Uma espiritualidade
Ecológica – Laudato Si (2015)
Faustino Teixeira
Ainda sob
o impacto da nova encíclica de Francisco, Laudato Si, cujas repercussões
estamos sentindo por todo lado. Vejo a iniciativa como a força de uma voz
profética que se levanta contra a indiferença que vemos por toda parte. Como
indica Francisco, há infelizmente uma “indiferença geral” face a tantas
tragédias que vêm ocorrendo em tantas partes do mundo. “A falta de reação –
sublinha – face a estes dramas de nossos irmãos e irmãs é um sinal da perda
daquele sentido de responsabilidade para com nossos semelhantes”.
Corajosamente propõe, não o crescimento, mas o
decrescimento (ou como se diz na Itália, a “decrescita felice”). Urge reagir
contra os efeitos nefastos provocados pelos humanos no antropoceno (LS 34) e
buscar uma nova perspectiva, que envolve também uma nova espiritualidade: uma
espiritualidade ecológica (LS 216) que favoreça uma nova “reverência pela vida”
(LS 207); uma sobriedade pautada pela convicção de que “quanto menos, tanto
mais mais” (LS 222); um retorno à simplicidade (LS 222) e humildade: valores
que não gozaram de de positiva consideração no último século (LS 224).
A nova
espiritualidade provoca uma revirada no modo de ser, favorecendo o caminho de
uma “paz interior” (LS 225) e de uma nova atenção e cuidado para com o
ambiente, de forma a “recuperar a serena harmonia com a criação”. O desafio é
saber perceber que tudo está inteligado em nosso tempo (LS 16), e que nós –
habitantes dessa “casa comum” – somos terra e o nosso corpo “é constituído
pelos elementos do planeta” (LS 2).
Na
verdade, o Mistério habita em todas as coisas (LS 233). Traço importante
na nova encíclica de Francisco é o resgate da “interação bíblica entre o ser
humano e a natureza”. Há um lirismo muito peculiar na reflexão de Francisco.
Sua fala vem pontuada pela consciência da presença do Mistério no Universo: “há um mistério a contemplar numa folha, numa vereda, no orvalho, no
rosto do pobre” (LS 233). Para Francisco “cada
criatura é objeto da ternura do Pai que lhe atribui um lugar no mundo. Até a
vida efêmera do ser mais insignificante é objeto do seu amor e, naqueles poucos
segundos de existência, Ele envolve-o com o seu carinho. Dizia São Basílio
Magno que o Criador é também a ´bondade sem calculo`, e Dante Alighieri falava
do ´amor que move o sol e as outras estrelas`. Por isso, das obras criadas
pode-se subir ´à sua amorosa misericórdia`” (LS 77).
O universo material, em toda a sua grandeza, traduz “uma linguagem do
amor de Deus, do seu carinho sem medida por nós. O solo, a água, as montanhas:
tudo é carícia de Deus” (LS 84). O humano se integra nesse cosmos como um
irmão, segundo o caminho apontado pelo poverello de Assis. Tudo está conectado,
tudo está em relação (LS 16 e 92), e tudo converge para um Mistério sempre
maior, na linha de Teilhard de Chardin, também lembrado por Francisco (LS 83,
n. 53). Não se trata, porém, de um Mistério que se reduz à transcendência, mas
uma dinâmica amorosa que pode ser encontrada em todas as coisas (LS 233), como
nas montanhas ou vales cantados por João da Cruz, essas grandezas em que o
Amado se diafaniza (LS 234)
Uma nova
tomada de consciência vem reforçada por Francisco: a de que “precisamos uns dos
outros”, que “temos uma responsabilidade para com os outros e o mundo” e que
“vale a pena ser bons e honestos” (LS 229). Só assim poderemos transmitir um
horizonte distinto para aqueles que virão, para as crianças que estão
crescendo. Há que se preocupar com as futuras gerações, adverte Francisco, pois
o que está em jogo “é a dignidade de nós mesmos” (LS 160).
(Publicado no Facebook em
18/06/2015)
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