatação que pode ser verificada para além da fé
professada (SCHILLEBEECKX, 1994, p. 190-191; PANIKKAR, 1994, p. 17; KUNG, 1999, p. 286).[11]
A
revisão do cristocentrismo não coloca em questão a identidade cristã, que
mantem sua força viva, mas a afirmação desta identidade não comporta expressões
exclusivistas que acabam por negar o significado positivo das outras tradições
religiosas no misterioso desígnio de Deus. Segundo Dupuis, “afirmações
absolutas e exclusivas sobre Cristo e sobre o cristianismo que reivindicassem a
posse exclusiva da auto-afirmação de Deus ou dos meios de salvação distorceriam
e contradiriam a mensagem e a imagem cristãs” (DUPUIS, 2004, p. 15). A
realidade plural das religiões não está
fora da atmosfera da acolhida benfazeja de Deus, mas encontra “sua última fonte
num Deus que é amor e comunicação”.
Na linha da argumentação da CdF na
Notificação sobre a obra de Jacques Dupuis, Jesus Cristo vem apresentado como
“o mediador, cumprimento e plenitude da revelação”, fornecendo tudo o que é
necessário para a salvação (CdF, 2006, p. 550 – II.3). Reagindo a tal
perspectiva, Jacques Dupuis assinala que a expressão “mediação fontal” –
utilizada na Notificação da CdF (n. 4) – é um pouco equivocada. Argumenta que
“o mediador não é a nascente fontal dos elementos de verdade e bondade que se
encontram nas outras tradições religiosas. A nascente fontal ou suma causa é
Deus Pai; Jesus Cristo age enquanto mediador entre Deus e a humanidade em nome
e sob a iniciativa do Pai. Em última análise, é de Deus que derivam os
elementos de verdade e bondade presentes nas tradições” (DUPUIS, 2014, p. 139).
Também o documento Diálogo e Anúncio,
do Pontifício Conselho para o diálogo Inter-Religioso, avança nessa direção
quando reconhece que o mistério de salvação atinge os fieis de outras tradições
religiosas através de “caminhos por Deus conhecidos”, e isto mediante a
“prática daquilo que é bom nas suas próprias tradições religiosas, e seguindo
os ditames da sua consciência” (DA 29).
Não há dúvida sobre o lugar ocupado
por Jesus na tradição cristã, sendo reconhecido pelos fieis desta tradição como
constitutivo de sua salvação, ou seja, o “mediador da consciência cristã da
vida no Espírito”. Mas como lembra Roger Haight, as Escrituras judaica e cristã
atestam que
“Deus como Espírito está
presente e atuante no mundo, em prol da salvação humana, desde os primórdios,
sem nexo causal com a manifestação histórica de Jesus. Por conseguinte, Jesus é
constitutivo e a causa da salvação dos cristãos, por ser o mediador da
consciência cristã da vida no Espírito. Mas Jesus não é constitutivo da
salvação em termos universais. Pelo contrário, uma cristologia do Espírito, ao
reconhecer que o Espírito é operativo externamente à esfera cristã, está aberta
a outras mediações de Deus” (HAIGHT, 2003, p. 523).[12]
Uma vez reconhecido que o fundamento universal da salvação
é Deus como Espírito, “normativamente revelada em Jesus, mas igualmente
presente em outras religiões”, abre-se espaço para a plausibilidade de outros
canais da presença gratuita de Deus, que
pode ocorrer num evento, num livro, numa práxis ou ensinamento, e não
unicamente numa pessoa. Como revela Haight, “religiões outras que não o
cristianismo medeiam, verdadeira e realmente, a presença de Deus, de sorte que
Deus é precisamente encontrado em diversos e diferentes caminhos” (HAIGHT,
2003, p. 477).
O fato de estarmos animados pela convicção de que Deus age
também na história através de outras mediações não prejudica o compromisso que
assumimos como cristãos, bem como nossa compreensão da riqueza da experiência
de Deus mediada por Jesus. O que ocorre é apenas uma ampliação do olhar, com o
reconhecimento de que Jesus não é o único caminho da vida para Deus. Como
mostrou Schillebeeckx, “Jesus não só revela Deus, mas também o esconde, uma vez
que surge em humanidade criada e não-divina. E assim, como homem, ele é um ser
histórico, contingente, limitado, que não pode absolutamente representar toda a
riqueza de Deus” (SCHILLEBEECKX, 1994 a , p. 26). Assim sendo, a manifestação
de Deus em Jesus não provoca uma clausura na história da religião, nem um termo
na dinâmica renovadora dos dons de Deus no tempo. O processo revelador está
aberto enquanto houver história.
Assim como no âmbito da cristologia, também encontramos na
reflexão eclesiológica traços de uma perspectiva que dificulta a abertura
dialogal e a acolhida do pluralismo[13].
Tanto a teologia como a mentalidade usual dos cristãos continuam ainda
trabalhando consciente ou inconscientemente com os pressupostos de um
posicionamento mais reticente. A força e o peso das afirmações doutrinais sobre
a igreja acabam atemorizando ou bloqueando uma reflexão eclesiológica mais
aberta sobre o pluralismo religioso. A busca da fidelidade ao passado acaba
sendo preponderante e o “terror em face do risco inerente a qualquer
interpretação provoca a repetição das fórmulas tradicionais” (DUCQUOC, 2001, p.
190). Permanece bem acesa na reflexão teológica uma terminologia que é devedora
de um eclesiocentrismo problemático. Algumas expressões do repertório
eclesiológico provocam desconforto no campo do diálogo com as outras religiões,
exercendo um efeito negativo, como é o caso da noção de “Povo de Deus”.
Trata-se de um termo que assinala a especial eleição do povo de Israel por
Deus, que foi ampliada e concretizada na igreja. Falar no tempo atual de um povo
eleito por Deus, como se os outros povos fossem excluídos da eleição, torna-se
problemático. Não é sem razão que alguns teólogos têm sugerido o abandono dessa
terminologia, no sentido de resguardar a não discriminação do amor (QUEIRUGA,
1998, p. 35). Na verdade, como sublinhado no manifesto do I Encontro da
Assembleia do Povo de Deus, no ano de 1992 em Quito (Equador), o “Povo de Deus
são muitos povos” (TEIXEIRA, 1997, p. 149). Outra expressão problemática é a
que fala em “ordenação” dos não cristãos ao Povo de Deus. Esta expressão,
presente na Lumen Gentium, n. 16
(Vaticano II), com base em Tomás de Aquino, é recorrente mesmo nos textos dos
teólogos inclusivistas que trabalham o tema da teologia do pluralismo religioso[14].
Também a expressão “reino de Deus” provoca reservas no contexto do diálogo
inter-religioso e de seus desdobramentos teológicos, sobretudo em razão de sua
inscrição histórica, relacionada à esperança de Israel e ao campo restrito do
cristianismo (DUPUIS, 1999, p. 456; DUQUOC, 2008, p. 89). Pode-se ainda
mencionar a definição corrente de igreja como “sacramento universal da
salvação”, presente na Lumen Gentium,
n. 48, e da “necessidade” da igreja para a salvação (Lumen Gentium, n. 14). Sobre essa questão discorreu Jacques Dupuis,
com observações bem apropriadas:
“O fato de a Igreja ser o
sacramento do Reino de Deus universalmente presente na história não implica
necessariamente que ela exerça uma atividade de mediação universal da graça em
favor dos membros das outras tradições religiosas que entraram no Reino de Deus
respondendo ao convite de Deus pela fé e pelo amor” (DUPUIS, 1999, p. 485).
Nada mais problemático do que restringir a dignidade das
outras tradições religiosas assinalando que elas “objetivamente se encontram
numa situação gravemente deficitária, se comparada com a daqueles que na Igreja
têm a plenitude dos meios de salvação” (DI 22). Isto é o que mais irrita
teólogos como Jacques Dupuis, envolvidos no diálogo inter-religioso. Trata-se
de algo que objetivamente ofende aos outros, revelando uma perspectiva
teológica curta e ensimesmada. Como assinala Dupuis, o conceito de salvação
apresentado pela Dominus Iesus (DI)
revela um estreitamento de horizontes, reiterando seu traço exclusivo de
consciência da verdade. O que permanece ausente, e que é essencial, é o traço
do amor, do agápe. E esse é o traço
fundamental apontado por Jesus para indicar o caminho da salvação (Mt 25, 31-46
e 1Jo 4,16). O que fundamentalmente conta para a salvação, sublinha Dupuis, não
é o acesso à plenitude da verdade, nem o beneficiamento dos meios de salvação
confiados por Jesus à Igreja, mas o exercício do amor (DUPUIS, 2014, p.
114-115). Para Dupuis,
“as obras do amor ou o agápe em
ação são, do ponto de vista cristão, o sinal de que Deus entrou na vida de uma
pessoa revelando e manifestando a si mesmo – não importa quanto ´anonimamente`
ou secretamente; e não importa quanto imperfeita possa permanecer no sujeito a
consciência de Deus que interveio dessa maneira. Elas também são o sinal que a
pessoa respondeu positivamente à intervenção divina na sua vida” (DUPUIS, 1999,
p. 447).
Conclusão
Um dos traços mais bonitos do
Concílio Vaticano II no que tange à abertura inter-religiosa foi o
reconhecimento feito pelo Decreto Ad
Gentes (AG), sobre a atividade missionária da igreja, da presença de
verdade e graça nas outras tradições religiosas (AG 9). Essa foi uma guinada
fundamental do Concílio, o que equivale a dizer que “Deus está se revelando e
exercendo sua salvação em todas e em cada uma das religiões, sem que jamais
algum homem ou mulher tenham sido privados da oferta de sua presença amorosa”
(QUEIRUGA, 2001, p. 319). O mesmo Concílio abriu sendas inovadoras com o
reconhecimento da liberdade de consciência, também no campo da religião (DH 3).
Foi o passo decisivo para o respeito ao destino espiritual de cada ser humano.
O diálogo verdadeiro abre sempre
espaço ao Espírito e ao seu trabalho revelador. É o Espírito que mantém sempre
aceso o inacabamento e a dinâmica incessante de movimento em direção ao novo e
ao inusitado. As práticas equivocadas da igreja católica em seu longo percurso
histórico revelaram na verdade o “quanto é perigoso, sob pretexto de ser
detentora da Palavra de Deus e de ser assistida pelo Espírito, ficar no centro
que organiza a ligação dos fragmentos, ou seja, ocupar visivelmente o lugar de
Deus” (DUQUOC, 2008, p. 155). O trabalho de Espírito consiste em manter esse
lugar vazio ou inacabado até que o tempo ganhe sua completude. Toda a dinâmica
histórica que pontua a nossa relação com Deus vem protegida por uma reserva
escatológica. Não há como romper o dado fragmentário e provisório de nossa
relação com o Mistério sempre maior.
As religiões devem deixar-se
perpassar pelo toque da transcendência e do enigma que envolvem todo o mundo
habitado. Desconhecer a verdade salvífica que atua nas religiões é
distanciar-se do Deus da criação. O verdadeiro encontro com Deus, como sublinha
Roger Haight,
“se dá em um encontro com o
mistério. Nem Jesus nem o cristianismo medeiam uma posse plena de Deus. Sem um
senso do mistério transcendente de Deus, não se esperará conhecer mais a
respeito dele a partir do que é transmitido a nós, seres humanos, por meio de
outras revelações e religiões” (HAIGHT, 2003, p. 479)
Em bela entrevista concedida por papa Francisco a Eugenio
Scalfari ele sublinhou que o mundo vem percorrido por estradas que nos
aproximam e distanciam. Mas o que é mais importante é que elas nos conduzam ao
Bem. Esse é o passo fundamental (FRANCESCO; SCALFARI, 2013, p. 55). Não há por
que temer a pluralidade das religiões. O problema não está aí, mas no risco das
querelas e tensões inter-religiosas. Contra as guerras de religião o melhor
antídoto é o caminho dialogal, longe de qualquer proselitismo. O diálogo que se
firma
“não para reduzir o outro, não
para convencer de que está errado, mas para aprender com ele, num caminho novo.
O diálogo é um ponto de luz, uma porta de saída para o impasse, um gesto
solidário. E o centro do diálogo reside na acolhida, na beleza do rosto que
contemplo, no olhar do outro que me indaga e me convida a mover os lábios”
(LUCCHESI, 2014).
A teologia do pluralismo religioso
firma-se nesse caminho de conversação essencial com os outros, reconhecidos
como amigos e interlocutores dignos, portadores de luzes nessa peregrinação ao
horizonte do Mistério que nos aguarda. E o teólogo cristão em particular vem
provocado a responder essa indagação fundamental, num contexto de rica
diversidade cultural e religiosa: Como viver e garantir a identidade processual
numa dinâmica de abertura, atenção e cortesia ao mundo do outro?
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na Revista Horizonte, v. 13, n. 14, out/dez 2015:
[1] Para uma abordagem mais ampla da Dominus Iesus cf. TEIXEIRA, 2000.
[2] Em linha de sintonia com tal perspectiva, a posição
defendida pela Comissão Teológica Internacional no Documento: O cristianismo e as religiões, publicado
em 1997: “As religiões falam ´do` Santo, ´de` Deus, ´sobre` ele, ´em seu lugar`
ou em ´seu nome`. Apenas na religião cristã é Deus mesmo quem fala ao homem em
sua palavra”: CTI, 1997, n. 103.
[3] Uma tal assimetria foi também contestada por
Christian Duquoc, ao abordar a pertença religiosa anônima de Karl Rahner. São
procedimentos que segundo Duquoc não explicam “a extraordinária diversidade das
religiões”, conservando delas “apenas sua capacidade de abrir-se positivamente
àquilo que ignoram ou, talvez, até mesmo combatam”: DUQUOC, 2008, p. 167-168.
[4] Em outra obra, Kasper indica que a relação dialógica e
diaconal envolve também um convite,
destinado às outras religiões e culturas, de encontro com Jesus, de modo a
favorecer, “mediante a participação na sua plenitude, a própria plenitude e
perfeição (via eminentiae)”: KASPER,
2006, p. 264-265.
[5] A ideia de inclusão da expressão “assimétrica” na
abordagem da complementariedade religiosa entre as religiões foi sugestão do
teólogo Gerald O´Collins, companheiro de Dupuis na Gregoriana. Veja a respeito:
O´COLLINS, 2013, p. 239. Uma inserção que se explica no contexto difícil da
notificação da CdF em torno da obra de Jacques Dupuis: “Verso una teologia
Cristiana del pluralismo religioso” (janeiro de 2001). A notificação era bem
clara na proposição 3: “A revelação histórica de Jesus Cristo oferece tudo o
que é necessário para a salvação do homem e não necessita ser complementada
pelas outras religiões”: CdF, 2006, p. 550.
[6] De novo aqui a sombra da Dominus Iesus (DI) atuando como barreira para uma ampliação do
olhar. Curiosamente, Geffré sublinha que a DI significou uma “salutar
advertência a certos teólogos”, que na busca por um diálogo inter-religioso acabaram
“tentados a questionar a unicidade e a universalidade salvífica do mistério de
Cristo”, embora reconheça também que a Declaração da CdF, em sua “obsessão com
o relativimo”, acabou obedecendo “demais a uma lógica de absolutismo na sua
maneira de compreender tanto o diálogo inter-religioso como o diálogo
ecumênico”: GEFFRÉ, 2013a, p. 7.
[7] Traduzida no Brasil com o título: História humana, revelação de Deus. São
Paulo: Paulus, 1994.
[8] SCHILLEBEECKX, 1994a, p. 214. Como indica
Schillebeeckx, “a definição de Deus que aparece em Jesus reenvia,
consequentemente, a “outro”, a ´alguém` que escapa a toda identificação
histórica, incluída aquela de Jesus, confessado como sendo o Cristo. Se não
fosse assim, a mística cristã, que faz parte integrante da tradição
confessante, perderia o seu sentido”: SCHILLEBEECKX, 1994b, p. 278.
[9] Ver também: DUQUOC, 1985, p. 136-137.
[10] Como assinalou Paulo VI na Exortação Apostólica Evangelii nuntiandi (1975), só o Reino é
absoluto (EN 8). E também João Paulo II, na Carta Apostólica Fides et Ratio (1998): “Só Deus é o
Absoluto” (FR 80).
[11] Há algo de peculiar na linguagem religiosa, como
indica Schillebeeckx, e isto pode ser observado na linguagem neo-testamentária.
Trata-se de uma linguagem performativa da confissão de fé, com uma estrutura
semântica diversa daquela objetivante da ciência. É um discurso que se aproxima
do linguajar dos amantes: SCHILLEBEECKX, 1994b, p. 268. Ver também: KNITTER,
2011, p. 164.
[12] Uma posição semelhante vem defendida por
Schillebeeck, como assinalou Roger Haight, com a indicação de Jesus não como
constitutivo da salvação mas como “o mediador da salvação especificamente
cristã”: HAIGHT, 2008, p. 104.
[13] Podíamos também acrescentar aqui os pressupostos que
regem a reflexão teológica cristã sobre a revelação. Daí a proposta sugerida
por Torres Queiruga de repensar a revelação numa perspectiva nova, aberta ao
futuro, e que não se confunde com clausura. Ou seja, uma perspectiva que vá
além do traço milagroso e exclusivista da revelação: QUEIRUGA, 2010, p.
266-269; QUEIRUGA, 2001, p. 318-324.
[14] GEFFRÉ, 2004, p. 159; DUPUIS, 2004, p. 268.
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