domingo, 23 de junho de 2019

Menino da Casa

Ao menino da casa

Faustino Teixeira

É uma alegria para Juiz de Fora essa celebração em homenagem a um filho da casa, a esse mineiro singular e exemplar, que guarda a memória da Terra e é portador da força das Gerais. Tudo nele é poesia habitada pela natureza. Alguém que capta na viola a narrativa essencial de nosso tempo e de nossa história. Assim como Diadorim abriu a sensibilidade do jagunço Tatarana para as belezas “sem dono” da natureza, dos buritis, dos ventos e do manuelzinho-da-crôa, assim também Tavinho Moura, mantém acesa essa memória e luta por sua preservação. Sua vida e sua canção são expressões de uma Natureza que vem sendo devastada pela ganância do humano. Ele nos sinaliza a beleza que não pode morrer. Como diz Fernando Brant, “Ele sabe das águas e dos peixes do São Francisco. É  mestre no falar do povo que vive naquelas margens, naqueles barrancos”. Sua vida é o rio, as flores e os passarinhos: o João de Barro, as formigas e os cupins. Aprendemos com Rosa a importância do São Francisco, esse rio que brota no território das Gerais, que é alimentado pelo Urucuia, em cujo chapadão tanto boi berra. O rio, como diz Guimarães Rosa No Grande Sertão: Veredas, “não quer ir a nenhuma parte, ele quer é chegar a ser mais grosso, mais fundo”. Tavinho com sua poesia nos convida ao maravilhamento de ver “o rio que passa irrequieto até vazar nos olhos” e celebra conosco a alegria de ter um rio “e um barco no jardim”. Tudo isso se transforma em canção e em apelo que é sério e solene: “Quem acorda o rio fica louco, esse é o castigo”. É essa canção poética, adornada de natureza, do verdume que nos encanta e desperta, que celebramos nessa noite tão especial, para juntos relembrarmos que o “vau do mundo é a alegria” e também a coragem de manter acesa essa memória e essa beleza. Tavinho com sua viola, sensibilidade e criatividade inaugural está a cada dia nos ensinando a reverberação do universo e sobretudo, como diz Fernando Brant, “que a beleza existe” que está “ao nosso lado e dentro de nós”. É mais do que justa e necessária essa homenagem feita pela Câmara de Juiz de Fora, que nos enriquece como cidadãos, como pessoas. Ter Tavinho Moura como poeta juiz-forano é fator de responsabilidade para todos nós, manter acesa a chama da alegria e a iracúndia sagrada de lutar em favor da preservação do verde e de todas as espécies companheiras, que estão ameaçadas nesse Mundo em chamas. Vai deixando como rastro de mistério o violar e o “farrear no rumor do tambor”.

(Texto de homenagem ao compositor e cantor mineiro Tavinho Moura, por ocasião da concessão de título de cidadão beneméritos de Juiz de Fora - 24/06/2019 - Publicado no Jornal Tribuna de Minas, de 23/06/2019)


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