quinta-feira, 21 de novembro de 2024

Genocídio ?

 Genocídio ?

 

A recente demanda do papa Francisco em favor de uma investigação da comunidade internacional a respeito da atual conduta bélica de Israel em Gaza e no Líbano vem, a meu ver,  coberta de razão. Nada mais essencial no momento atual do que colocar a nu a política agressiva de Netanyahu. O que vem ocorrendo, sem dúvida alguma, é um genocídio. 

 

Fico preocupado com recentes postagens no Instagram que traduzem uma defesa explícita de Israel, e justificam tudo o que vem ocorrendo como uma resposta lícita aos ataques sofridos pelo país em outubro de 2023. Em casos concretos, recorrem ao pensamento de Heschel para justificar a argumentação. Isso, a meu ver, é das maiores injustiças cometidas contra um dos mais proféticos místicos do mundo judaico, alguém que sempre esteve à frente da defesa do diálogo e da paz. Para Heschel, o conceito de Deus não é algo abstrato, mas tecido de benevolência e pathos. Trata-se de alguém que é mensch, e sua face transparece “no rosto de todos os homens”. É alguém que não aceita a opressão e a dor dos humanos; alguém que acolhe a dor dos olhos sufocados pela opressão; alguém que “esqueceu seu coração” dentro do peito de todos aqueles que buscam a justiça autêntica.

 

Na tradição judaica, temos também a profética presença de Martin Buber, que defendeu até a morte um caminho diverso para Israel. Um caminho diverso daquele degenerado que se firmou, quando o sionismo religioso transformou-se em sionismo político. Somos testemunhas de algumas tragédias terríveis que ocorreram em tempos modernos, como, por exemplo, a atuação injustificada de Ariel Sharon, que comandou com suas milícias falangistas o pogrom dos campos palestinos de Sabra e Chatila. 

 

Marco Lucchesi, em seu belo livro “Os olhos do deserto”, fala de sua profunda tristeza com aquilo que viu nos campos de Sabra e Chatila, que definiu como um “mundo esquálido e sombrio. Horizonte sem horizonte. Tristeza sem lágrimas”. Quantos corpos “afogados” abaixo do campo de futebol ou sob a mesquita. Lucchesi expressa sua “raiva e compaixão”, e também sua “vergonha”, enquanto ser humano. Ao final de seu texto lança seu grito:

 

“Carrascos destes campos. Vermes! Algozes! Morrei no próprio sangue! Morrei na fezes! Morrei no esperma de vossa progênie! Malditos, morrei! Um inferno não há de bastar! Carrascos de Bikenau, de Auschwitz. Carrascos de Sabra e Chatila. Melhor fora para vós jamais ter nascido. Sede malditos”.

 

Outro grande pensador, que dedicou sua vida ao diálogo, e terminou seus dias como muçulmano, também sempre reagiu de forma crítica a determinada política de Israel. Trata-se do pensador francês, Roger Garaudy. Manteve acesa sua crítica contra o que denominou “leitura sionista, tribalista e nacionalista” de textos judeus que celebram um “mito travestido de história”, bem como “seu uso político”. É o caso nefasto da utilização do conceito de “povo eleito”. Um conceito que revela, na prática, a imagem de um deus unilateral, ou ainda melhor, de um “fator deus” , de um deus ou ídolo que justifica a priori todas as opressões, colonizações e massacres, “como se no mundo não existisse nenhuma outra ´história santa` do que aquela dos judeus.

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