Tempos de temor e expectativa
Faustino Teixeira
Estamos vivendo hoje no mundo uma situação extremamente difícil, onde a vulnerabilidade está exposta com toda a sua nervura. A pandemia em curso continua com sua letalidade única, virulenta. São nada menos do que 3 milhões de infectados no planeta, tendo os EUA na liderança, com 1/3 dos casos confirmados. A ameaça maior é com respeito aos riscos que vão acompanhar a presença da pandemia nos países do Terceiro Mundo: Índia, África, América Latina. No caso da Índia, é onde a vulnerabilidade está mais presente, uma vez ali estão concentrados o maior número de idosos no mundo. Na América Latina, o grande problema das favelas, desprotegidas do necessário distanciamento exigido. Fora o problema tremendo dos sem-teto, que não podem se dar o luxo de permanecerem em casa.
A situação no Brasil é preocupante. O país é o quarto no mundo a registrar o maior número de mortes nas últimas 24 horas, só sendo superado pelos EUA, França e Reino Unido. O Brasil já ultrapassou em óbitos a Itália, a Espanha e a China. Os números de hoje, como apontam os dados, indicam o registro de 5.017 casos fatais em razão da Covid-19. Um número superior ao da China, onde tudo começou. O registro na China indica 4.643 mortes. No Brasil, o estado com maior número de casos é São Paulo (21.696), seguido do Rio de Janeiro (7.944), Ceará (6.726), Pernambuco (5.358) e Amazonas (3.928). Os infectados estão presentes hoje em 13 estados e o Distrito Federal: todos com mais de 1.000 infectados.
Os casos de doença no Brasil também aumentaram significativamente: de ontem para hoje, 28/04/2020, o Brasil registrou 5.385 infectados, e o total alcança agora 71.886 casos da doença. Em vídeo de alerta que vem circulando hoje nas redes, a doutora Ana Escobar faz uma séria advertência: esta semana e a próxima são as mais difíceis, pois indicam o pico de incidência da pandemia no país. Ela faz um cálculo arrepiante: tivemos 40 dias para registrar a primeira morte. Daí em diante os dados são tremendos: 7 dias para registra mais 1.000 mortes; 5 dias para registrar outras 1.000, e agora 3 dias para registrar a mesma cifra.
Curiosamente, tenho amigos no Facebook que continuam não acreditando na presença da doença, achando que tudo não passa de enganação. Há uma coincidência entre os que desacreditam na pandemia e aqueles que defendem o atual presidente. Na entrevista publicada no dia 27/04/2020 na Carta Capital, o filósofo Vladimir Saflate fala dessa coincidência, ao comentar os recentes protestos reunindo os apoiadores do Bozo nas ruas de diversos cantos do país. Todos protestando contra a quarentena em curso. Na sua visão, os 30% de apoiadores do presidente vão se transformar em 30% de fanáticos camisas negras das milícias fascistas. Segundo Safatle, a pandemia “expõe o êxito do bolsonarismo em ´desrecalcar` características violentas de parte da população e promover uma ´transformação dos afetos na vida social brasileira`”. E no meio de tanto sofrimento, o tremendo “desgaste da compaixão”. Como aponta Safatle, “o que emerge é a expressão máxima da ausência absoluta de solidariedade pelos mais vulneráveis, a ponto de se zombar daqueles que estão morrendo”.
Em artigo publicado no O Globo de hoje, 28/04/2020, a pesquisadora Margareth Dalcolmo observa que estamos no Brasil “correndo atrás do tempo e observando o cenário trágico da nossa obscena desigualdade social que a epidemia desnudou”. E termina seu artigo com a busca de alento em Teilhard de Chardin, num texto de janeiro de 1918, um pouco antes da primeira onda da gripe espanhola: “Será necessário que a humanidade, sob pena de perecer à deriva, se eleve à ideia de um esforço humano específico e integral.”
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