quinta-feira, 12 de agosto de 2021

Catástrofes à vista

 Catástrofes à vista

 

Faustino Teixeira

 

 

Impressionante constatar o rumo que o mundo vem tomando neste tempo do Antropoceno, que  é a “era da perturbação humana”. O papa Francisco tem nos alertado recorrentemente sobre o risco das catástrofes produzidas pelo homem-humano. Sinaliza em sua encíclica sobre o cuidado da casa comum (Laudato si) que “se a tendência atual se mantiver, este século poderá ser testemunha de mudanças climáticas inauditas e de uma destruição sem precedentes dos ecossistemas, com graves consequências para todos nós” (LS24). Fala ainda de outra questão grave que é o desaparecimento progressivo “de milhares de espécies vegetais e animais, que já não podemos conhecer, que os nossos filhos não poderão ver, perdidas para sempre” (LS 33)

 

Nossos povos originários lançam também seu grito de alerta, como Ailton Krenak, em dois livros recentes: Ideias para adiar o fim do mundo(2019) e A vida não é útil(2020). No primeiro livro sublinha que “a gente não faz outra coisa nos últimos tempos senão despencar. Cair, cair, cair”. No segundo, reconhece que “nós somos muito piores do que esse vírus que está sendo demonizado como a praga que veio para comer o mundo. Somos nós a praga que veio devorar o mundo”.

 

Na antropologia, o grito emerge de forma viva, em reflexões ameaçadoras, como as realizadas por Eduardo Viveiro de Castro e Deborah Danowski, no livro Há mundo por vir? (2014). O alerta deles é bem claro: cada vez há menos gente com mais mundo e mais gente com menos mundo. A cada dia nos deparamos com essa dura desigualdade de um “nós sem mundo”. Os autores nos alertam que já saímos da zona de segurança na ameaça global que está em curso: “a taxa da perda da biodiversidade, a interferência humana no ciclo de nitrogênio, e as mudanças climáticas”; e chegamos perto de outros limites como o “uso da água doce, mudança no uso da terra e a acidificação dos oceanos” (p. 20-21)

 

Igualmente a antropóloga Anna Tsing, em seu livro Viver nas ruínas  (2019) toca na mesma questão da “mudança climática excessivamente rápida; extinções em massa; acidificação do oceano; contaminação da água doce; transições críticas do ecossistema”. E também do letal processo que vige a dinâmica da industrialização em nosso tempo. É o tempo da “Terra perseguida pelo Homem”.

 

Bruno Latour também não para de tocar no tema de tudo que envolve o “Novo Regime Climático”, do fenômeno das migrações e explosão da desigualdade. Assinala que o “solo está em vias de ceder”. Indica que a questão mais dramática de nosso tempo é que não temos mais onde aterrar num tempo difícil onde a cada dia vivemos o sentimento da privação da terra. Vivemos um momento duro de “perda de orientação” e será preciso “aterrar em algum lugar” (Veja o livro: Onde aterrar. Como se orientar politicamente no Antropoceno”. 

 

E agora nos deparamos com o relatório lançado em agosto de 2021 pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) que aponta um horizonte devastador para toda a criação. Em artigo que aborda o limiar da catástrofe, publicado no O Globo de 10 de agosto de 2021, Renato Grandelle destaca alguns pontos desse importante relatório: “Ondas de calor castigam EUA, Canadá e Europa, enchentes assolam países europeus e a China, gelo derrete na Groelândia em velocidade recorde. Os eventos extremos que afetam o planeta nas últimas semanas serão cada vez mais comuns e intensos”. É o que diz o documento. Há uma previsão de aumento da temperatura global que pode alcançar em breve 1,5 graus Celcius, e isso já na próxima década. Se não hover providências urgentes, a temperatura média do planeta poderá chegar a 4,4 graus Celcius até o final do século. A concentração de gás carbônico (CO2) na atmosfera no ano de 2019 “atingiu o seu maior nível dos últimos 2 milhões de anos”.

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